Mariana e Belén

por Autumn Sonnichsen
Trip #213

Brasileira e argentina celebram amizade pelas ruas de Buenos Aires, livres e felizes

Você realmente não precisa que eu descreva essas duas. Não precisa que eu conte do corpo da Mariana, da curva delicada de sua cintura, da onda crescente dos peitos ou dos olhos de ressaca. Nem dos dentes, alinhados como soldados, quando ela morde os lábios e se diz nervosa, mas pronta. O lance com a Mari é prestar atenção nos olhos, no jeito que ela muda o olhar. A cintura, as mãos finas e o cabelo de uma dançarina andaluza são todos uma desculpa. Na real, querido leitor, ela está te olhando. Não para mim, nem para a câmera. Está olhando para você.

Você também não precisa que eu conte da Belén. Das linhas longas, quase líquidas, das coxas dela. Ela conta que seu corpo era ainda mais perfeito antes, a barriga era mais chapada (vai, acredita). Não preciso falar da curva perfeita do bumbum naqueles shortinhos minúsculos com os quais ela passeia de patins pela cidade. Aqui tem páginas e páginas de fotos para isso tudo. Melhor narrar a história das duas, a razão de estarem aqui e de como se conheceram numa tarde de outono em Buenos Aires, há três anos e meio.

Roupas no chão
São sete da manhã. Mariana, 25 anos, abre a porta do apartamento dela no bairro de San Telmo, toda de preto, o cabelo como uma cachoeira bagunçada, olhos pesados e voz de sono. Há quatro anos morando na capital argentina, a paulistana está um pouco cansada, chegara de viagem um dia antes. O sorriso fácil escorre pelo rosto, Mari está nervosa. Mas não tanto assim. Pouco depois tirava a blusa no bar ao lado de seu apartamento, colocando os peitos contra o vidro da fachada enquanto sorria para os pedestres.

Uma hora depois, Maria Belén chega. O tornado de 29 anos nascido em Entre Ríos joga os patins ao lado da porta de entrada e sua voz, ao mesmo tempo alta e rouca, passa a dominar o ambiente. Tira as roupas jogando as peças pela sala com uma indiferença que quase assusta, é o tipo de menina que parece nunca ficar nervosa.

Show para os vizinhos
Mari e Belén comem bifes à milanesa com batata e ovo frito no bar (não é incrível ver mulheres lindas comendo comida de verdade antes do meio-dia?) antes de nos levarem até o apartamento das fotos, num predinho antigo onde se pode alugar quartos mobiliados de uma senhora de cabelo grisalho, que faz café pra nós enquanto nos deixa reorganizar móveis e quadros para as fotos. Está chovendo. Belén levanta o bumbum entre as plantas na varanda com a pele arrepiada de frio e Mari tira fotos dela com sua pequena Pentax – o mesmo modelo que eu tinha quando comecei a fotografar.

Os vizinhos do outro lado da rua estão encantados.

Elas deitam nas poltronas e contam que estavam ali na mesma sala quando se conheceram. Mari estava ao lado do seu então namorado quando Belén entrou e começou a olhar para ela. Bronzeados, eram um casal lindo, exótico. Os dois (Mari inclusive) falando um espanhol com sotaque bogotano que deixou Belén fascinada. “Sou muito visual, e os dois eram fascinantes. Dentes tão brancos, meu Deus! Nunca tinha visto sorrisos tão lindos.”

Não demorou muito, estavam atravessando longas noites refogando legumes e frango na wok da Belén e dormindo uma ao lado da outra depois da conversa entrar na madrugada. “Não roncamos, somos parceiras de dormir perfeitas!”, brinca Mari. “Nunca tive tanta intimidade com alguém como tenho com ela,” continua a brasileira. “Deve ter gente que acha que somos um casal, indo trabalhar na manhã seguinte uma com a camiseta da outra. Mas foda-se.”

Maria-chiquinha e patins
Conheci Mari primeiro. Em 2010, ela me mandou uma mensagem pelo Facebook num portunhol fofo dizendo que queria ser fotografada por mim, que era um sonho secreto. Dava para perceber que ela era linda pelas fotos do seu perfil. Um ano e meio depois, ela estava de calcinha numa praça de Perdizes passeando com cinco cachorros de um desconhecido, se matando de rir. Quando surgiu esta edição sobre amizade na Trip, perguntamos para ela se tinha uma amiga bonita para indicar. Sem pensar duas vezes, chamou Belén. “Sabia que ela faria o ensaio bem e que me deixaria à vontade.” A colega argentina está acostumada a andar pelada, é modelo habitual do escultor Martin de Girolamo, que faz obras realistas sensuais em tamanho natural – uma delas com Belén de maria-chiquinha, patins e um olhar bravo.

É charmoso ver Mari tirar fotos da amiga. Diretora de fotografia de cinema, não é o tipo de pessoa que tira milhares de frames por minuto. Usa sempre filme, gosta do processo lento e técnico. Foi ela, aliás, quem filmou o making of do próprio ensaio, com uma Lomokino 35 mm. Às vezes, ela coloca a câmera na minha mão para filmar as duas juntas, não sem antes dar várias instruções.

É gostoso imaginar a Belén trabalhando também. Em um restaurante no centro de Buenos Aires está finalizando seu primeiro mural, uma obra imensa de 5 metros de largura sobre a história da Argentina. Produz sempre de madrugada, e ainda dá aulas de arte, de graça, para crianças numa biblioteca pública. E, ultimamente, aprende português com Mari para entrar na faculdade no Brasil.

As duas me parecem felizes.

 
Créditos

Coordenação Geral: Adriana Verani Produção: Flavia Fraccaroli Styling: Flaminio Vicentini Make: Jésus Lopes Tratamento de imagens: RedFishBlack Créditos de Moda: Rock Lilly / Costume / TVZ / Loungerie / Puket / Poko Pano / Colcci / Gisele Bündchen para Hope / KNT / Ropahrara / Darling. Agradecimentos: Hotel Howard Johnson

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