Luana Génot: personal trainer da igualdade racial

por Carol Ito

Luana Génot, criadora do Instituto Identidades do Brasil - ID_BR, fala sobre os desafios na luta pela igualdade racial no mercado de trabalho e convoca aliados para ampliar a discussão

“Eu preciso ser otimista para que a Alice viva num mundo melhor”, comenta Luana Génot, diretora executiva do Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), que está grávida de seis meses, sobre a presença de profissionais negros nas grandes empresas.

No entanto, a inserção caminha a passos lentos, como mostram dados da pesquisa “Perfil social, racial e de gênero das 500 maiores empresas do Brasil e suas ações afirmativas”, desenvolvida pelo Instituto Ethos: o setor privado vai demorar pelo menos 150 anos para que o número de pessoas negras se equipare ao número de pessoas brancas contratadas. Hoje, apenas 5% dos cargos executivos são ocupados por negros.

Já a igualdade salarial no Brasil vai demorar cerca de 72 anos para ser alcançada e, entre 1995 e 2015, a renda de 80% dos profissionais negros não passou de dois salários mínimos, de acordo com dados da Oxfam, entidade inglesa que trabalha com direitos humanos.

A pesquisa "Características Do Emprego Formal da Relação Anual De Informações Sociais (Rais) 2014" aponta que, quanto maior a capacitação, maior é a disparidade salarial. Entre os negros que entraram na universidade, o salário não passa de 80% do salário de brancos com a mesma formação.

Com o ID_BR, Luana Génot quer acelerar o processo rumo à igualdade racial. Ela abandonou a carreira como modelo para trabalhar como publicitária e, em 2007, decidiu se especializar em assuntos ligados à igualdade racial. “Quando eu era modelo de passarela sabia que era muito bonita, mas tinha um problema: sou negra. Percebi que ganhava menos do que minhas colegas brancas”, relata. A partir daí, ela começou a pensar em maneiras de lutar contra a desigualdade no mercado de trabalho.

Em 2012, Luana conseguiu uma bolsa para estudar marketing e temas relacionados a raça, etnia e mídia na University of Wisconsin, em Madison, nos Estados Unidos. Foi voluntária na campanha do Presidente Obama e trabalhou em uma agência de publicidade voltada para o empoderamento negro. Em 2015, iniciou um mestrado e hoje atua como palestrante e gestora de projetos ligados à equidade racial e empreendedorismo.

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O ID_BR oferece consultoria para que empresas possam desenvolver ações efetivas para promoção de igualdade racial, tanto relacionadas ao quadro de funcionários quanto campanhas publicitárias. “Existem empresas que querem profissionais para além de novembro, o mês da consciência negra. Mas muitas investem em atividades em novembro como se isso fosse resolver todo um problema histórico que, na verdade, tem que ser trabalhado todo dia”, observa.

Personal trainer da igualdade racial

Luana defende a adoção de cotas para negros nas empresas, assim como existem em universidades: “Não acredito que naturalmente vamos chegar à igualdade. Tudo acontece na base de muita luta e muita resistência. Estou aqui porque houveram muitos movimentos que possibilitaram que uma uma mulher negra pudesse ter acesso à faculdade, ter uma bolsa para estudar fora, só que isso ainda é uma exceção”, enfatiza.

“Muitos jovens negros não têm referencias dentro da família, por exemplo, de profissionais que eles querem ser”
Luana Génot

Ela acredita que somente empregar pessoas negras não garante a igualdade, pois é preciso criar um ambiente que torne isso possível. Nesse sentido, o ID_BR tem um trabalho minucioso que envolve ações ligadas à três pilares: educação, empregabilidade e eventos, que estimulem a formação de um cenário diverso. “Muitos jovens não têm referencias dentro da família, por exemplo, de profissionais que eles querem ser. É preciso trabalhar esse imaginário com eles e ao mesmo tempo com as empresas sobre a possibilidade de terem esses jovens dentro da equipe”, explica a diretora.

 

Outro ponto importante é trabalhar a empatia. Em artigo publicado recentemente no LinkedIn, ela relata uma situação que viveu ao criticar a ação publicitária racista. “Tanta gente falou que era coisa da minha cabeça que eu estava quase achando que era mesmo!”, ironiza. A empatia é necessária para sensibilizar gestores de empresas, mas é só o primeiro passo. O segundo é partir para ação: “Um grupo foi sensibilizado, percebeu a naturalização do privilégio e o que fazer com isso? Esse é o momento do pós-empatia, é avaliar e traçar metas. Para mim, essa é a parte mais interessante”.

Por conta dessa abordagem estratégica ela se considera uma “personal trainer da igualdade racial”, junto com sua equipe de trabalho. “No longo prazo, isso vai repercutir na maior entrada de profissionais negros, porque tudo isso leva tempo, é uma cultura, é repetição, para que haja mudança”, acredita.

É preciso furar as bolhas

Para Luana, o grande desafio para enfrentar a desigualdade racial hoje é furar as bolhas, desnaturalizar o privilégio. “É normal todo mundo ter um celular bom, poder fazer duas ou três viagens internacionais na vida, mas quem acha isso normal é privilegiado”, explica.

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Nessa fase de luta contra o racismo, ela convoca aliados: “É preciso que pessoas brancas, do lugar de fala delas, levem a mensagem onde os negros não alcançam, não pela falta de potência, mas porque o racismo está enraizado na sociedade”. Luana é a favor do diálogo: “Precisamos de aliados para sair da bolha. Eu quero falar com o cara que tem a caneta, que tem 19 anos de empresa, 300 funcionários, aquele que vai dizer que o racismo é coisa da minha cabeça”.

Para 2018, o ID_BR pretende ativar uma plataforma de hanckeamento de empresas que tenham iniciativas para ampliar a diversidade. Além disso, foi estabelecida uma parceria com a empresa global de pesquisa sobre mercado de trabalho, Great Place to Work, com o objetivo de acompanhar a elaboração dos questionários e garantir a presença do recorte racial. “A gente quer fazer com que haja um maior acesso sobre as empresas que estão engajadas. Seja pelo amor ou seja pela dor, precisamos falar sobre isso”.

Créditos

Imagem principal: Divulgação / Alex Cassiano

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