As tirinhas da ’Mãe Solo’, criada pela paulista Thaiz Leão Gouveia, mostram a rotina de uma mãe que cria o filho sozinha e fazem críticas à romantização da maternidade
A vida da ilustradora paulista Thaiz Leão Gouveia ficou de pernas para o ar no penúltimo semestre da faculdade quando ela soube que estava grávida de Vicente, hoje com 2 anos. Diante do desafio de criar uma criança – e ainda por cima sozinha –, ela começou a desenhar seus perrengues, desafios e alegrias da maternidade e a postar em sua página no Facebook. O sucesso das tirinhas aconteceu no melhor estilo 'curtir e compartilhar': amigos curtiram as ilustrações que foram surgindo e logo outros pais e mães chegaram até a sua timeline, entre elogios e identificações com a personagem.
O jeito foi criar, em 2014, uma fanpage para a personagem Mãe Solo, que, obviamente, se confunde com a vida da própria autora. De lá para cá há dezenas de tirinhas curtidas e comentadas por mais de 33 mil pessoas, sobretudo, mulheres e mães que se emocionam e dão risadas, e que encontraram ali uma rede de apoio para as dificuldades da maternidade solo. “Quanto mais sobem as curtidas mais aumenta em mim a cobrança por conteúdo e qualidade. Cada like é um acréscimo de responsabilidade e, enquanto a Mãe Solo vai ganhando chão, vou desconstruindo e criticando o meu chão. Assim, vou buscando falar e discutir as coisas que acredito que fazem sentido. Peço todo dia ao grande útero da vida por um pouquinho de iluminação para saber transformar esse mundo”, explica Thaiz.
Entre algumas das bandeiras levantadas pela ilustradora-feminista nas tirinhas estão temas como criação com apego, parto humanizado, amamentação em livre demanda, os padrões de comportamentos definidos por gêneros, o papel dos pais na criação dos filhos e a “desconstrução” da romantização da maternidade. Thaiz diz que as tirinhas que geram muita polêmica são aquelas que objetivam quebrar esse encanto e “desromantizar” a imagem da mãe perfeita. A ilustração que abre essa reportagem feita exclusivamente para a Tpm.
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Sobre essa desromantização, Thaiz opina que a maioria das pessoas ainda não quer tirar a mãe de seu pedestal de mártir. “Pode até parecer bonito, mas esse modelo de mártir, multiplicado pelas bilhões de mulheres deste planeta, é só mais um modelinho pronto de eterna frustração a se seguir e nos podar. “A Mãe Solo tenta ilustrar além do quadro bonitinho da maternidade e tenta chegar na mulher que existe de verdade”, assegura.
Muitas das tirinhas costumam nascer, inclusive, do machismo a que as mulheres estão submetidas diariamente como até numa fila da lanchonete. “Teve uma situação célebre que me ocorreu ilustrar, mas que me deu um nó tão grande que ainda não consegui desenhar. Eu estava na fila da lanchonete da faculdade para pegar algo para comer. Os dois homens que estavam atendendo estavam se provocando, por sei lá que machice, até que um puxou um pouco mais a provocação e o outro exclamou para o meu espanto: ‘Não fala assim que eu não sou filho de mãe solteira’. Difícil. A maternidade é uma fonte inesgotável de treta para ilustrar”, desabafa.
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Os próximos passos da mãe solo Thaiz é articular, para 2016, uma forma de rentabilizar as tirinhas sem se render a algum patrocínio. Dicas para ser uma ótima mãe solo? “A maternidade é como a vida: desdobra-se de maneira única em cada mulher que a vive. Eu vivo meu modelo, outra mulher vive o dela e tudo bem. Vejo em muito dos argumentos contrários às bandeiras que defendo como uma manifestação do instinto de proteger o território que ainda pertence a muita gente. Mas eu não quero tomar o território conceitual de ninguém. Quero, antes, é defender o direito meu e de outras mulheres de viverem em paz nos seus”, completa a designer. Como ela mesmo diz em uma de suas tirinhas, a vida é curta demais para se perder tempo tentando ser uma mãe que não existe.
Vai lá: facebook.com/mamaesolo