Quem insiste em dizer que cariocas se vestem mal é porque circula pelos lugares errados. Conheça nove jovens estilistas determinados a botar o Rio no mapa criativo da moda
Wymann
O maiô (ou playsuit) com infindáveis possibilidades de amarração da Wymann já deu a volta ao mundo em revistas femininas e acendeu um holofote sobre Raquel Alvarez, 31 anos. Essa suíça radicada no Brasil há sete anos conseguiu criar uma peça que agradou as ruas e os fashionistas e assim, há dois anos, começou a Wymann, marca de roupas brasileira, que investe em peças autênticas. Raquel trabalhou numa marca de alta-costura carioca e fez muita peça conceitual para desfile. Mas o dia em que escutou “Se algo for feio e vender, nós vamos fazer”, resolveu alçar um voo solo. “Sou o contrário disso”, diz. Ela credita seu sucesso em parte à generosidade dos brasileiros com os estrangeiros. “Aqui, muita coisa vai pra frente por causa da força dos amigos. Na Suíça é tudo mais formal.” Deve ser por isso que Raquel se sente carioquíssima. E olha que como modelo ela já morou em muito país pelo mundo. Hoje seus planos são abrir uma loja própria e ganhar o globo com a marca, mas tudo com muita responsabilidade, como manda o figurino suíço.
Na foto acima, Raquel Alvarez veste macacão R$ 520 e top R$ 180 Wymann na Os/On, óculos Fendi na Lunetterie R$ 1.298, colar Muggia na Frey Kalioubi R$ 120
Mufa
O carioca Rickey Cavalcanti, 28 anos, morava em Los Angeles com o pai, professor de jiu-jítsu. Dava aula e trabalhava como mecânico numa fábrica da Mercedes-Benz. Como hobby criou a Mufa, que começou com paths para quimono. Logo, passou a fazer camisetas e bonés. Em 2013 veio de férias para o Rio, ver a mãe. Só que, na hora de entrar no avião rumo aos EUA, Rickey fez meia-volta. Ele percebeu uma mudança no hábito do brasileiro e resolveu arriscar tocar a marca no Brasil. “Antes, as pessoas tinham preconceito com produtos nacionais. Hoje, há uma valorização do que é local.” Para viabilizar a primeira coleção, comprou restos de tecido. “Fizemos camisetas cheias de recortes e sem grade de tamanhos, mas vendemos muito bem”, conta. Em pouco tempo ele estava estabelecido no mercado de lifestyle carioca com camisetas, bonés, moletons e macaquinhos femininos. Há três anos por aqui, a Mufa paga as contas dele e do sócio, Alan Bogoricin, e apoia surfistas e skatistas brasileiros que estão fora do mainstream.
Haight
A estilista Marcella Franklin, 28 anos, nunca tinha pensado em ter sua própria marca. “Trabalhei na Auslander e vi o trabalho que dá”, conta. Mas um dia, em 2014, a vontade de fazer as peças que lhe davam na telha bateu forte e ela iniciou uma pequena produção informal de maiôs. “A ideia era vender para as amigas, me realizar um pouco”, diz. Antes de sair do papel a coleção caiu nas graças da Void – loja de conveniência que mistura produtos descolados com cerveja e já tem cinco endereços. Nessa hora um amigo de infância disse: “É agora, Marcella”, e entrou como investidor para que a Haight nascesse para ganhar o Rio de Janeiro. Em dois anos a marca está presente em nove pontos de venda na capital carioca, três em São Paulo, dois em Porto Alegre e um no Chile. “Foi bom ver que as pessoas também gostavam de peças com um estilo atemporal”, diz. A última coleção da Haight se afasta um pouco da praia quando investe no tricô, mas Marcella segue chamando as peças de maiô. O trabalho é puxado, mas a estilista garante que a alegria de trabalhar para si mesma compensa.
Handred
Foi aos 17 anos que André Namitala se viu no comando de uma fábrica de roupas pela primeira vez. Trabalhava para a marca carioca Rebecca Barreto. Para passar credibilidade, o estilista se vestia de um jeito mais formal. Acabou gostando e, hoje, é ele mesmo o melhor modelo das peças de alfaiataria tropical de sua própria marca, a Handred – criada há quatro anos. “Só dá pra fazer exatamente o que a gente quer quando temos a nossa própria marca”, diz. Hoje, a Handred vende no Japão, na Ilha Martinica, França e Espanha. “Faço peças só com tecidos naturais e boas para temperaturas elevadas.” As peças são todas unissex, têm presença marcante e, apesar de serem chamadas de “roupa de balneário” pelo criador, circulam muito bem em diversas situações. Não é por acaso que os dois pontos de venda em São Paulo vendem a mesma coisa que os dez pontos no Rio de Janeiro. “São Paulo tem uma sede de life-style descontraído”, justifica André, que hoje tem 24 anos e é visto como menino prodígio na cena carioca.
Verkko
Uma das coisas que Thaís Delgado, 30 anos, gosta é analisar a roupa pós-praia. “É interessante como o carioca pensa essa roupa que precisa ir bem na areia, no restaurante, no cinema ou numa festa. Porque essa é a nossa vida”, diz. É por isso que as peças da Verkko, sua marca, que fará três anos, vai do maiô ao macacão com pegada de alfaiataria, passando, claro, pelo famoso top de tricô, que a cada coleção ganha uma pegada diferente. Thaís sempre trabalhou com moda. Fez styling para revistas, figurino no Projac e foi estilista da Maria Bonita Extra, mas seu desejo, desde o curso de moda no Senai, era mesmo ter a própria marca. Ela queria colocar o que deseja e como deseja em peças que flertam com o geométrico e têm um ar clean. “Gosto de ter sempre um toque meio masculino nas peças, mas acho o que eu faço minimalista, sensual”, diz. Hoje, Thaís está em franca negociação para ter mais pontos de venda em São Paulo. E é no ateliê/escritório que divide com a amiga Raquel Alvarez, da Wymann, que faz grande parte das peças de suas coleções.
Odde
A Odde nasceu do desejo dos amigos Patrick Dohmann e Kaue Maciel, ambos com 30 anos, de ter um negócio com a cara deles. Numa pesquisa de mercado concluíram que o setor marcas próprias de tênis não estava saturado e havia espaço para quem traduzisse o lifestyle carioca. Juntaram então a experiência e os contatos de Patrick, que trabalhou na Andarella, marca de sapatos da família, com a bagagem de Kaue, que vinha do marketing da Osklen, e criaram uma marca genuinamente brasileira – mas com alma internacional. Os sapatos e as mochilas de cores sóbrias já são vendidos em Portugal e no Peru. “Desde o começo pensamos em chegar a uma escala mundial”, diz Patrick. A estratégia inicial era focar no e-commerce, mas a oportunidade de loja física apareceu e se mostrou eficaz. Hoje, a Odde tem loja em dois shoppings do Rio e planeja abrir um outro ponto na rua. E é possível brigar com os grandes? “Os brasileiros são órfãos de marcas que abracem as pessoas”, diz Patrick. “As mídias sociais facilitaram a comunicação de marcas pequenas. Estamos perto dos clientes”, completa Kaue.
Hull
A marca de Rodrigo Hull, 27 anos, tem quase quatro anos, mas ele faz questão de dizer que isso é entre idas e vindas. Rodrigo gosta de mudar de assunto, de variar, e vez ou outra dá um tempo nas coleções. Como trabalha como estilista na Fábula, divisão infantil da Farm, toca a Hull como pediu a Deus: sem a pressa de quem tem que ver o dinheiro entrar. “Ter que vender é péssimo. Não quero fazer o que vende, quero fazer o que eu gosto”, ele resume. E é assim, fazendo só o que curte, que Rodrigo toca o ateliê e as vendas em casa. “A próxima coleção é toda de macacão. Amo macacão”, diz. O sonho do estilista não é conquistar a Europa, a Ásia ou 24 territórios à sua escolha, e sim chegar a um lugar conceitual, se aproximar da arte, dos desfiles. Desde o início da Hull, Rodrigo cria roupas para seres humanos. “Nunca pensei em fazer algo para homens ou mulheres. Mas sinto que algumas coisas vendem mais para um público ou outro. Varia”, diz despretensioso e frisando que já pensava assim antes da onda de moda sem gênero que se espalha por aí.
Alsk
Maria Alice Salgado, 31 anos, se apaixonou por moda aos 17, nos sets de filmagem. Junto com a mãe e a tia, ambas figurinistas, começou a trabalhar com cinema. A faculdade de design de moda veio depois e fez dela uma pessoa com jornada dupla. Ela passou por algumas marcas grandes e foi ali que começou a se incomodar com o superlativo fashion. “Tudo era muito grande, vinha de muito longe e em quantidades enormes. Eu precisava de algo em menor escala, trabalhar de forma local”, diz. Como sempre esteve inserida no mundo dos esportes, há três anos Maria Alice criou a Alsk, marca de roupas com pegada esportiva e estilo. Como levar a marca depende do ganha-pão com o trabalho de figurinista, a estilista lança uma pequena coleção por ano e sem a pressão de ter que vender. “A Alsk se mantém, mas não consigo viver dela. Este ano já fiz dois longas e entre um e outro vou tocando a próxima coleção”, conta. Parece lento? Essa é a intenção: “Espero que tenhamos cada vez mais marcas locais e menos marcas gigantes que produzem fora”, diz.
Créditos
Imagem principal: Pedro Loreto
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