A Tpm foi fundo no sexo oral e descobriu que nos responsabilizamos pouco pelo nosso prazer
Quantas vezes você ficou olhando para o teto com tédio na hora do sexo oral? E quantas vezes teve coragem de dizer que não estava bom? Tpm foi fundo no assunto e descobriu que a mulher ainda se responsabiliza muito pouco pelo próprio prazer
Se você é homem e está lendo este texto, um aviso. Provavelmente você se acha muito bom de cama. E, por isso, deve ter certeza de que manda bem na hora do sexo oral. Se esse é o seu caso, atenção. As notícias não são boas. Mais do que se revoltar com caras que “não chupam”, as garotas andam insatisfeitas com caras que: 1. ficam tempo demais lá embaixo sem perceber que não estão agradando; 2. dão mordidinhas irritantes que chegam a machucar; 3. tocam com a língua em pontos que não dão prazer, pelo contrário, causam aflição.
De cem homens ouvidos pela Tpm – de idades entre 20 e 48 anos e profissões como fotógrafos, médicos e empresários –, 60% afirmaram que se consideram experts no assunto. Outros 36% disseram que praticam, mas com algumas dúvidas sobre estarem ou não proporcionando prazer. Alguns não souberam responder. Mas o mais assustador: só 4% disseram que nunca fizeram uma mulher chegar ao orgasmo com essa prática. E 95% dos entrevistados afirmaram gostar muito, mas muito mesmo, de fazer sexo oral.
“Algumas mulheres ainda têm medo de desagradar com o cheiro, acham que sexo oral é uma prática suja” Regina Navarro Lins, psicanalista
Espera. Alguma coisa não está batendo nessa conta.
E nem precisamos entrevistar cem mulheres para ter certeza disso. Bastou colocar o assunto em rodas de amigas para ouvir declarações do tipo: “A gente deixa, fica olhando para o teto, porque tem esperança de que um dia melhore”. Ou seja, as notícias também não são boas para as mulheres. A gente se acha tão moderna, mas aceita coisas como anos de sexo oral ruim sem conversar, sem ensinar como gostaria que fosse.
Os reis da oralidade
“Homem que faz sexo oral mal é a pior coisa do mundo. E eles dificilmente percebem que não estão agradando. Já passei por situações em que tentei empurrar o cara, porque não estava suportando aquilo”, diz a maquiadora Juliana Munoz, 28 anos. Para ela, que sempre conversa com as amigas sobre o assunto, a maioria dos homens não percebe que sexo oral bem-feito é mais importante do que o tamanho do pau, por exemplo.
O escritor Xico Sá, que já dissecou o assunto em mais de 200 crônicas, conta que a fama de um sujeito que “sabe chupar bem” se espalha rapidamente entre a mulherada. “Todos os caras falam em mesa de bar que são os reis da oralidade. Enquanto isso, minhas amigas reclamam da escassez de sexo oral no mercado”, diz Xico. “Nenhum homem sabe fazer sexo oral. O que alguns tentam é acertar o mínimo possível”, arrisca o escritor, assumindo que aprendeu a fazer “mais ou menos” depois de “dedicar a vida a isso”.
A escritora e cantora Vange Leonel, lésbica e casada há mais de 20 anos, concorda com a necessidade de dedicação. “A vagina é uma coisa cheia de terminações nervosas, complexa. E cada mulher tem prazer em uma área diferente. As pessoas precisam conhecê-la melhor.” Sim, existe o mito (que tem tudo para ser verdade) de que lésbicas fazem sexo oral melhor porque é mais fácil mexer naquilo que se tem. Mas, segundo Vange, não é só isso. “Entre mulheres, o sexo é oral em todos os sentidos. A gente não só dá valor às preliminares, como também fala sobre o que gosta e o que não gosta.”
De acordo com o terapeuta sexual Deva Nishok, criador de oito tipos de massagem tântrica – e dono de uma clínica em São Paulo famosa por proporcionar às mulheres orgasmos múltiplos durante as sessões de massagem –, muitos dos homens de hoje, tão modernos, não sabem nem a localização do clitóris. E as moças não ficam atrás. “Nem a própria mulher sabe. É uma desinformação generalizada. Há duas glândulas na parte interna dos pequenos lábios que têm função nas preliminares. Se a mulher for estimulada de maneira correta, elas favorecem a lubrificação da vagina. Essas glândulas são visíveis e a mulher não sabe para que servem. Os homens, então, muito menos.”
Sexo verbal não faz meu estilo
Mulheres que adoram reclamar de caras que não fazem nada estão por toda parte. Mas que tal dizer para o namorado, marido ou ficante que você preferia que ele te chupasse de outra maneira? Muitas vezes por medo de se mostrar exigente, chata ou de afugentar o cara, a mulher não fala nada. Já os homens, vamos admitir, são mais espertos. Sim, eles dizem “vai mais devagar”. Ou pegam a cabeça da mulher e mostram o ritmo de que gostam – simples assim.
A gente não fica de boca fechada por acaso. “Há 2 mil anos, o sexo era visto como uma coisa completamente suja”, lembra a psicanalista Regina Navarro Lins, autora do livro A Cama na Varanda. “Até o meio do século 20, a mulher não tinha direito ao prazer no sexo, ela era só a mãe, que tinha que procriar. Falar que gosta de sexo oral, historicamente, ainda é uma novidade”, explica. Mulher direita, como lembra Regina, não gostava dessas coisas. “Sexo oral só era feito com a mulher da rua, porque a esposa não era para essas coisas. O prazer para a mulher só entrou em pauta nos anos 60, com a revolução sexual.”
“Os caras falam em mesa de bar que são os reis da oralidade. Enquanto isso, minhas amigas reclamam da escassez de sexo oral no mercado” Xico Sá, escritor
E, como o prazer na vida sexual das mulheres é recente, muitos mitos e preconceitos não caíram por terra até hoje. “A mulher ainda acha que não pode gostar tanto de sexo. Ou que, se falar ou reclamar, vai perder o cara.” O medo de questionar, frequente em quase todos os assuntos relacionados a sexo, segundo Regina, é maior no caso do sexo oral. “Algumas mulheres ainda têm medo de desagradar com o cheiro, acham que essa é uma prática suja. E muitos homens não se dedicam a ela porque têm medo de brochar”, conclui.
Para o ator Pedro Neschling, um dos nossos cem entrevistados, essa tal “intimidade sexual” é tão importante que serve para medir a quantas anda um relacionamento. “Quando o sexo oral entre um casal não vai bem é um sintoma de que outras coisas na relação já não estão bem.” Ele acredita que não dá para setorizar o sexo. “Se não está rolando, é porque já teve uma desconexão faz tempo.”
É comum ver a mulherada falando de sexo entre amigas e discutindo coisas como o tamanho do pau. Mas, na hora da cama, se as coisas não rolam como quer, na maioria das vezes a mulher acaba ficando quieta. A ginecologista e terapeuta sexual Junia Dias, membro da Sociedade Brasileira de Estudos da Sexualidade Humana, acredita que esse silêncio tem a ver com a crença, ainda vigente, em príncipes encantados. “Muitas mulheres acreditam que não precisam se conhecer. Porque o homem, no caso ‘o’ príncipe, vai saber exatamente o que precisa fazer para que ela tenha um orgasmo.” Só que é justamente o contrário. Junia conta que fica impressionada com a falta de conhecimento do próprio corpo que vê nas pacientes em seu consultório. “Converso sobre a questão da posse do corpo, e muitas delas não têm ideia de coisas simples, como a data e as sensações da última menstruação. É comum dizerem que, por exemplo, nunca se masturbaram porque não precisam disso, têm seus parceiros etc. Como se prazer fosse algo que você embrulhasse numa caixa de presente e desse para o outro.”
O que podemos concluir é que, por mais moderna e independente que seja, a mulher pouco se responsabiliza pelo próprio prazer. Não conhece seu corpo a fundo, não procura entender as sensações “estranhas” e ainda tem muita dificuldade em colocar tudo isso para fora. Parece óbvio, mas não é.