por Pedro Carvalho

O fotógrafo Luiz Blanco convoca uma turma que conta com Scooby e Trekinho para perseguir uma mesma ondulação por várias lajes cariocas

Bairro das Laranjeiras (Rio de Janeiro), 16 de maio, quarta-feira, 6h35

Luiz Blanco, fotógrafo carioca especializado em surf, tinha acordado cedo para conferir os sites de previsão de ondas. Ao perceber o tamanho da encrenca que iria atingir a costa do Rio de Janeiro, ele abriu um grupo de conversa em seu WhatsApp. Nele se reúne uma turma que tem se dedicado a surfar as lajes daquele pedaço da costa brasileira (ou seja, ondas que quebram afastadas da praia, em cima de pedras, normalmente rápidas e poderosas): Marcelo Trekinho, Pedro Scooby, Eric de Souza e outros nomes conhecidos nesse meio. Ainda eram 6h35 quando Luiz digitou: “Mas, então, o swell ganhou força de novo”. A frase foi a faísca que desencadeou um longo bate-papo sobre ondas, ventos e opções logísticas. Dois dias depois, na sexta-feira (18), o fotógrafo profetizava: “Já fiz o roteiro aqui... Domingo e segunda, vamos pegar Angra bizarro, terça você tem opções...”.

Praia da Ribeira (Angra dos Reis), 21 de maio, segunda-feira, 5h30

Ao alvorecer de segunda, após um domingo de muito vento e poucas condições para o surf, Luiz chegou à marina da Praia da Ribeira, em Angra dos Reis. Ele tinha dormido na cidade, enquanto o pessoal que veio do Rio – Scooby, Trekinho e o dono da lancha – acabou chegando pouco depois das 6h. Apesar do horário, ninguém tinha muita pressa. “Essas lajes dependem bastante da maré. Quando está muito cedo e a maré ainda é muito seca, fica quase impossível surfar. A gente sabia que o mar iria melhorar no decorrer do dia”, explica o fotógrafo.

Laje do Dramin (Angra dos Reis), 21 de maio, segunda-feira, 10h23

Depois de mais de três horas vasculhando as lajes da região a bordo de um barco e dois jet-skis, a turma tomou sua decisão. Perto das 10h, eles aportaram na Laje do Dramin, na costa de Angra dos Reis. “O nome é meio engraçado, mas é como a galera chama aquela onda... Acho que é porque muita gente fica no barco enquanto rola o surf e acaba passando mal”, conta Luiz. A onda é uma direita enorme, massuda e meio deformada. Quebra sobre uma pedra tão rasa que, na hora do tubo, a parede de água forma uma série de degraus, como se várias cristas quisessem se projetar sobre o surfista ao mesmo tempo (para quem conhece, lembra Shipstern Bluff, na Austrália). Às 10h23, já sob um sol intenso, Pedro Scooby dropou uma dessas bestas indomáveis e inaugurou a sessão de surf.

Laje do Dramin (Angra dos Reis), 21 de maio, segunda-feira, 12h16

Nas horas seguintes, o mar só fez melhorar e a turma pegou ondas cada vez mais perfeitas. O que não significa que as condições estivessem fáceis. “Mesmo o Trekinho, que tem muita experiência, estava falando sobre como aquela onda é difícil”, conta Luiz. Até que, às 12h16, uma amiga que acompanhava a turma – Michaela, namorada de um outro fotógrafo – tentou pegar uma direita e acabou sendo arremessada pela crista da onda. A quilha da prancha fez um corte profundo no pé dela e o grupo achou melhor levá-la para um hospital – onde ela tomaria sete pontos – e encerrar a sessão.

Itacoatiara (Niterói), 22 de maio, terça-feira, 7h53

Na manhã seguinte, quando Luiz chegou às pedras de Itacoatiara e achou um cantinho para fotografar a sessão de surf que rolaria por lá, logo a sua frente, ninguém estava no mar ainda. Sem ter muito o quê fazer, virou a câmera na direção da praia atrás dele. Às 7h53, fez um clique da crista de uma onda solitária e postou no Instagram. Dias depois, o Surfline, um dos principais grupos internacionais de mídia de surf, repostaria o flagra. “Eu tinha começado meu perfil em março, ou seja, tinha poucos seguidores... Daí a foto viralizou [só a postagem do Surfline teve mais de 44 mil curtidas], mais de 100 pessoas repostaram a imagem e agora tenho mais de 2 mil seguidores”, diverte-se o fotógrafo.

Itacoatiara (Niterói), 22 de maio, terça-feira, 9h43

Como o surf na laje de Itacoatiara não depende de barcos nem jet-skis, dessa vez os amigos de Luiz não surfaram sozinhos. Às 9h43, um local daquela praia dropou a primeira bomba do dia. A onda dessa laje, também uma direita, é curta e intensa: começa com um tubo muito oco e em seguida se desfaz em um canal profundo. Eric de Souza, filho da lenda do surf brasileiro Rico de Souza, pegou dois tubaços. Daniel Rangel e o local Angelo Bittar também encontraram os deles. Scooby precisou sair do mar às 11h para pegar um avião, mas teve a camaradagem de deixar seu jet-ski (que dava suporte à turma) para os que permaneceram na água. Um dos destaques do dia não usava prancha: Kalani Lattanzi, um fenômeno do bodysurf (o popular jacaré), entrou nadando no mar e também encarou as bombas de 2,5 metros que explodiam em Itacoatiara. Nos últimos anos, Lattanzi ficou conhecido por pegar jacarés insanos na temida praia de Nazaré, em Portugal. Após uma manhã de sol intenso e surf exigente, o pessoal saiu da água pouco antes das 14h, todos cansados e mortos de fome.

Bairro das Laranjeiras (Rio de Janeiro), 23 de maio, quarta-feira, 10h30  

O último dia da missão amanheceu chuvoso. Luiz foi cedinho conferir as condições em São Conrado e não ficou animado. Para complicar, após muitas mensagens trocadas ao longo da manhã, ele acabou sem bateria no celular. Voltou para a casa, plugou o aparelho na tomada e descobriu que estava atrasado. A turma tinha decidido partir para um lugar peculiar na boca da Baia da Guanabara. Além de ter uma baía como cenário, a onda ali quebra quase “ao contrário”: conforme contorna as pedras da ponta da ilha, ela gira e arrebenta quase como se viesse do continente. Luiz correu para juntar as tralhas e às 10h30 enviou para o grupo: “Fui”.

Ilha Mãe (Niterói), 23 de maio, quarta-feira, 14h57

O último dia da missão não deixou por menos: o sol abriu, a vista da Pedra do Leme e do Pão de Açúcar compuseram o cenário, as ondas estavam menores mas com alta qualidade. “Angra [na Laje do Dramin] é um monstro, não dá para surfar sem jet-ski, mas a Ilha Mãe é uma onda perfeita, então a galera acabou surfando mais na remada”, conta Luiz. Eric, Trekinho, Rangel e companhia fecharam a maratona das lajes com altos tubos, emoldurados pela paisagem sensacional da ilhota. Às 14h57, o fotógrafo registrou o último clique: um tubaço esverdeado, quebrando solitário na boca da Guanabara.

Em breve, em alguma laje carioca...

“Nosso grupo está bem focado em surfar nas lajes do Rio de Janeiro, fizemos várias missões nesse ano”, conta Luiz. E, sem dúvida, o grupo de WhatsApp vai voltar a bipar assim que outra ondulação de peso pintar no radar. “Estamos de olho em duas lajes novas, uma na zona oeste do Rio de Janeiro e outra na região dos Lagos. Nunca vi foto de nenhuma delas, só ouvi falar”, adianta o fotógrafo. Para saber se essas descobertas deram resultado – antes de viralizar na internet –, acompanhe o Insta do fotógrafo, em @luizblancofotografia. 

Créditos

Imagem principal: Angelo Bittar fotografado por Luiz Blanco

Fotos: Luiz Blanco

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