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PIB DA CRIATIVIDADE

Coluna prega a valorização da cultura como contraponto à mega exploracão imobiliária de SP

Por Alê Youssef

em 16 de março de 2010

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Participei em janeiro de debate no Masp (Museu de Arte de São Paulo) organizado por Baixo Ribeiro e a galeria Choque Cultural, que fazia parte da extraordinária exposição de grafite “De dentro pra fora/ De fora pra dentro” e do aniversário de 456 anos da cidade. Tive a satisfação de dividir a mesa com figuras como o secretário municipal de Cultura Carlos Augusto Calil, o urbanista Jorge Wilhem, o diretor do grupo teatral Os Satyros, Ivam Cabral, e os jornalistas Marcelo Tas e Gilberto Dimenstein. O tema foi audacioso: a cultura salva São Paulo?

A cidade estava – como sempre esteve, aliás – um caos. Enchentes para todos os lados, lixo pelas ruas, trânsito caótico, prefeitura batendo cabeça e todo tipo de problema estrutural nunca superado nos faziam lembrar do quanto ainda precisamos evoluir. Como entusiasta da causa da cultura e amante dos movimentos alternativos que a cidade gera, fiquei com receio de o tema ser deixado para trás, diante da barbárie urbana causada pela chuva que não parava.

Entretanto, o que se viu no debate foi um verdadeiro otimismo em relação ao potencial que a cidade tem, quando a observamos com o olhar cultural. A saída para São Paulo, como já ressaltamos diversas vezes nesta coluna, é mergulhar no potencial de sua economia da criatividade e valorizar cada um dos exemplos de ocupação que acontecem espontaneamente nos espaços públicos, na marra.

A praça Roosevelt e o Baixo Augusta foram os exemplos mais comentados pelos presentes. O ambiente que esses espaços criaram deram novos ares para a cidade e ajudaram a transformar a metrópole do caos, dominada pelos coronéis do mercado imobiliário, em um lugar bacana, cool, especialmente para quem tem na retina a sensibilidade da arte.

Warhol e Barra funda
Um grande exemplo do caminho a seguir está registrado no recém-publicado livro Warhol Economy, de Elizabeth Currid, professora do departamento de política e desenvolvimento da Universidade do Sul da Califórnia e PhD em planejamento urbano. Na obra, a autora explica por que a moda, a música e a arte dirigem hoje o destino de Nova York. Comparações fabulosas são feitas com setores mais tradicionais da sociedade e chega-se à conclusão de que o movimento artístico e criativo que bombou na Big Apple atingiu uma profundidade social tão grande, capaz de assumir as rédeas da economia da cidade, que influenciou todas as áreas. O título da obra brinca com o grande artista Andy Warhol, que simbolizou com sua pop art esse grande movimento de vanguarda.

A economia da arte e da cultura é em geral pouco compreendida e subestimada, inclusive em Nova York, mas o estudo feito por Currid explica por que essa economia é vital para grandes cidades.

O maior erro de São Paulo é não apostar suas fichas nesse universo que cresce paulatinamente, de baixo pra cima, sem investimento público, e mesmo assim muda a cara da cidade. O próprio secretário de Cultura, que faz um trabalho respeitável e lutador dentro da estrutura esdrúxula do executivo municipal, concordou no debate que o correto seria direcionar as ações urbanas e de investimento cultural aos nichos em que a própria população já sinaliza os caminhos a seguir, como o Baixo Augusta, a Roosevelt, a Barra Funda e outros.

São Paulo não pode continuar sendo o quintal dos megaempreendimentos imobiliários que compram a maioria dos políticos (basta ver quem recebeu doação eleitoral desse setor) para aprovar qualquer coisa que estimule a especulação e renda muito, gerando o caos urbanístico e a quebra de qualquer planejamento estratégico. Como muito bem disse Marcelo Tas no encontro, desde menino ele ouve falar da tal revitalização do centro, mas ela nunca acontece. A conclusão da mesa foi óbvia: o setor imobiliário sempre tem outro interesse, ou “outro centro” para investir.

A prefeitura poderia separar uma verba da milionária secretaria de Comunicação, que gasta horrores em propaganda, para uma pesquisa sobre o PIB da criatividade na cidade. Isso contribuiria demais para nosso autoconhecimento. Somos uma cidade vanguardista e atraente para tantos que podem aqui crescer pela arte, pela moda, pela música e por outros aspectos da criatividade. Essa tendência deveria entrar de forma transversal na agenda do poder público para definir ações em todas as outras áreas.

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