Quem é dono do que está na rede?

por Luiz Filipe Tavares

Debate desta quinta reuniu quatro especialistas no stand da Trip na Campus Party

O debate Propriedade da informação: quem é dono do que está na rede? foi o segundo da série de três entrevistas ao vivo que rolam aqui no stand da Trip na Campus Party 2012. Desta vez, os especialistas convidados para falar sobre o tema espinhoso foram Luli Radfahrer (PhD em Comunicação Digital pela USP e colunista da Folha de Sâo Paulo), Luiz Algarra (designer de fluxos de conversação), Juliano Spyer (autor do livro Conectado e do blog NãoZero) e Claudio Prado (estudioso da contracultura e cultura digital).

Mais uma vez com mediação do redator-chefe da revista Trip, Lino Bocchini, e com a colaboração da Casa Fora do Eixo, que ficou responsável pela transmissão ao vivo do debate pelo canal da Trip no Ustream, dezenas de pessoas assistiram a mais essa discussão no maior evento de tecnologia da América Latina. 

A conversa começou tentando identificar a questão da origem da informação, um detalhe crucial para determinar propriedade na rede. Luli Radfaher abriu o debate comentando autoria e geração de conteúdo, negando absolutamente a possibilidade de definição para a pergunta central de nosso debate. 

"Essa discussão começa com a geração do conteúdo. Esse conteúdo que vem de diversas fontes é apócrifo e não há como verificar a veracidade dele. Essa, ao meu ver, é a questão mais perigosa", declarou.

"Eu tenho problema com isso porque, para mim, essa noção de verdade não faz sentido. Quem é esse cara que sabe o que é a verdade? Isso é falacioso. O conceito de individualidade também me é estranho. Tudo que eu digo vem a partir de um fluxo de conversação", completou Luiz Algarra. "Quando eu falo, quem está falando é a minha vó, é o motorista do taxi que me trouxe até aqui, é meu professor… Eu sou um fluxo de ideias, eu não sou um indivíduo. Essas noções só servem para gerar uma matriz de controle que não faz o menor sentido."

"O conteúdo que vem de diversas fontes é apócrifo e não há como verificar a veracidade dele" - Luli Radfahrer

"A internet traz uma confusão da porra para o nosso planeta e essa confusão é muito bem vinda", crava Claudio Prado. "Essa questão da origem da informação é igual online e offline. A gente vai ter que conviver com isso. A internet é a coisa mais subversiva em relação à sociedade de consumo. A cultura digital abre uma discussão profunda em relação a essas coisas." 

Jogo de gato e rato

A produção corporativa de informação também entrou na pauta. Juliano Spyer começou diluindo um pouco a polarização de bem e mal entre "comercial fechado" e "liberdade aberta". Para ele, a linha entre essas questões é muito mais tênue do que parece.

"O agente transformador, às vezes, até consolida mais o processo anterior" - Juliano Spyer

"Me incomoda um pouco a separação muito clara entre o que é comercial e o que é aberto. A gente não vê a nova mídia formar trincheiras astutas e perigosas. O agente transformador, as vezes, até consolida mais o processo anterior. A industria de comunicação vem se consolidando ao lado da fragmentação na rede", comentou.

"Um problema dessa ideia é que a captura da propriedade intelectual é perversa", rebateu Luiz. "A grande crise tem a ver que a indústria não consegue encontrar um novo modelo para sobreviver. O imponderável está ocorrendo e eles não sabem como manter sua exclusividade. O desejo de trocar a informação é maior que a capacidade de produção de informação. Isso vai contra o modelo estabelecido. Existe informação e autoria. Se você disses que dois e dois são quatro, isso é informação. Mas se você cantarolar essa conta e gravar, isso vira autoria. Esse é o absurdo." 

"O desejo de trocar a informação é maior que a capacidade de produção de informação" - Luiz Algarra

"Há 60 anos não havia a centralização da produção de conteúdo. De repente começou a haver uma enorme concentração de conteudo cultural. Com a internet, os concentradores estão desesperados com a re-decentralização", concordou Luli. "Mas até que ponto cada conteúdo é realmente de autoria dos centralizadores? O problema do conteudo fechado é que qualquer blog picareta vai lá e reproduz sem dar fonte, impossibilitando a localização de quem publicou o conteúdo originalmente."

"O modelo de espremer a última gota de dinheiro em todas as coisas está falido. Existe hoje a maior onda de desobediência civil que o mundo já viu", comentou Claudio Prado. "Isso vai obrigar a criação de uma nova legislação. É um absurdo que essas pressões das corporações sejam acatadas pelos governos. É como se você olhasse para um retrovisor e pensasse que estava olhando para frente, para o futuro. Quem está do lado do paradigma de manter o Século XX no século XXI está condenado. Essa ideia de controlar a internet é uma ideia absurda. É preciso olhar o mundo pelo ângulo do que vem vindo, não pelo ângulo do saudosismo."

"Se patente e direito autoral existisse desde sempre, não haveria progresso" - Cláudio Prado

Claudio Prado continuou como um dos mais ativos por todo o debate. Ele fez questão de apontar que a humanidade não vive só de informação útil, explicando porque as ditas "besteiras" da internet são também parte importante do processo de abertura de propriedade digital. 

"Se todo mundo botar tudo na rede, nós teremos a rua na internet. Como organizar um mundo onde todo mundo pode acessar tudo? Por que as besteiras dos seres humanos não estariam na internet?", questionou. "Quando todo mundo tiver acesso, aí sim nós saberemos o que vai acontecer. As críticas à internet são as mesmas de qualquer mudança de paradigma. Acontece que a cultura digital acontece rápido. Tudo o que estamos discutindo aconteceu em 20 anos. O alfabeto levou 3 mil anos para chegar onde chegou.

Luiz Algarra concluiu com a máxima: "não existe almoço grátis. Quando voce está lá, acessando seu conteúdo, tem uma Telecom que está faturando, de um jeito ou de outro alguém está levando uma grana. A discussão hoje é quem vai ficar com a maior fatia."

Vale a pena assistir o debate na íntegra (vídeo abaixo).

Quem não puder participar do evento presencialmente pode acompanhar toda a cobertura e as atrações do stand pelos canais da Trip: @revista_trip e no www.facebook.com/revistatrip; e todos os debates vão ser exibidos ao vivo aqui pelo site e também pelo pessoal da Pós-TV, da Casa Fora do Eixo, que estão fazendo a transmissão online.

fechar