Valores, por Luiz Mendes

por Luiz Alberto Mendes

O homem não escapa de querer viver em sociedade, por mais tenha desprezado valores sociais no passado

Em um dos 20 módulos de nosso projeto de empoderamento para pessoas aprisionadas, eu e Maurício Cardenete, psicólogo e coaching, tratamos de valores.

No aquecimento e introdução ao tema, fizemos a dinâmica da nota: pegamos uma nota de alto valor em dinheiro e perguntamos aos participantes se algum deles a queria. É óbvio que todos responderam positivamente. Amassamos a nota nas mãos, maltratando-a, e depois desamassamos lentamente, em uma cena teatral. Perguntamos se alguém ainda queria a nota. Todos continuaram querendo. Amassamos novamente, jogamos no chão, pisamos em cima várias vezes, quase com raiva dela. Depois, desamassamos novamente, o mais lento possível. Todos continuaram querendo a nota. Rasgamos em duas (claro, é uma nota de papel que preparamos) e ainda estava na vontade de todos querê-la para si.

Resumidamente, ao fim da encenação, dissemos que nós somos como aquela nota. A vida nos maltrata, judia e faz sofrer. Mas ainda continuamos a ter valor. E é sobre valores que iríamos conversar naquele dia.

Perguntamos quais os valores os participantes consideram importantes. Aquecidos e interessados, eles começaram a falar sobre o que conhecem e acham importantes para a existência. Os principais que surgem são: liberdade, família, trabalho, honestidade, honra, religião, amor, solidariedade, amizade, capital (dinheiro), respeito, responsabilidade, justiça, educação, humildade, estudo, união, paz, perdão, vida e por aí afora. Registramos na lousa e fomos comentando cada um deles. 

Quanto mais tempo demoramos nessa parte do módulo, mais valores surgem. Depois pedimos, individualizando a dinâmica, que escolham três ou cinco daqueles itens listados na lousa, os que lhes parecem mais importantes. As escolhas quase sempre recaem sobre família em primeiro lugar, liberdade (o que é natural para presos), religião, respeito, trabalho e humildade.

É preciso dizer que a maioria das pessoas presas já trabalhou, por muitos anos. Exatamente por isso é que a família recebe pagamento do INSS, a previdência que lhes é devida por haverem pagado anos de impostos. Parece que onde mais se errou é que se dá importância. Para nós, prova de que o homem não escapa de querer viver em sociedade, por mais tenha desprezado valores sociais no passado. 

Valores são o substrato, a estrutura de nossa personalidade. É a partir deles que decidimos. As nossas escolhas são oriundas dos valores que elegemos. Exatamente por isso, sabemos haver esperanças de retorno do homem aprisionado ao convívio social. E só por isso nos demos ao trabalho de montar nosso projeto Semeando Sonhos e Colhendo Realidades. Seus valores carecem de ser realçados; sua capacidade crítica e autocrítica, necessitam ser discutidas; ele precisa confiar que será acolhido (daí o valorizar tanto a família); necessita conversar sobre suas ansiedades, seus sofreres. Carece de profissionalização, trabalho e vencer os preconceitos sociais; precisa aprender a olhar para si e para os outros, desenvolver sentidos e significados e acabar com desculpas, condescendências e justificativas.

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Já aplicamos nosso projeto integralmente com presos do Centro de Ressocialização de Limeira e os índices de aproveitamento foram os mais altos possíveis, superando todas as nossas expectativas. Depois de realizado nossos objetivos, hoje aplicamos outro projeto. Formamos pessoas para multiplicarem o Semeando Sonhos para outros presos e em outras prisões.

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