Aurivânio, 1,37 m, prova que tem tamanho para subir em uma moto e vencer os limites
As calçadas do centro de São Paulo estão cheias, e uma longa fileira de motos estacionadas abarrota ainda mais o fluxo. Uma Honda Biz avança lentamente e vira o alvo de olhares e comentários. O piloto se equilibra com as pernas esticadas, e os pés mal alcançam os pedais. Os braços também vão retos, para as mãos chegarem ao guidão; o capacete aparenta ser muito maior do que realmente é. A turba se manifesta: “Tira essa criança da moto!”. Gargalhadas. “Quem deixou o ‘de menor’ dirigir?!” Pela estatura, parece de fato que é um infante pilotando. Mas quem encara as ruas – e piadas – debaixo do capacete é um homem de 32 anos, Aurivânio Ferreira, um motoboy anão.
Ari, 1,37m, já está acostumado com as brincadeiras. Trabalha como motoboy há oito anos. Roda cerca de 150 km por dia em cima de sua Honda. Durante as viagens, precisa descer do banco em todo farol vermelho. Só assim seus pés alcançam o asfalto enquanto ele espera o verde. Faz serviços de banco, cartório e cobranças. E intimida, à sua maneira, quem ousa não pagar. “Eles me veem pequenininho e acham que podem me enrolar. Eu só digo: ‘Não vai pagar? Então deixa que o juiz resolve depois’.”
Considera-se bom motorista, mas já caiu três vezes. Admite que já levou alguns retrovisores com o guidão de sua moto. Tudo por acidente, jura. E só se lembra de ter tomado três multas em toda a sua vida de motoqueiro. Não quer correr o risco de perder a carteira de habilitação que teve tanto trabalho para conseguir. Foram três anos lutando contra o Detran. “Eles diziam que era muito perigoso e não autorizavam.” Ari não desistiu. E, na insistência, somou a licença para motos na habilitação para carro que já tinha.
Só as grandonas
À noite, quando encerra a corrida como motoboy, Ari começa outra jornada. Vai para o bar lanchonete da família e assume o posto de balconista. Fica meio escondido, mas garante que não precisa de banquinho para atender a clientela. “Com a minha altura consigo ver por cima do balcão.” A dificuldade é outra. “O problema é aturar os cachaceiros.” Fazendo piadinhas com seu tamanho? “Não! Isso não! Se fizer piadinha eu boto pra fora.” E que ninguém duvide dessa sua capacidade de agir como homem grande. Suas mulheres, por exemplo, são sempre muitos centímetros maiores. “Só gosto de mulher grande. Já namorei uma de 1,90 m.”
A conversa com Ari acontece em um bar no centro de São Paulo. Quando encerramos o papo, ele se despede da reportagem e vai em direção a sua moto do outro lado da rua. Liga o motor, pula no banco e sai em disparada, acelerando forte, “cachorro locco”, como diz o adesivo abaixo da placa. Duas mulheres passam pela calçada e uma pergunta para a outra: “É uma criança dirigindo aquela moto?”. Não é não, senhora. É alguém que driblou os limites do próprio corpo. É Aurivânio Ferreira, um motoboy anão.