La femme sauvage

por Autumn Sonnichsen
Tpm #178

No Mediterrâneo, ela conseguia se tornar a mulher selvagem que tinha guardado dentro dela

Encontrei, em Nice, a Melissa, uma parisiense que se mudou para cá atrás de um amor há mais ou menos um ano. Ela é das mulheres mais estilosas que já conheci na vida, de verdade; tem uma elegância inata, que sai das vísceras dela. Trabalhava com alta-costura quando morava em Paris, botava salto e fazia escova para trabalhar todos os dias. Trabalhava muito, cansou um pouco. Um dia, ela fez uma viagem pela Bahia – me disse que foi no Brasil que encontrou o lado primitivo e indomesticado dela.

E levou esse lado de volta à França: “Autumn, eu me sinto mais bonita em Paris, mas, aqui no Mediterrâneo, consegui me tornar a mulher selvagem que tinha guardado dentro de mim”. Deixou o cabelo ondulado crescer de novo. Me levou para acampar na montanha aqui perto e me mostrou o rio onde ela colhe o barro branco que usa para fazer esculturas e cerâmicas.

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Primeira vez

Hoje, fui remar com meu amigo Victor. A gente tem desenvolvido um ritmo nesses dias aqui: acordo primeiro, faço um chá e levo pra ele na cama, porque, se não o acordo, o Victor não levanta. Dou um beijo na mulher dele, que nos abraça e volta a dormir. Hoje, quando fui acordá-lo, tinha duas mulheres na cama. E as duas se chamam Veronica. Eu que apresentei a segunda para ele.

Eu e o Victor paramos no café italiano na praça ao lado para tomar em pé um café espresso, andamos até o clube náutico, colocamos o barco na água e remamos até a próxima cidade. Na ida, ele corrige a minha técnica; na volta, a gente faz um treino mais forte.

Depois da remada de hoje, fui dar um mergulho e encontrei a Melissa indo nadar com o biquíni cor-de-rosa dela. Aqui se entra no mar pela pedra, como se fosse uma piscina incrivelmente profunda, com o corpo todo de uma vez só. A água é sempre azul, transparente e glacial.

Um senhor que devia ter uns 70 anos, de touca e óculos de natação, pulou no mar logo antes e, quando reapareceu na superfície, deu um grito alto de prazer. Olhou pra nós e disse: “Ohhhhhlalalalac’estcommela première gorgée de labière”, ou “é como se fosse o primeiro gole da cerveja”, lembrei da sensação daquela cerveja em Paris e lembrei de você.

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