Coaching e transformação

por Juliana De Mari
Tpm #168

Conheça a trajetória da jornalista Juliana De Mari que se reinventou pra ajudar outras mulheres a fazerem o mesmo

"Eu sou coach." É falar isso e, inevitavelmente, ter que lidar com a cara de interrogação de quem perguntou com o que eu trabalho. Até dois meses atrás responder essa pergunta era facílimo. Bastava dizer que era jornalista. Se quisesse causar mais impacto e fazer certo charme, dizia que era executiva, diretora de redação, com quase duas décadas de experiência em publicações sobre carreira, negócios e gestão de pessoas. Mas, é isso, mudei de vida.

Ainda estou encontrando o meu jeito de explicar o que estou fazendo agora sem recorrer a um cargo ou ao sobrenome de uma empresa. As dúvidas em relação à minha nova atividade são inúmeras. Pra começar, as pessoas não acertam os termos que se referem ao trabalho, tropeçando nas palavras em inglês. Glossário breve: coaching é o processo; coach, o profissional que dá o coaching (eu!); e coachee (lê-se côu-tchíi), a pessoa que contrata o serviço (a minha cliente). 

A ponte

Algumas questões até me divertem: "Ah, você faz aquilo que eu vi na TV, que o preparador vocal do Agnaldo Rayol faz?"; outras me deixam indignada. Tem gente que jura que coaching é autoajuda, naquela linha ingênua de abraçar árvore e escrever desejos em post-its coloridos. Ou que é algo meio místico, tipo terapia de vidas passadas. Ainda tem quem classifique como balcão de conselhos. Ai, que preguiça – e que oportunidade pra mim, que estou me posicionando agora nesse mercado tão cheio de oportunistas.

“O coaching dá uma bela chacoalhada na forma como a gente pensa o mundo”
Juliana de Mari

Os livros dizem que o coaching é um processo de autodesenvolvimento apoiado, que nasceu inspirado no que fazem os técnicos esportivos, e que ajuda a atingir metas em qualquer área da vida. Eu prefiro dizer que o coaching é uma ponte que leva a "você de hoje" até aquele momento futuro, logo ali, de resolver alguma coisa importante pra você. Nesse trajeto, você vai arrumando a bagunça da sua cabeça e abrindo espaço pra que seus passos sejam mais firmes. No fim das contas, a sua energia de realização aumenta e você logo se vê fazendo algo concreto pra realizar aquilo que pretende.

A chave é exatamente o verbo FAZER. E meu papel como coach é orientá-la a respeito de como desenvolver o "músculo", digamos assim, que você precisa fortalecer pra resolver as coisas. Se fosse fácil fazer isso sozinha, a gente não carregaria uma lista de pendências da vida tão cheia de itens.

Esse é um dos exercícios que mais cutucam quem está passando por um processo de coaching, aliás: colocar no papel tudo aquilo que você já observou que gostaria que fosse diferente, mas não fez nada pra mudar. Do quadro torto na parede ao jeito de não falar do que realmente incomoda (para o namorado, para o chefe...). Quando a gente encara o tanto de coisas como essas que deixa em aberto e que acabam por se transformar num container mental cheio de tranqueiras, finalmente começa a resolvê-las, aos poucos, e consequentemente a liberar lugar pra outro tipo de bagagem.

O coaching dá uma bela chacoalhada na forma como a gente pensa a respeito do mundo. Porque é justamente essa lente que define um tanto da nossa vida: como a gente conta a nossa história, planeja as coisas, reage ao que acontece, sente as porradas ou as alegrias do caminho e o que faz (ou não faz) a partir disso tudo. Sei do que estou falando porque precisei encarar todos esses meus filtros, crenças e justificativas quando decidi dar o passo em relação à minha mudança de carreira e resolvi fazer a formação no Instituto de Coaching Integrado (ICI), em São Paulo.

Até chegar à sala de aula, vivi meses de muita inquietação. Eu tinha um emprego ótimo, um salário generoso e a certeza de que não queria mais levar a vida que levava – porque sentia que já tinha feito de um tudo, e muito bem, na carreira e porque queria experimentar outras coisas. Só que ainda não entendia o que poderia fazer com o que tinha vivido profissionalmente até aqui. A parte que mais me pegava nesse processo de transição era justamente descobrir algo pra fazer que me permitisse uma certa sensação de continuidade, não aquela angústia de estar começando do zero.

A verdade é que a gente nunca está começando do zero, porque as experiências que vive vão ser úteis em outro lugar, claro. Basta descobrir como usá-las em novos contextos. Basta?! Vai pensar assim quando você está se debatendo com a ideia de ter que conciliar todas as realizações maravilhosas do passado com o desejo crescente de fazer algo diferente (e igualmente incrível) no futuro sabendo que, no presente, tem dois filhos pra criar, contas pra pagar, uma casa pra manter...

Ligando os pontos
Pode colocar na conta passar por uma fase de cobrança maluca em que você se coloca a pressão de não só descobrir um caminho rapidamente como também ter resultado rápido nele. Perdem-se algumas noites de sono, gastam-se algumas sessões na terapia falando a respeito e, não seria incomum, fica-se irritada com a "lentidão" com que as coisas acontecem ("não acontecem", você vai pensar).

Fundamental, porém, é não se permitir ficar parada nessa situação, dragada por pensamentos sabotadores que questionam seu direito de tentar algo novo por "já ter uma carreira tão bem estabelecida", "por já ter conquistado tanto reconhecimento", "por estar à frente de um projeto tão sedutor".   

Autonomia é um dos meus valores e acho que foi esse senso de "tenho que conseguir fazer as coisas acontecerem do meu jeito" que me deu o empurrão pra sair da zona de lamentação e passar pra zona de criação de um novo caminho profissional – que no meu caso começou por finalmente me inscrever na formação de coach. O curso veio como sugestão de amigos que conheciam minha trajetória e com quem eu compartilhei meu momento de busca, gente que enxergou em mim potencial pra transitar do jornalismo ao coaching conectando pontos que nem eu estava conseguindo ligar – provavelmente porque estava fazendo muita força pra isso. Teve amiga que me disse que, além do currículo que inclui um MBA em RH e uma especialização em gestão, eu tinha também certa aura de mentora e terapeuta – observação que eu traduzi, feliz, como a capacidade de me colocar a serviço dos outros.

Além de me dar a técnica e o certificado que me permite trabalhar em processos voltados a transições em carreiras (e na vida!), a formação deu uma baita organizada em relação ao que penso de mim mesma e das minhas possibilidades. Aos 43 anos, ganhei clareza do que faz sentido pra mim e a certeza de que o tamanho da influência do meu trabalho quem define sou eu.

Hoje estou totalmente conectada à missão de apoiar outras mulheres nessa transição em busca de um lugar onde também possam se reconhecer no que fazem com base em quem são, sem depender tanto da validação do que já fizeram. Não é fácil. Mas pode ser mais simples do que a gente pensa quando está tentando fazer tudo rápido e sozinha.

Juliana De Mari é jornalista e life coach na PROSA Coaching

Créditos

Imagem principal: Arquivo Pessoal

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