Queria ser parte da paisagem, mas avisto sozinha o mar vermelho. Somente eu mesma posso tirar a foto. Ondas e oceano. Eu só. Não! Só água...
Atire a primeira pedra quem jamais se sentiu só. E a segunda, quem, mesmo acompanhado, não esteve sozinho. “Somos companheiros da solidão do outro”, escreveu Oriah Mountain Dreamer.
Tenho pessoas em torno de mim por toda parte. Minha adorável – e excêntrica – família. Amigos queridos, tão amados. Colegas de trabalho, gente que admiro conhecendo pouco ou muito. Às vezes minha imaginação é tão ativa que acredito que até desencarnados estejam por perto! Atesto minha loucura. Mesmo assim, nada basta para que me sinta acompanhada. Dirijo em imensas, quase intransitáveis, avenidas. O trânsito parece um gigantesco estacionamento. Como eu posso me sentir sozinha aqui? Toda essa gente junta de um lado. E eu de outro. Essa sensação de estar só.
Poucos não foram os poetas que escreveram a respeito da solitude concatenada ao amor – ou à ausência dele. Olho os casais, depois da inebriante paixão, e não avisto mais que dois indivíduos sós, mas não isolados, compartilhando algo em comum – no melhor dos casos de um relacionamento. Duas partes inteiras que se formassem uma seriam reduzidas pela metade! Por outro ângulo, alguns pensadores viveram sozinhos por terem características intelectuais de tempos posteriores aos seus. Esses, como Leonardo da Vinci, sofreram de algo como solidão ideológica. Outros optaram por se isolar para encontrar Deus, como os monges retirantes. Em florestas e cavernas, buscam por outro. Também amam e estão sós. Assim, penso que talvez as poesias relatem a verdade. Por meio do amor eu me sinto só, ou tenho minha solidão acompanhada. No anonimato, esses monges têm outra forma de solidão que só pode ser curada com um entre todos – este que, ironicamente, está em todo lugar – ao contrário de mim, que me sinto só porque falta uma única pessoa, que aparentemente não pode ser encontrada em lugar algum!
Francamente, eu o que busco? Por que amor nenhum basta para preencher as lacunas que me induzem a pensar que sou só? Por que a compreensão ou simples aceitação dos que me dão ouvidos não pode destruir minha solidão? Por que desejo ser entendida plenamente e recuso o amor condicional? Por quê? Eu estou só, mesmo quando existe alguém por perto e sofro implorando por companhia. Então procuro distrações para que não me sinta assim. Ao mesmo tempo em que me distraio das sensações, me distraio também da vida. Abandono grande porção dela quando separo momentos agradáveis dos desagradáveis. Períodos que, com o toque da diversão, me fazem acreditar que sou feliz quando o máximo que consigo é ter momentos de entretenimento. Que tristeza! Eu quero me ocupar de mim. Bastar em mim sozinha, sem sentir-me só ou ser egoísta, e usufruir a presença do outro, sem projetar nele a injusta responsabilidade de me fazer feliz.
Se eu não sou feliz, nada pode me fazer feliz”, disse o mestre. Foi embora depois de olhar nos meus olhos para proferir: “Se você tem uma razão para me amar, eu não quero teu amor”. Ahh! Mas eu só sei amar por razões pontuais – e inconscientes. Vexatório, mas ele está certo. Meu racional induz ao que chamo de amor. As pessoas que se aproximam de mim são submetidas a um teste invisível de valores e preferências, e, se aprovadas, então fazem parte do meu círculo. Aí digo que amo meus amigos! Por favor, que fique claro, não somente eles... Posso amar também todas as crianças aidéticas africanas! Mas Deus me ajude a ser amorosa pelo sujeito que eu sei dos defeitos (somente características se eu pudesse não julgá-lo) ou os que ofendem minha família e desonram meus amigos. Não sou capaz de amar incondicionalmente, concluo, embora viva iludida querendo dito o sentimento dos demais. Cobro dos outros que me aceitem como sou. Mas eu o que faço? Como sou pequena e insignificante!
Aqueles poetas românticos tinham razão. Digitada tais linhas, falta amor na vida desta que sou – que nem sequer sabe o que amar significa. E que, na insanidade, acredita que, mesmo assim, sinceramente, ama todos os amigos e a família, assim como os deuses sobre todo o universo. Daí brota a solidão que se ramifica por cada e toda faceta de vida minha. As escrituras se provam certas novamente. Elas falam do amor incondicional que nada sei a respeito e atestam que a ignorância é a raiz de todos os males, inclusive da solidão.
Somente água
Com maestria no Vedanta, ele me diz que me ama simplesmente porque realizou que si próprio é o amor. Diz para mim que, quando estou só, e peço por Deus sem vê-Lo, Ele é a solidão. Complementa ensinando a verdade universal de que nada existe além Dele. Eu nada entendo. Ele fala sobre ondas, mar e oceano. Eu penso sozinha em toda aquela água.
Anos depois, em um retiro de ioga que participo só, em Ras Sudr, no Egito, próximo ao mar Vermelho, sou abduzida pela beleza do oceano relembrando as palavras que somente ali fizeram sentido. “Sofremos porque conscientizamos a onda durante toda a vida. Por esse prisma, questionamos o motivo pelo qual somos fortes ou fracos, grandes ou pequenos. Indagamos a respeito da praia que estamos, freqüentemente querendo estar em outras distantes. Durante nossa breve vida, não falta sofrimento. Em curtas vidas, nascemos e morremos sem viver. Em algum momento, descobrimos Deus, o mar! Rezamos para que o mar nos leve às praias que queremos e nos transforme em uma onda diferente da que somos. Um belo dia percebemos que a onda não está separada do mar. Nasce e morre nele.” Tive um sorriso no meu rosto por largo tempo. Finalmente não mais estava sozinha.
Ao encontrar a instrutora que coincidentemente tinha conhecido na Índia anos atrás, contei entusiasmadamente a experiência enquanto relatava minha falta de sabedoria ao sentir-me só. Mas ela me surpreende com um único comentário. “E você sabe que não é nem onda nem mar, não?” A pergunta me deixa intrigada. Ela então conclui: “Nada existe além de água”.
Como os grandes pensadores, sofro de solidão ideológica, mas, ao contrário deles, por falta de capacidade de compreensão. Ainda rezo para que o mar me abençoe. Mergulhada na água sinto a força do oceano, que é característica do volume da água em si. “Sozinha, Ele é tua solidão.” O mestre imortalizado em suas palavras. “Só água.” Entro no mar observando a onda acompanhada pelo mar. Sinto, então, a água alimentar minhas esperanças de realizar a vida além da forma de uma onda que penso ser; além do espaço do mar que interpreto estar sobre todas as coisas. Assim algo me conforta e a solidão parece existir somente neste holograma que os cientistas chamaram de universo e os hindus de maya. Essencialmente água. Só água.
Tenho pessoas em torno de mim por toda parte. Minha adorável – e excêntrica – família. Amigos queridos, tão amados. Colegas de trabalho, gente que admiro conhecendo pouco ou muito. Às vezes minha imaginação é tão ativa que acredito que até desencarnados estejam por perto! Atesto minha loucura. Mesmo assim, nada basta para que me sinta acompanhada. Dirijo em imensas, quase intransitáveis, avenidas. O trânsito parece um gigantesco estacionamento. Como eu posso me sentir sozinha aqui? Toda essa gente junta de um lado. E eu de outro. Essa sensação de estar só.
Poucos não foram os poetas que escreveram a respeito da solitude concatenada ao amor – ou à ausência dele. Olho os casais, depois da inebriante paixão, e não avisto mais que dois indivíduos sós, mas não isolados, compartilhando algo em comum – no melhor dos casos de um relacionamento. Duas partes inteiras que se formassem uma seriam reduzidas pela metade! Por outro ângulo, alguns pensadores viveram sozinhos por terem características intelectuais de tempos posteriores aos seus. Esses, como Leonardo da Vinci, sofreram de algo como solidão ideológica. Outros optaram por se isolar para encontrar Deus, como os monges retirantes. Em florestas e cavernas, buscam por outro. Também amam e estão sós. Assim, penso que talvez as poesias relatem a verdade. Por meio do amor eu me sinto só, ou tenho minha solidão acompanhada. No anonimato, esses monges têm outra forma de solidão que só pode ser curada com um entre todos – este que, ironicamente, está em todo lugar – ao contrário de mim, que me sinto só porque falta uma única pessoa, que aparentemente não pode ser encontrada em lugar algum!
Francamente, eu o que busco? Por que amor nenhum basta para preencher as lacunas que me induzem a pensar que sou só? Por que a compreensão ou simples aceitação dos que me dão ouvidos não pode destruir minha solidão? Por que desejo ser entendida plenamente e recuso o amor condicional? Por quê? Eu estou só, mesmo quando existe alguém por perto e sofro implorando por companhia. Então procuro distrações para que não me sinta assim. Ao mesmo tempo em que me distraio das sensações, me distraio também da vida. Abandono grande porção dela quando separo momentos agradáveis dos desagradáveis. Períodos que, com o toque da diversão, me fazem acreditar que sou feliz quando o máximo que consigo é ter momentos de entretenimento. Que tristeza! Eu quero me ocupar de mim. Bastar em mim sozinha, sem sentir-me só ou ser egoísta, e usufruir a presença do outro, sem projetar nele a injusta responsabilidade de me fazer feliz.
Se eu não sou feliz, nada pode me fazer feliz”, disse o mestre. Foi embora depois de olhar nos meus olhos para proferir: “Se você tem uma razão para me amar, eu não quero teu amor”. Ahh! Mas eu só sei amar por razões pontuais – e inconscientes. Vexatório, mas ele está certo. Meu racional induz ao que chamo de amor. As pessoas que se aproximam de mim são submetidas a um teste invisível de valores e preferências, e, se aprovadas, então fazem parte do meu círculo. Aí digo que amo meus amigos! Por favor, que fique claro, não somente eles... Posso amar também todas as crianças aidéticas africanas! Mas Deus me ajude a ser amorosa pelo sujeito que eu sei dos defeitos (somente características se eu pudesse não julgá-lo) ou os que ofendem minha família e desonram meus amigos. Não sou capaz de amar incondicionalmente, concluo, embora viva iludida querendo dito o sentimento dos demais. Cobro dos outros que me aceitem como sou. Mas eu o que faço? Como sou pequena e insignificante!
Aqueles poetas românticos tinham razão. Digitada tais linhas, falta amor na vida desta que sou – que nem sequer sabe o que amar significa. E que, na insanidade, acredita que, mesmo assim, sinceramente, ama todos os amigos e a família, assim como os deuses sobre todo o universo. Daí brota a solidão que se ramifica por cada e toda faceta de vida minha. As escrituras se provam certas novamente. Elas falam do amor incondicional que nada sei a respeito e atestam que a ignorância é a raiz de todos os males, inclusive da solidão.
Somente água
Com maestria no Vedanta, ele me diz que me ama simplesmente porque realizou que si próprio é o amor. Diz para mim que, quando estou só, e peço por Deus sem vê-Lo, Ele é a solidão. Complementa ensinando a verdade universal de que nada existe além Dele. Eu nada entendo. Ele fala sobre ondas, mar e oceano. Eu penso sozinha em toda aquela água.
Anos depois, em um retiro de ioga que participo só, em Ras Sudr, no Egito, próximo ao mar Vermelho, sou abduzida pela beleza do oceano relembrando as palavras que somente ali fizeram sentido. “Sofremos porque conscientizamos a onda durante toda a vida. Por esse prisma, questionamos o motivo pelo qual somos fortes ou fracos, grandes ou pequenos. Indagamos a respeito da praia que estamos, freqüentemente querendo estar em outras distantes. Durante nossa breve vida, não falta sofrimento. Em curtas vidas, nascemos e morremos sem viver. Em algum momento, descobrimos Deus, o mar! Rezamos para que o mar nos leve às praias que queremos e nos transforme em uma onda diferente da que somos. Um belo dia percebemos que a onda não está separada do mar. Nasce e morre nele.” Tive um sorriso no meu rosto por largo tempo. Finalmente não mais estava sozinha.
Ao encontrar a instrutora que coincidentemente tinha conhecido na Índia anos atrás, contei entusiasmadamente a experiência enquanto relatava minha falta de sabedoria ao sentir-me só. Mas ela me surpreende com um único comentário. “E você sabe que não é nem onda nem mar, não?” A pergunta me deixa intrigada. Ela então conclui: “Nada existe além de água”.
Como os grandes pensadores, sofro de solidão ideológica, mas, ao contrário deles, por falta de capacidade de compreensão. Ainda rezo para que o mar me abençoe. Mergulhada na água sinto a força do oceano, que é característica do volume da água em si. “Sozinha, Ele é tua solidão.” O mestre imortalizado em suas palavras. “Só água.” Entro no mar observando a onda acompanhada pelo mar. Sinto, então, a água alimentar minhas esperanças de realizar a vida além da forma de uma onda que penso ser; além do espaço do mar que interpreto estar sobre todas as coisas. Assim algo me conforta e a solidão parece existir somente neste holograma que os cientistas chamaram de universo e os hindus de maya. Essencialmente água. Só água.