Texto do ano passado que gostei:

por Luiz Alberto Mendes

 

Tesão                                                          

 

 

Tudo queima pôr dentro, voraz. Um desespero se infiltra entrededos, como navio bêbado, desatracado em mar espesso. Sentir primitivo se desentranha das vísceras e super aquece, cristalizando nos olhos. Um querer demais que cega, e se esconde, sorrateiro. Estremecendo, causando pânico, abrindo caminho para o abismo do imemorável.

 Como a terra a pressentir tempestade enquanto perdura seca, somos nós mergulhados no cio. Transpassados pôr luzes e trevas, somos esse querer duro que se amolenta voluptuoso. Fogo que jamais se recusa, repercutindo como sino na arena dos desejos mais vorazes. 

Sede, boca áspera, garganta amarrando, engolindo em seco. Silêncio sem pensamentos, apenas esse ar pardo e quente. Envolvente ao se desenvolver, é sem ser, porque esta sendo além de si, fora do tempo. Não importa se tarde ou noite, mesmo que seja manhã.

Há um sofrer arrastado, uma força descomunal que vai se abrindo em fissuras, rasgando. Nem a terra ou o ar respiram, apenas um sopro efêmero a nos devastar. Tudo jamais acontecera novamente. Mas eis que de repente, não mais que de repente, como diria o poeta, ressurge qual fênix, a pulsar nas veias, determinante.               

Chuva fina que se avoluma, umedecendo tudo. O ar se desmancha e a terra ressona adocicada. É a vida brotando fecunda, cores, dança e perfume. Esperança vadia, lânguida, enquanto tudo converge.

O peso da vida se alivia em brisas suaves, tornando-se leve e oca, a sangrar sentidos. O que era febril, em lassidão se desfaz. A cobra que enrodilhada em botes, alonga-se em espuma e bolhas de sabão. 

Resta a doçura. Uma lágrima dividida que se esparrama pelo chão. De volta, aceitamos nosso inferno, insultados. Retornamos os pés no chão e, sem ousar compreender, descansamos o que somos do que sempre fomos. Agora, imersos em fartura de nossos possíveis, voltamos conformados à rotina existencial.

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Luiz Mendes

23/03/2011.      

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