por Luiz Alberto Mendes

 

Quem sou eu?

 

         Quem sou eu, afinal de contas? O tempo me risca de rugas, pintando a alma de uma cor levemente acinzentada. Creio que sou a somatória de todos os meus momentos bons e ruins. Andares sobrepostos de mim mesmo. Não apenas agredi ou promovi violências. Sim, eu as cometi. E me envergonho disso. Profundamente. Não justifico ou racionalizo.

         A vida, apesar de meus erros, fluiu. Precisei viver, mesmo preso e condenado. Procurei alargar o espaço que eu mesmo estreitei. Muitas vezes me senti sem esperanças. Parecia que eu já era. Mas não. Ainda estava vivo. Naturalmente, fui realizando uma releitura do mundo. Os livros sempre me salvaram, até de mim mesmo. Mas quem os trouxe e incentivou é que realmente me deu nova chance. Amei e na curva do rosto da mulher amada, aprendi valores humanos.

         Esforcei-me pôr aproveitar meu tempo. Li e estudei o quanto pude.  Escapei do destino cruel que me seguia ao longo de meus passos. Das ilusões da realidade, construí a realidade de uma ilusão. Muitas vezes minha espada se fez pesada sob meus braços. A consciência mordia como cão raivoso. Mas meu sonho era tão grande que se alongava. Engoli sombras para produzir luzes.

         Nada tenho a dizer contra a vida que tive. Foram muito mais que os trinta anos de prisão. Não há revolta; há esperanças de construir felicidades. Um otimismo que vem da certeza de que não desperdicei a vida e tentei usar até sangrar. Claro que sofri. Sem dó. Mas sempre soube que tudo dependia somente de mim. E que eu me tornaria naquilo que quisesse ser. A vontade sempre me pareceu soberana. 

         Sei que há alguma coisa que me coloca para frente. Protagonizei tantas tragédias e situações piores que a morte e escapei de todas elas. Minhas dores se transformaram adornos: não me deturpei, não me corrompi. Sou desses que se importam. Aprendi a amar na medida em que me senti amado. Amado pela natureza e pela vida.

         Respondo agora a pergunta inicial: Eu sou a minha própria voracidade de viver, este ser que não cabe em si e se expande.

                                        **

Luiz Mendes

20/02/2014.

                                                                                              L 

fechar