por Lia Hama
Tpm #151

Escritora e ilustradora, Rita Carelli passou a infância entre povos indígenas e lança agora uma coleção de livros sobre a vida nas aldeias

Filha de uma antropóloga e um documentarista, a paulistana Rita Carelli, 31 anos, passou parte da infância em aldeias indígenas no Mato Grosso, no Maranhão e no Tocantins. Ali conheceu os banhos de rio, as brincadeiras de arco e flecha e o consumo da mandioca. Rita é a idealizadora da coleção "Um dia na aldeia", lançada este mês pela Cosac Naify. São seis livros infantis (mas que os adultos também vão gostar) sobre a vida em tribos no Brasil. Eles vêem acompanhados de vídeos feitos por indígenas. À Tpm, Rita, que escreveu e ilustrou parte dos livros, falou sobre o projeto

Que memórias você tem das aldeias? A lembrança mais antiga é de uma aldeia Krahô, na divisa do Maranhão com o Tocantins. Eu tinha 3 anos. Meu irmão, Pedro, dois anos mais velho, participou de um ritual de iniciação dos meninos. Ele tinha o corpo coberto de plumas, parecia um menino-pássaro, e, no meio do pátio, havia um boi morto para a festa. Me lembro de bater na barriga do animal para ouvir o som de tambor que fazia. É um mundo cheio de rituais e intensa vida coletiva. 

Como era a sua relação com os índios? Muito boa, os índios em geral se mostravam receptivos, alegres, curiosos, e eu era extrovertida e risonha. Meus pais sempre tiveram um trabalho respeitoso em relação a eles, então herdei uma dose de confiança e até de carinho. Isso faz toda a diferença ao lidar com povos que foram sistematicamente explorados, surrupiados e enganados ao longo da história. 

Qual é o objetivo da coleção? É minha maneira de partilhar com as crianças a sorte de ter conhecido esses grupos e de tentar diminuir a ignorância do Brasil sobre seus povos nativos. Desde 2008 as escolas são obrigadas a incluir no currículo “cultura indígena”, mas são povos diversos e complexos e falta material de qualidade e formação para os professores, que acabam misturando alhos com bugalhos. Daniel Munduruku, escritor indígena, disse que não existem índios no Brasil, existem Mundurukus, Xavantes, Krenaks, Ianomâmis. Essa coleção pretende apresentar um pequeno panorama da infância de alguns desses povos.

Como foi o processo de criar as histórias? Elas derivam de filmes feitos por cineastas indígenas que trabalham junto ao Vídeo nas Aldeias, uma ONG que se dedica à formação deles há quase 30 anos. 

Os índios retratados viram os livros prontos? Como foi a reação? Poucos viram os livros prontos até agora, pois eles acabaram de sair do forno e vão precisar viajar muito para chegar às aldeias. É impossível mandar por Sedex! Então temos que aproveitar nossas viagens ou as vindas dos indígenas para fazê-los chegar em cada comunidade, o que deve ocorrer em breve. Mas as versões virtuais dos livros foram submetidas à aprovação deles, que parecem ter gostado! 

Vai lá: Coleção “Um dia na aldeia”, ed. Cosac Naify, R$ 39,90 o exemplar

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