Em Confissões de um homem livre, Luiz Alberto Mendes revisa os anos de cadeia e investiga tudo aquilo que espera seu personagem fora das grades

Romances sobre prisão são raridade no Brasil. Se na área de não ficção ainda podemos encontrar livros como Carandiru, de Drauzio Varella, quando se trata de ficção a prateleira fica quase vazia. Num limiar entre a ficção e a autobiografia, temos volumes com as memórias de Graciliano Ramos e, mais recente, a vigorosa obra de Luiz Alberto Mendes. Com o autobiográfico, Confissões de um homem livre (Companhia das Letras),  lançado este mês, o escritor retorna ao tema do universo carcerário e produz um relato cru, violento e, muitas vezes, angustiante.

A história cobre os últimos dez anos em que o narrador cumpriu pena. Em 1994, ele já está na cadeia, em São Paulo, há 22 anos e, no regime semiaberto, trabalha fora da prisão. Acaba conhecendo uma mulher mais jovem, Irismar, com quem se casa e tem dois filhos. À espera da liberdade condicional, sonha com trabalho e uma família. Para o bandido de meia-idade, o crime já não oferece emoção, é o sentimento de derrota que o acompanha nas vezes em que fracassa em se manter recuperado. Mas não é fácil, e uma série de incidentes o lança de novo na crueldade do sistema prisional.

A vida na cadeia costuma render bons personagens. Hannibal Lecter (O silêncio dos inocentes) e Edmond Dantès (O conde de Monte Cristo), por exemplo. Já o americano Edward Bunker é o mais bem-sucedido caso de escritor-presidiário. Produziu na cadeia Fábrica de animais, talvez o melhor romance sobre o cárcere. O autor de Confissões de um homem livre percorre trajetória parecida à de Bunker. Preso na juventude, cumpriu pena por 32 anos até ser libertado, em 2004. Na cadeia, escreveu e lançou três livros de ficção. É colunista da Trip desde 2002. 

Um dos presídios que o narrador frequenta é o temido Complexo do Carandiru, hoje desativado. É ali que se passam os momentos mais fortes. Entre decapitações e abusos diários, ele encontra sua redenção pessoal em um inferno ao qual poucos sobrevivem. Contados de forma seca e direta, os episódios são fortes, intensos. Alguns geram revolta pelos abusos e pela indiferença geral com a morte.  

Com uma escrita rápida e nervosa, a força de Mendes está no mundo assustador que revela.  Conhecê-lo faz da leitura uma experiência perturbadora.

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