Reivindicações dos direitos da mulher

por Djamila Ribeiro

Djamila Ribeiro escreve sobre as desigualdade de gêneros ainda existentes na sociedade e a luta da escritora Mary Wollstonecraft no século 18

Quando falamos em feminismo, muitas vezes, há interpretações equivocadas. Desde que feministas odeiam homens até o mito de que elas querem privilégios. A questão a ser entendida é que existe desigualdade de gêneros na sociedade em todos os âmbitos. Por exemplo, mulheres brancas ganham até 30% por menos do que homens brancos, mulheres negras quase 70% menos.

A violência contra a mulher alcança dados alarmantes. A cada 11 minutos uma mulher é estuprada e, a cada 5 minutos, uma é agredida no Brasil.

Com base nesses dados, podemos perceber que o objetivo do movimento feminista, além de denunciar essas disparidades, é buscar direitos e não privilégios, já que numa sociedade desigual, mulheres seguem sem direitos básicos. A busca é pela equiparação desses direitos. Nesse sentido, uma obra escrita ainda no século XVIII merece destaque. Reivindicações dos direitos da mulher, de Mary Wollstonecraft, publicado em 1792, aborda questões importantes sobre a situação da mulher, reivindica a equidade de gênero e faz uma crítica a autores iluministas que em relação às mulheres não faziam uso da razão e critica as imposições às mulheres. Mary fala de forma direita sobre as desigualdades, no capítulo “Censuras a alguns dos escritores que têm tornado as mulheres objetos de piedade, quase de desprezo”, Wollstonecraft critica o modo pelo qual alguns escritores e pensadores retratam a mulher.

Em um trecho no qual critica o filósofo Rousseau, mostra o quanto a mulher não era vista como um ser autônomo: “(...) passa a provar que a mulher deve ser fraca e passiva, porque tem menos força física do que o homem; e, assim, infere que ela foi feita para agradar e ser subjugada por ele e que é seu dever fazer agradável a seu mestre – sendo este o grande fim de sua existência”. O brilhantismo desse trecho é tão forte quanto a sua atualidade.

Apesar de mudanças que tivemos ao longo dos tempos, a mulher ainda é vista como “aquela que precisa do homem pra existir”, dependente. As propagandas, revistas, ainda retratam a mulher de modo estereotipado e as associando exclusivamente à futilidade, vida doméstica. O problema não é em hipótese alguma ser dona de casa, o problema é a imposição desse papel negando à mulher a possibilidade concreta de escolha.

Um dos pontos abordados por Mary é o acesso das meninas à educação formal. Hoje podemos dizer que esse aspecto melhorou, mas se formos observar a realidade de meninas de regiões mais pobres, essa pauta ainda segue necessária. Do mesmo modo, ainda existem imposições que negam às meninas e mulheres fazer escolhas.

Não à toa, a autora é considerada uma das fundadoras do feminismo e influenciou as efervescentes discussões de gênero que viriam depois. Wollstonecraft reivindicava a emancipação feminina, sua obra é considerada libertária e revolucionária. Mesmo tendo sido publicado em um momento histórico muito diferente, Reivindicações dos direitos da mulher chama a atenção pela atualidade, mesmo tendo sido escrito há mais de 200 anos. Sua obra também é pioneira porque, além de criticar as desigualdades de gênero, Mary foi um atuante abolicionista, já sinalizando que a libertação das mulheres deveria ser abrangente, contemplar as diversas possibilidades de ser mulher; nos ensinou que o feminismo não poderia compactuar com outras formas de opressões. Esse olhar mais amplo que contempla as diversas especificidades ganharia mais força muitos anos depois, a partir da década de 60 com as feministas negras norte americanas. Ou seja, Wollstonecraft  já apontava para a necessidade de um feminismo que tivesse como premissa respeitar as intersecções de raça e gênero.

Mary Wolltonecraft foi uma mulher à frente do seu tempo que reivindicava a cidadania plena para as mulheres.

A Boitempo Editorial publicou recentemente o livro no Brasil e, ao fazê-lo, nos dá a oportunidade de conhecer um dos documentos fundantes do feminismo e nos proporciona uma reflexão crítica urgente e importante sobre a equidade de gênero e a necessidade da luta política para efetivar e ampliar os direitos das mulheres.

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Imagem principal: Divulgação

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