"O tabu da infertilidade"

por Redação

Por que falamos tanto das mulheres que conseguiram ser mãe aos 40 anos e tão pouco das que enfrentam a frustração de não conseguir?

“A gente fala muito das mulheres que conseguem ter filho mais velhas, mas não falamos  das mulheres que não conseguem. A vida moderna não entende essa mulher que tem que se dividir entre a reprodução e a produção no mercado de trabalho”, disse a cineasta e apresentadora Marina Person, na abertura da mesa “O tabu da infertilidade”, que rolou no segundo dia da Casa Tpm 2019. Junto a ela na mesa, estavam a podcaster Cris Bartis, a jornalista Priscilla Portugal, a ginecologista Eleonora Fonseca e a executiva Renata Altenfelder. 

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Cris inciou o papo contando sobre sua experiência. Depois do casamento, ela descobriu que, por conta de um ovário policístico, não conseguia engravidar e optou pela adoção. E adotou. Anos depois, aos 40, sem querer, engravidou. “Foi um choque muito grande na minha vida. Eu não queria mais. Foi muito difícil aceitar essa gravidez, foi um processo muito doloroso”, contou sobre a dificuldade que teve para se entender grávida. "Fiz o teste da farmácia. Deu positivo. Pensei: estou com câncer."

A abordagem reflexiva deu lugar à emoção nas palavras de Priscila, que foi às lágrimas ao lembrar do momento em que ouviu dos médicos que seria difícil que ela conseguisse engravidar. Ela tinha 32 anos. Tentou fertilizações in vitro que não deram certo e precisou lidar durante meses com muita dor e desesperança. “Eu não sabia o que eu tinha, não conseguia colocar um ponto final nesse sonho. Fazia muitos exames invasivos”, disse.

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Foi desse dramático momento que teve a iniciativa de criar o site Cadê meu neném?, em que entrevistava médicas e especialistas para acolher outras mulheres que, assim como ela, buscavam sozinhas um caminho para lidar com essa situação. E o que parecia impossível, aconteceu: ela engravidou. Hoje, seu filho, Raul, está com 9 meses.

Para Renata, a questão passou por uma descoberta que assusta: enquanto tentava engravidar, encontrou um tumor benigno no útero. Ela tinha 38 anos e seus exames indicavam uma pré-menopausa. Passou, então, pelo difícil processo das fertilizações artificiais, que não deram certo, até que, aos 43, ela desistiu. “Foi uma decisão muito dolorida. Eu e meu marido somos apaixonados por crianças, mas entendi que não era para mim. Demorei um tempo para aceitar e, hoje em dia, sou feliz com essa escolha. As pessoas acham que o sucesso e a felicidade da mulher vêm com o filho, mas eu tenho outras coisas. A cumplicidade que esse processo gerou entre mim e meu marido é enorme. Tenho a melhor família que Deus poderia ter me dado”, contou.

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Marina seguiu na conversa chamando atenção para o aumento da infertilidade entre os casais e convidou a ginecologista Eleonora para a conversa. “A idade da mulher, conforme vai avançando, favorece processo inflamatórios. Quando a gente posterga o processo da gestação, expõe mais o nosso corpo a essas coisas: transtornos hormonais, ovários policísticos.  Mas, das causas conhecidas, um evento novo é a parte masculina. A gente sempre associou a infertilidade à mulher, mas metade das causas são masculinas”, disse.

A relação entre a não maternidade e a sensação de fracasso feminino dominou a conversa nos minutos seguintes. “Desde pequenas, temos uma relação de controle com o corpo e há a expectativa de que, se você fizer tudo certinho, vai casar e ter filhos. É um processo longo que passa por odiar e se desconectar do corpo. E, se você não cumpre essa função social, há uma uma humilhação, uma vergonha. Você passa a odiar aquele corpo que você já não gostava”, avalia Cris.

Marina trouxe nessa hora uma perspectiva a respeito da organização social capitalista de nossa sociedade, que, segundo ela explica, impacta na relação das mulheres com a maternidade. “Na revolução do trabalho, a mulher ficou responsável pelo trabalho doméstico e pela reprodução. E tem também a apropriação do corpo da mulher pelo Estado, como no caso do aborto”, disse, para lembrar que essa divisão sexual começa já na infância, quando meninos e meninas não podem brincar das mesmas coisas, e como isso desde sempre se relaciona com a ideia de sucesso e fracasso na vida das mulheres. “Parece clichê, mas sucesso não se mede por conta bancária ou pela quantidade de filhos que você tem ou não tem. Não conseguir engravidar não é sinônimo de fracasso.”

 

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