Deputados confirmam em reunião regras restritivas para internet na campanha política de 2010
Absolutamente chocante a notícia postada por Fernando Rodrigues em seu blog. Deputados confirmam o apoio às restrições do uso da internet nas campanhas eleitorais.
Em um país com um sistema eleitoral que ignora distritos e o contato direto entre eleitores e representantes e tem como base da política eleitoral verdadeiros currais, onde vereadores e deputados são praticamente donos de bairros através da compra de lideranças e do uso de sistemas tradicionais de campanha, a impossibilidade do uso da internet na campanha quebra uma das únicas possibilidades de ingresso de gente nova e de cabeça aberta - contrárias à prática política tradicional - na arena da política. A Internet seria uma porta aberta para a renovação.
Tenho certeza que é justamente a possibilidade de renovação que esses deputados querem evitar! O Brasil dessa maneira estará na contramão do mundo, onde pipocam exemplos de novos políticos oriundos de redes sociais e de mobilizações que só a internet pode proporcionar.
Essa é a nova maracutaia do congresso! Um esquema para evitar a renovação política.
Abaixo, a íntegra do post de Fernando Rodrigues.
Pelo livre uso da internet nas campanhas!
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Deputados confirmam em reunião regras restritivas para internet na campanha política de 2010
Terminou agora no fim da tarde a reunião de deputados a respeito das regras eleitorais que serão inseridas em uma lei a respeito do uso da internet no ano que vem.
Basicamente, é tudo o que já está descrito no post abaixo, com algumas alterações que detalho a seguir.
Haverá muitas restrições. As campanhas políticas brasileiras terão dificuldade para mimetizar o que se passa em países desenvolvidos –a grande conexão entre eleitores e políticos por meio da web.
O principal problema é que o excesso de regras inibirá o movimento dos candidatos com menos recursos de entrarem com tudo na rede. Haverá muita dúvida legal sobre incentivar a criação de grupos de relacionamento e outros mecanismos de comunicação interativa. Quem não tem assessoria jurídica pode ficar com medo de avançar pelo risco (real) de ser processado até a morte pelo candidatos mais poderosos. Dessa forma, a regulação extremada mata o que há de melhor na internet em campanhas eleitorais: a liberdade total que ajuda a renovar a política.
Os políticos brasileiros não querem renovação. Querem manter o status quo.
Tudo ainda se trata de um projeto de lei. Essa a melhor parte: a preguiça crônica pode impedir deputados e senadores de aprovarem o monstrengo até setembro, a tempo de a regra valer para 2010.
Para saber como tudo vai ser, é útil ler o post abaixo e os seguintes acréscimos decididos na reunião de hoje (24.jun.2009) à tarde:
1) limite de doação de R$ 1.000 pela internet – graças ao deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS) essa restrição foi derrubada. Boa decisão. Mas ainda não está claro se os deputados entenderam que devem fazer um sistema que permita a qualquer eleitor fazer a sua doação por meio de cartões de crédito ou débito.
2) Debates limitados na internet – em compensação, os deputados dizem pretender liberar um pouco a regra para TVs e rádios. Poderão fazer debates as emissoras que conseguirem o consentimento de 2 terços dos candidatos. É um avanço sobre a regra atual, pois no momento só é possível debate quando todos os candidatos concordam em participar.
O problema é que a regra dos 2 terços (alguns defendem 50% + 1) passaria a valer também para a internet… É um truque para restringir a web. Hoje, não existe nenhum tipo de limitação. Sites e portais estão livres para promover um debate entre os 2 ou 3 mais bem colocados na disputas eleitorais. Com a lei proposta, essa liberdade vai para o espaço.
3) propaganda só depois de 5 de julho – nenhum deputado abre mão dessa limitação. A hipocrisia continuará reinando: ninguém poderá admitir ser candidato e pedir votos antes de 5 de julho no ano eleitoral. Inclusive na internet. E se alguém fizer isso para o político a partir de um site, blog, twitter etc. no exterior? Ninguém consegue responder direito qual seria a providência a ser tomada.
4) sátiras, animações, entrevistas, humor – tudo realmente ficará proibido ou restrito. A ideia dos deputados, dizem, é transportar para a web as regras que vigoram em parte dos meios de comunicação. Por exemplo, o site que entrevistar um candidato e deixar os outros de fora certamente estará correndo o risco de ser processado. Sobretudo se o entrevistado ousar fazer algum tipo de crítica aos adversários. Um trecho da proposta de lei fala, explicitamente, que é proibido “dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação”. Ou seja, qualquer coisa pode ser interpretada dessa forma.
5) direito de resposta – será criado um dispositivo na lei obrigando sites, blogs etc. a concederem direito de resposta quando algum político se sentir ofendido. É uma ideia despropositada. Se alguém ofende um político em um blog, terá necessariamente de conceder direito de resposta. Ora, diferentemente de um jornal, revista, TV ou rádio, sites e blogs na internet podem ser criados quase sem custo por qualquer pessoa. Por que sites e blogs precisariam se submeter às mesmas regras da velha mídia, que é bem mais restritiva? Os deputados não têm a resposta.
6) sites deverão mesmo ser registrados no TSE e precisam ser hospedados no Brasil – a exigência está mantida para os sites do candidato ou do partido/coligação. Pessoas que tenham interesse em montar um site a favor de um candidato estão (ufa!) livres da burocracia. Mas essas pessoas terão de se submeter a todas as outras regras, inclusive a de dar direito de resposta a algum candidato que se sentir ofendido.
Sobre sites que possam ser lançados a partir de provedores no exterior, nenhum deputado soube dizer ao blog como seria a reação do político ou da Justiça Eleitoral brasileira. No mínimo, essa inusitada exigência da lei provocará situações em que os TREs ou o TSE terão de enviar requerimentos de informações para a Tailândia, Nigéria ou Paraguai.
7) propaganda paga na internet – segundo o deputado Flávio Dino (PC do B-MA), a proibição foi total “por conservadorismo” dos deputados envolvidos no debate. Aparentemente, ninguém ali sabia definir exatamente o que é um banner… Acham que não teriam como medir se algum político abusasse desse tipo de recurso. Enfim, na dúvida, querem proibir tudo.
Proposta de lei da internet na política acorrenta Brasil ao século 20
- doações por meio da web serão limitadas a apenas R$ 1 mil
- propaganda só será liberada depois de 5 de julho. Antes, será ilegal
- sites deverão ser registrados no TSE e precisam ser hospedados no Brasil
- sátiras, animações, entrevistas, humor: tudo ficará proibido ou restrito
- debates serão autorizados só com todos os candidatos presentes (nanicos inclusive)
Há muita gente bem intencionada na discussão sobre novas regras para o uso da internet na política. Flávio Dino (PC do B-MA), Mendes Ribeiro (PMDB-RS) estão entre os que tentam melhorar as regras. Mas o texto até agora discutido é um lixo quase completo. O assunto está sendo discutido hoje (24.jun.2009), na Câmara (a reunião acabou: leia no post acima).
Basicamente, os deputados brasileiros não entenderam ainda do que se trata a internet. Querem legislar impondo restrições. Vão produzir mais uma lei que não vai pegar no Brasil. Inútil. Pior ainda, será uma desmoralização quando os deputados descobrirem que não adianta proibir blogs, sites etc. que não estejam registrados no TSE. Qualquer um, seja do bem ou do mal, pode montar o site que bem entender num país vizinho.
É uma lástima que o Congresso viva no século 20. Com essa possível lei, condenarão a política brasileira a ficar, para sempre, proibida de entrar no século 21.
A seguir, alguns tópicos da lei proposta e comentários do blog:
“Art. 1º. A Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescida dos seguintes dispositivos:
“Art. 23 ………………………………………………………………..
§ 4º …………………………………………………………………….
III mecanismo disponível, em sítio da Internet do candidato, partido ou coligação, que deverá atender aos seguintes requisitos:
a) identificação do doador;
b) limitação das doações ao valor total de R$ 1.000,00 (um mil reais), por pessoa física, durante toda a campanha;
c) obrigatória emissão de recibo eleitoral para cada doação realizada”.
Comentário do blog: por que limitar a R$ 1 mil? Segundo alguns dos envolvidos seria porque esse valor está próximo, um pouco abaixo, do limite que pessoas físicas podem oferecer sem ter a obrigação de declararem em seus IRs. Incrível. O que uma coisa tem a ver com a outra? Nada. Por que um cidadão, se assim o desejar, não poderia doar, digamos, R$ 1,2 mil para um candidato por meio eletrônico, na internet?
Além do mais, num país com economia ainda tão instável como a brasileira, é uma temeridade escrever valores monetários em uma lei. Daqui a alguns anos, o valor terá de ser alterado por meio de… outra lei.
“Art. 57 - A É permitida a propaganda eleitoral na Internet, nos termos desta lei, após o dia 5 de julho do ano da eleição”.
Comentário do blog: eis aí os deputados querendo legislar para o planeta Terra inteiro, para a galáxia. Para que impor essa restrição se é impossível que alguém lance um site, apócrifo que seja, num país vizinho, a qualquer tempo e época?
“Art. 57-B A propaganda eleitoral na Internet poderá ser realizada nas seguintes formas:
I - em sítio do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de Internet estabelecido no país;
II - em sítio do partido ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de serviço de Internet estabelecido no país;
III – por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pelo candidato, partido ou coligação;
IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e assemelhados de candidatos, partidos ou coligações ou de iniciativa de qualquer pessoa natural”.
Comentário do blog: qual é a lógica a respeito de comunicar a existência do site à Justiça Eleitoral? A mesma que ainda faz alguns órgãos públicos exigirem a autenticação de documentos e o reconhecimento de firmas –aqueles carimbinhos lindos dos cartórios, com uma mãozinha fechada e o dedo indicador esticado apontando para a assinatura… Ah, a nossa herança lusitana.
Outra pergunta: qual é a lógica por trás de exigir a hospedagem do site em “provedor de serviço de Internet estabelecido no país”? Tenham dó… Isso jamais poderá ser colocado em prática.
“Art. 57-C Na Internet, é vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga”.
Comentário do blog: Por quê? Não se sabe. Por essa lógica, os candidatos também não poderiam anunciar suas propostas em meios impressos (o que hoje é permitido). Trata-se de uma nítida limitação da liberdade de expressão.
“Art. 57-D É vedado aos provedores de conteúdo e empresas de comunicação social na Internet, nos conteúdos disponibilizados em suas páginas eletrônicas, por eles produzidos ou não:
I - transmitir, ainda que sob a forma de entrevista jornalística, imagens, texto ou som sobre a realização de pesquisa ou qualquer outro tipo de consulta popular de natureza eleitoral em que seja possível identificar o entrevistado ou em que haja manipulação de dados;
II - usar trucagem, montagem ou outro recurso de áudio ou vídeo que, de qualquer forma, degradem ou ridicularizem candidato, partido ou coligação, ou produzir ou veicular propaganda com esse efeito;
III - dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação;
IV - veicular ou divulgar filmes, novelas, minisséries ou qualquer outro conteúdo com alusão ou crítica a candidato ou partido político, mesmoque dissimuladamente, exceto conteúdos jornalísticos ou debates políticos;
V - divulgar o nome de página eletrônica que se refira a candidato escolhido em convenção, ainda quando preexistente, inclusive se coincidente com o nome do candidato ou com a variação nominal por ele adotada”.
Comentário do blog: Goebbels vive! Com que direito o Congresso Nacional impedirá o livre pensamento na internet? Estará proibido, então, durante o tal processo eleitoral um portal entrevistar um determinado candidato que mencione uma pesquisa de opinião? Internet não é concessão pública. É espaço público. Esse artigo é flagrantemente inconstitucional –exceto para algumas cabeças de toucinho na Câmara.
Sobre ridicularizar candidatos, as excelências já assistiram algum vídeo do JibJab? Tentem entrar aqui.
“Art. 57-G É facultada a veiculação, na Internet, de debates sobre eleições majoritária ou proporcional, assegurada a participação de candidatos dos partidos com representação na Câmara dos Deputados e facultada a dos demais, observado o disposto no art. 46 desta lei”.
Comentário do blog: e, com vocês, a Lei Falcão na internet! É isso mesmo. Daqui a pouco a web só poderá mostrar as carinhas dos candidatos e os seus nomes. Os debates na web estarão inviabilizados se esse parágrafo virar lei. Até porque é sempre a) quase impossível reunir todos os candidatos para um debate e b) quando todos são reunidos, o debate é um lixo por causa da presença dos nanicos filiados a partidos de aluguel.