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Lia Diskin e Sérgio Vaz

por Fernanda Danelon

Sarau na periferia é palco do encontro entre a professora e o escritor

São 19h40 de uma quarta-feira e o tempo se arrasta no congestionamento da marginal Pinheiros, em São Paulo. No carro, a professora Lia Diskin, 59 anos, seguindo rumo ao bar Zé Batidão para conhecer Sérgio Vaz, 46, escritor e produtor cultural.

O tradicional boteco do Jardim São Luís abriga há nove anos o sarau da Cooperifa e foi palco do segundo encontro entre homenageados do Prêmio Trip Transformadores 2010. Um grito de guerra dá início à celebração que reúne 200 pessoas: “É noite de poesia. Temos 60 inscritos pra declamar”, diz Sérgio.

Lia observa tudo com atenção. Acostumada a promover projetos de democratização do conhecimento, ela comenta o projeto de Sérgio: “Aqui as pessoas se aplaudem. Cada um reconhece no outro um mérito e isso é muito bonito, pois são pessoas que nunca se sentiram parte da sociedade”.

O produtor explica que seu objetivo é construir algo melhor para si e para outros que moram na periferia da cidade. “Faço isso para que as pessoas não queiram se mudar daqui, mas queiram mudar aqui.”

Quilombo cultural é o apelido do sarau da Cooperifa, nome inspirado na ideia de uma cooperativa da periferia. Como o quilombo, o sarau é um espaço de resistência cultural, onde todos se encontram, de trabalhadores nordestinos a donas de casa, passando por estudantes e intelectuais. “O governo te coloca num lugar desses, onde a saúde e a educação são precárias, onde não há teatro, biblioteca nem cinema.

A pessoa pega dois ônibus depois do trabalho e vem aqui ler poesia? Isso é que é a insustentável leveza do ser, de que [Milan] Kundera falou”, diz ele, citando o célebre autor tcheco e sua obra clássica. Ao atrair também um público de classe média, como Lia, Sérgio diz que pretende mudar a imagem de que a vida na periferia se resume à violência.

Foi em casa, na estante do pai, que Sérgio aprendeu a amar os livros. O lar humilde guardava obras da literatura, e o menino que sonhava em ser jogador de futebol não resistiu aos encantos de Machado de Assis. Adulto, dedica a vida para levar arte às comunidades carentes. A Cooperifa inspirou outros 40 saraus. Sérgio também promove o Cinema na Laje, projeto que organiza exibições populares de filmes.

Jornalista argentina radicada no Brasil, Lia é coordenadora do Comitê Paulista para a Década de Paz – programa da ONU para disseminar a cultura de paz. É responsável pelas visitas do Dalai Lama ao Brasil. Ao lado do marido, Basílio, fugiu da ditadura e aqui fundou um centro para crianças órfãs e também a Associação Palas Athena, que, em parceria com a Unesco, desenvolve dezenas de projetos. O mais recente vai oferecer cursos de aprimoramento para professores de uma centena de escolas em São Paulo.

Lia e Sérgio veem como um de seus objetivos a luta contra a desigualdade e a violência. “Não é suficiente viver, é preciso experimentar a vida”, diz Lia, citando o autor Joseph Campbell.

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