Na Alemanha você não pode chamar um homem para te ajudar, inclusive porque ele não vem. E você tem que encher o seu próprio pneu de bicicleta... enquanto eles riem da sua cara!
Ela chega em casa e fala: "olha só o que eu comprei para a gente, nunca mais vamos precisar de homem". Minha amiga tem nas mãos um objeto fálico cor de rosa que não é um vibrador, mas uma bomba de encher pneu de bicicleta. Com isso, não vamos mais ter desculpas para não andar de bike porque o pneu está ruim. Não vamos mais ter que esperar que um parente homem brasileiro venha a Berlim e "resolva o problema da nossa bicicleta".
NOSSA BOMBA. Nossa independência. Nosso sutiã queimado.
No pátio interno do prédio, a erguemos orgulhosas e: bomba, bomba! Depois de umas dez tentativas, saímos de casa prontas para a nossa liberdade. No quarteirão seguinte, ferrou. Os pneus das duas bicicletas já estão completamente arriados.
O que acontece depois é uma guerra de uma hora entre duas mulheres, uma bomba, e pneus de bicicleta no meio de um canteiro de uma avenida.
Até que começa a crise do feminismo: centenas de homens passam pela gente andando ou com suas bicicletas poderosas e… NINGUÉM AJUDA NESSA MERDA!
Cadê os homens? Essa porra desses homens não ajudam! Gente, porra, não tem homem! Alguns passam e olham, sim, para a gente, mas riem. Esses babacas!
Enquanto esmurramos o pneu da bicicleta, digo para a minha amiga aos berros: esse é o preço da nossa liberdade! Eles também não param para mexer com a gente. É assim. A gente tem que pagar esse preço!
Chuto a bicicleta com ódio.
Meu feminismo entrou em conflito várias vezes naquele domingo em que descobri que a liberdade é uma bomba de bicicleta.
Mas o que aconteceu? A gente conseguiu! Mesmo com os pneus meio frouxos, chegamos até o nosso destino. E depois conseguimos voltar. Ninguém foi ferido. E ninguém morreu.
E nenhum homem ajudou.
E nenhum homem falou: "e aí, gatinha, quer ajuda, está indo para onde, quer carona?".
Mas na boa. Que me perdoem as radicais, se um homem tivesse ajudado teriamos economizado uma hora. E para mim isso não teria sido um problema sério, não.
Porém, isso nunca vai acontecer em Berlim, a terra onde os homens morreram quase todos na Guerra e as mulheres seguraram o tranco. Nenhum homem vai ajudar. Nunca.
Estávamos acostumadas a chamar o homem para arrumar a pia. Chamar um homem porque tem um vazamento na cozinha. Chamar o homem para ajudar a puxar aquela estante.
Na Alemanha não chamamos homens, inclusive porque eles não virão.
Viramos mulheres sobreviventos do tempo da Guerra reconstruindo uma cidade sozinhas porque todos os homens estão mortos. E não é que a gente sobrevive? Yah!