Admirável
Vivemos nos sentindo. Achamos que sabemos tudo, inclusive viver. Quando observamos mais de perto, o susto é imobilizador. O mundo vira de pernas pro ar e tudo se torna impalpável.
Nas minhas Oficinas de Leitura e Texto, há um módulo somente para desconstrução. Começo provocando discussão. Estamos vivos quando acordados, ou estamos vivos quando dormindo? Tem a história de um conde que, enquanto dormia, foi vestido de mendigo e colocando em uma vala. Depois a de um mendigo que, vestido de conde, foi colocado na cama do palácio. O mendigo, tratado como conde, pensa haver sonhado ser um mendigo. O conde, ao acordar jogado na vala, pensa haver sonhado ser um conde.
Há postulados filosóficos que afirmam categoricamente que essa não é a nossa vida verdadeira. Aqui estamos como que em uma escola: para aprender, crescer e evoluir. Ao morrer então, iremos para o lugar onde desenrolamos nossa vida mesma. Nosso lar.
Platão nos falava sobre o Mito da Caverna. Explica que estamos como que no fundo de uma caverna em cujas paredes imagens estão sendo projetadas. O que enxergamos são apenas imagens das idéias reais projetadas de fora da caverna. Para Platão o mundo real não é este em que vivemos. Este mundo contém apenas representações do mundo real que é o das idéias.
Nós só enxergamos por que existe luz. No escuro nada nos é perceptível. Nossa visão é relativa à luz existente. Escutamos entre 1500 e 3000 ciclos. Antes e depois disso, respectivamente, nada percebemos.
Quase todos animais escutam e enxergam além de nossos parcos limites. Alguns possuem até mais sentidos que nós. Como o morcego e seu radar. O tubarão com seus sensores que percebem qualquer movimento dentro d’água.
Charlie Chaplin foi a um show de imitações para imitar a si mesmo. Fácil; era só ser ele mesmo. Pois é, mas o resultado foi surpreendente. O gênio criador de Carlitos ficou lugares atrás do 1º colocado na imitação de si próprio.
Não conseguimos nos imitar. Nós nos vemos diferente do que os outros nos vêm. Provavelmente nem saibamos dos motivos de sermos tal como somos. Ao interpretar o que vemos (e tudo que enxergamos é relativo à luz), sempre colocamos algo de pessoal no visto.
Às vezes nos sinto pequenos, limitados, presos às nossas causas e armadilhas existenciais. Mas, é só lembrar esses detalhes para perceber a grandeza humana. Com todos esses limites, ignorâncias, fraquezas, dificuldades e problemas que nos cercam, ainda construímos um mundo.
Imperfeito, complicado, caótico como nós mesmos. Mas funcionando. Estamos nos multiplicando e nos mantendo vivos, não estamos? E funciona para mais de 6 bilhões de pessoas. Não é admirável? Já pensou não houvesse tantos limites, tanta indiferença, tanta estupidez e essas dificuldades todas que enfrentamos, onde chegaríamos?
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Luiz Mendes
27/01/2011.