O google dos sebos

por Fernanda Danelon
Trip #177

O carioca André Garcia teve uma simples: criar um portal de busca e compra de livros

Há três anos o carioca André Garcia teve uma ideia simples e inovadora: criar um portal de busca e compra de livros. Hoje, enquanto a maioria dos empresários se apavora com o caos econômico, ele planeja dobrar seu faturamento

Enquanto altos executivos e grandes acionistas procuram vislumbrar o horizonte em meio a nebulosos anseios diante da crise econômica mundial, o sol brilha forte para André Garcia. O carioca de apenas 30 anos construiu o maior portal brasileiro de busca e compra de livros em sebos, a Estante Virtual, que oferece não apenas produtos antigos com preços em conta, mas também novos com valores bem abaixo dos cobrados pelo mercado. Apenas um exemplo: o último livro de Paul Auster, Homem no escuro (Cia. das Letras, 2008) é encontrado por R$ 28 na Estante (incluindo o frete), enquanto sai por R$ 35, em média, nas grandes livrarias. Por isso, André não teme a crise: “Não me preocupo, ao contrário. A tendência é as pessoas optarem pelos produtos mais baratos, e isso a Estante oferece”, afirma antes de revelar: “Em 2007, totalizamos R$ 6 milhões em vendas. Em 2008, foram R$ 18 milhões. E nossa estimativa pra este ano é vender um total de R$ 36 milhões”.

Em pouco tempo e focado em um nicho, André construiu uma história de sucesso empresarial a partir de uma ideia inovadora. A Estante Virtual reúne 1.305 sebos e livreiros de 233 cidades do país. Disponibiliza mais de 3 milhões de livros online, o que leva 100 mil usuários a acessar o portal diariamente. Pra manter os sebos no portal, André recebe uma comissão de 5% sobre o total de vendas, mais uma taxa mensal de hospedagem de cada sebo cadastrado. Nada mau pra quem começou o negócio há três anos, aos 28 de idade.

Revolução no mercado
No fim de 2002, André empenhava-se pra virar um bem-sucedido diretor de marketing. Mas, depois de galgar a um alto cargo num respeitável banco e de alavancar a carreira numa empresa de telefonia celular, o jovem administrador de empresas continuava insatisfeito: “Estava cansado da alienante rotina corporativa. Quando vi um anúncio da empresa em que um executivo atarefado carregava um celular numa mão e um laptop na outra, foi a gota d’ água. Aquela propaganda refletia o futuro que eu estava construindo pra mim e aquilo era tudo o que eu não queria”, conta ele. Decidido a encontrar novo prumo à sua vida, André largou o emprego pra seguir carreira universitária. Voltou à casa dos pais e estudou durante dois anos pra tese que almejava defender. Mas a bolsa de estudos não rolou e André viu-se novamente sem rumo certo. Foi quando teve um insight.

Em busca dos cerca de cem livros que precisou ler para o mestrado frustrado, André percebeu o quanto era difícil garimpar títulos usados nos sebos. Os acervos mal catalogados desestimulavam qualquer leitor mais animado. Uma pesquisa na internet revelou que a falta de organização dos livreiros se estendia ao universo virtual. Pensou: “Por que não desenvolver um Google dos sebos?”. Micreiro desde a infância, André foi estudar programação e criou, sozinho, seu sistema de buscas. Dois meses depois, lançava a versão básica da Estante Virtual. Ao facilitar o acesso de leitores ao acervo de sebos, livreiros e até de outros internautas (todos os usuários podem cadastrar seus livros pra venda), o site criou uma vasta rede de comercialização de livros alternativa às livrarias. Além de obras raras e usadas, o portal abriga também livros novos e seminovos, comprados em pontas de estoque das editoras a preços baixos. “O mercado editorial brasileiro faz cerca de 50 lançamentos por dia, mas 80% dos lucros das grandes lojas vêm de apenas 20% dos títulos disponíveis. Tá aí um enorme quinhão pra ser explorado”, observa.

Democracia literária

Ao desenvolver um portal com um sistema de busca bastante eficiente, André revolucionou o setor. Uma pesquisa entre os proprietários de sebos sobre o impacto da Estante no mercado revela a transformação: 44% das vendas foram feitas através do site; 71% declararam ter feito investimentos motivados pelo aumento das vendas. “Na democrática visibilidade da web, as páginas mais visitadas são as que mais aparecem nos mecanismos de busca. O dinheiro não pode comprar classificação nesses resultados, e isso é muito saudável.” Por isso, André não precisa anunciar a Estante. Além de aparecer logo na primeira página do Google quando se procura um livro, a propaganda boca a boca garante a projeção.

De fato, André possui o maior bem que se pode desejar: tempo. Colecionador de hobbies, ostenta o luxo de despender uma manhã pedalando até o Leblon ou tocando pandeiro com um bloco de Carnaval de Laranjeiras. Adepto do ócio criativo – teoria do sociólogo italiano Domenico de Masi que sugere um sincretismo entre trabalho, lazer e estudo –, André e seus cinco funcionários trabalham somente seis horas por dia. “Quero que todos trabalhem motivados. Assim, acredito que estou colaborando para um mundo melhor. Não tô aqui só melhorando o meu lado”, acredita o jovem empresário, que mantém na cabeceira obras como Direito à preguiça, de Paul Lafargue, e Sobreviver ao trabalho, de Hermano Roberto Thiry-Cherques. “Quando estava projetando a Estante, vários amigos me aconselharam a procurar um emprego fixo. Se me diziam que eu era idealista, respondia que eles é que eram comodistas. A gente precisa se mexer pra construir uma sociedade mais pacífica e equilibrada.”

 

 

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