A vida loka das fóbicas

por Nina Lemos

Quem tem síndrome do pânico costuma ter dependências. Além do remédio, preciso de telefone. E de hip hop. #vidaloka

 Quem tem síndrome do pânico costuma ser dependente de alguma (s) coisa (s) específica (s) (tirando o Rivotril). Uma amiga é dependente dos óculos escuros. E quando ela esquece os óculos, menina! “Você não sabe o que aconteceu, vim trabalhar e esqueci os óculos, foi horrivel, tive que pegar um emprestado de uma colega." Essa amiga precisa dos óculos na mão para algumas vezes fazer a Costanza Pascolato e usar, mesmo se for de noite.

Eu sou dependente do telefone. Eu preciso do telefone perto de mim, de preferência no bolso. Se eu passar mal, eu ligo para alguem. Esse é sempre o meu pensamento e às vezes eu realmente passo mal e ligo falando: "eu tô com síndrome do pâanico, me ajuda!" E o pobre coitado do outro lado da linha tem que ficar puxando assunto comigo até que eu fale a frase mágica: "tudo bem, ja estou no taxi".

Sinceramente não sei como eu vivia antes do advento do celular. Quer dizer, eu vivia. Mas muito mal.E nessa época eu ainda era reporter de cotidiano da Folha e cobria rebeliões!

O horível aconteceu ontem. Meu telefone caiu no chão. Quebrou. Ficou uma tela azul. Logo agora que eu ando com pânico da aula de alemão. Mas bem. Fazer o quê????

Eu não coloquei para tocar "Levanta e Anda" do Emicida porque a música estava dentro do meu telefone com tela azul. Mas essa música é otima para sindrome do panico. Assim como todas dos Racionais. Você se sente na quebrada tendo que resistir e simplesmente vai. Sério. Eu receito hip hop para sindrome de pânico. Funciona muito!

Enfim. Com a música na cabeça acordei e fui na loja de celular que descobri perto de casa.

O perto

Quando você está com síndrome de pânico a questão do perto varia muito. O outro lado da esquina pode ficar muito longe para uma fóbica. E quando você esta bem, percebe que o perto realmente é perto. Sim, nós fobicas somos assim, às vezes estamos fóbicas (com medo de ter ataque de pânico). Mas muitas vezes não.

Fui de boa. Cheguei na loja e o cara disse que ia demorar duas horas. Sentei num café, tentei construir esse texto na cabeça. Entrei em um brechó e assim venci bravamente minhas duas horas sem telefone. Quando chego, ele só aceita dinheiro vivo. Pois bem, a senha está dentro do telefone. Tento explicar isso para o homem, um alemão tipico, ou seja, sem compaixão com estranhos e mal humorado. Ele me deixa ver a senha e tira o celular da minha mão: “só depois que você pagar!”. Se eu insistisse, ele podia chamar a polícia!

Ai, meu Deus. Que suplício! Agora eu tenho que achar um banco sem meu telefone! Eu posso ter um ataque de pânico. Socorro. E de fato quase tive. O quarteirao para o banco pareceu muito longe e pensei em pedir ajuda para um passante (coisa que nós que temos síndrome do pânico já fizemos na vida). No banco, errei a senha que estava apenas na minha confusa mente. Tive que percorrer de novo o quarteirão, pegar o número, anotar (o homem cada vez me odiando mais) e voltar. Eu estava dentro de um enredo kafkaniano e sem telefone. Caralho!!!!!

Respiro. “Levanta e anda!”, falo para mim. E consigo tirar o dinheiro, voltar (agora eu estava normal e a distância pareceu pequena) e pegar meu telefone!!!!!! E quando eu saio da loja, bem, estava nevando, o que eu achei que era um sinal de deus ou de que Berlin me ama e me deu um presente.

Mas nós, os fóbicos, somos assim. Algumas vezes corremos na rua para chegar em casa logo. E eu amo uma musica do Morrissey que diz: “desculpem, mas nas ruas eu corro tentando escapar." Outro hábito de quem tem síndrome de pânic.: achar que vai passar mal perto de casa, e dar uma corridinha para chegar ao aconchego do lar! Sim. É ridiculo. Sim. É engraçado. E sim, eu rio muito e muito da minha desgraça.

Eu tenho sindrome de panico ha 20 anos. Vocês queriam que eu estivesse chorando por todo eesse tempo?

E ah, o Rivotril, se você questiona o fato de uma pessoa com pânico andar com Rivotril no bolso provavelmente é porque você nunca teve síndrome do pânico. E isso eu não desejo nem para inimigo. Como diria minhas amiga fóbica Pinky Wainer: Remedio é melhor que deus.

 PS. E deu tudo certo, porque no final costuma sempre dar!

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