Tpm esteve na manifestação pelo fim da cultura do estupro e perguntou o que as mulheres fazem (e usam) quando se sentem ameaçadas nas ruas
Milhares de mulheres se reuniram em diversas capitais do país ontem para pedir o fim da cultura do estupro no ato batizado de Por Todas Elas. Umas das reivindicações foi a saída de Fátima Pelaes da chefia da secretária de Políticas para Mulheres. Ela foi duramente criticada por ser contrária ao aborto. Em fala de 2010, chegou a afirmar ser contra o procedimento mesmo em casos de estupro — em nota divulgada pouco antes do início das manifestações, Fátima recuou e se disse, hoje, favorável ao aborto em caso de violência sexual. Na Av. Paulista, em São Paulo, faixas e cartazes pediam também a punição dos 33 acusados de estuprar coletivamente uma menina de 16 anos no Rio de Janeiro.
Tpm foi à manifestação na capital paulista e perguntou o que as mulheres fazem quando são ameaçadas ou assediadas nas ruas.
É importante lembrar que 70% dos estupros cometidos no Brasil tem como algozes parentes, namorados ou conhecidos da vítima. Ou seja, a maior parte dos casos acontece dentro de casa. Ainda assim, o medo caminha com elas pela rua e muitas preferem se prevenir a esperar que o pior aconteça.
Marina Tavares tem 26 anos e é administradora. A jovem não tem o costume de ir a passeatas contra ou a favor do governo — mas ir à Paulista com as mulheres, ela explica, era uma questão de "resistência". “Eu nunca sofri abuso, mas todos os dias a gente sofre assédio nas ruas. Inclusive vindo pra cá, no metrô, um cara mexeu comigo na escada rolante: ‘nossa senhora, hein?’”.
Já a publicitária Angélica Trindade marcou presença em alguns atos recentes contra o PT e decidiu repetir a dose na passeata das mulheres. “O que é isso, eles querem dizer que a culpa do abuso é nossa? Pelas roupas que usamos? Está errado, precisamos combater esse pensamento que hoje é normal e repetido pela maioria das pessoas.” Quando precisa andar em alguma rua escura, procura ficar perto de outro grupo de pessoas ou mulheres. Assim, ela diz, se sente mais segura.
A estudante de administração pública Laís Menegon, de 20 anos, chegou a carregar um estilete na bolsa exclusivamente para se proteger. Ela nunca precisou usar, e hoje faz da chave do carro um instrumento para se sentir menos vulnerável quando anda à noite.
Liza Peixoto tem 19 anos e é estudante de Moda. "Eu li em uma pesquisa na internet que os possíveis abusadores evitam as mulheres que estão carregando um guarda-chuva porque pode ser usado [para se defender]. Desde então, é o que tenho em mãos quando me sinto em risco", conta, enquanto tira o guarda-chuva amarrado na cintura.
A estudante de fotografia Raquel Pfutzenreuter, 20, aproveita o estilete, parte do material de seu curso, como proteção quando se sente em risco. "Eu nunca precisei usar, ainda bem! Mas deixo na manga da blusa quando desço do metrô. Se perguntarem, é só mais uma das coisas que eu uso na faculdade. Sinto que posso me proteger assim."
Outra que usa o material escolar é Gabriela, de 17 anos. "Onde eu moro é muito perigoso. Sempre que eu estou voltando do cursinho, fico com a caneta em um lugar fácil de pegar na bolsa. Se precisar, eu furo mesmo", afirma.
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Mariana Goldoni já foi assediada quando estava com uma amiga no transporte público. "O busão tava muito cheio e um cara começou a encoxar a gente. Eu teria agredido ele se tivesse espaço, sou lutadora de Muay Thai. Como não dava pra fazer nada ali, começamos a gritar para o motorista que obrigou o cara a descer. Do lado de fora, ele começou a xingar a gente."
A designer de 30 anos, M., quando se desloca a pé, usa as chaves entre os dedos em uma posição estratégica. Ela conta que assim também já agiliza para entrar em casa. "A gente se sente ameaçada, né? Se tem algum cara me olhando estranho do outro lado da rua, coloco a chave entre os meus dedos. Nunca sofri nenhum tipo de abuso, mas assédio, de cantada, sim."
Mariana Nakano é arte-educadora e faz artesanato. Sempre carrega na bolsa uma tesoura sem ponta por causa do trabalho. "Isso não vai ferir ninguém, mas pode dar uma intimidada. Já pensei em usar em algumas situações", conta.
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"A minha arma sou eu!", diz C. à Tpm. Porém, ela sabe que na hora que acontece esse tipo de situação, não é tão fácil reagir. "Uma vez um cara seguiu a mim e a uma amiga falando um monte de besteira. Fiquei com medo de ele vir pra cima. Estávamos bêbadas, mas isso não justifica. Na hora, só conseguimos pensar em nos afastar." Hoje, C. pensa seriamente em fazer aulas de defesa pessoal.
Aparentemente, P. carrega na bolsa uma lanterna. Mas, além de iluminar uma rua escura, esse apetrecho serve para se proteger de um possível abusador. É um taser, uma arma de choque. Ela tem 29 anos e confessa que já sofreu abuso na rua. “Um cara me seguiu enquanto se masturbava, ele gritava pra mim. Foi assim até o portão de casa. Chamei a polícia, mas eles não fizeram nada.”
Mariah de 20 anos e Marcela de 27 acreditam que todas as meninas deveriam aprender, ainda na escola, a como se defender em casos de ataque. Elas não acham que carregar qualquer instrumento para defesa pessoal aumente a cultura de violência. “É uma cultura de resistência, entende?”, diz Mariah. Ambas costumam carregar as chaves entre os dedos quando se sentem em situação de risco.
Elena Judensnaider é contra o porte de armas. Isso não faz com que a editora de 24 anos deixe de tomar algumas atitudes enquanto caminha de noite na rua: “Eu acendo um cigarro. Caso seja preciso, posso queimar alguém.” Para ela, aulas de autodefesa poderiam ajudar mulheres a se sentirem mais seguras.
Leila, de 18 anos ficou muito assustada com o caso de estupro coletivo no Rio de Janeiro e por causa disso, resolveu andar protegida. Hoje, anda com um canivete. “Quero poder me defender, já fui assaltada duas vezes e você percebe que agem diferente por você ser mulher.”
Créditos
Imagem principal: Diógenes Muniz