por Mara Gabrilli
Tpm #98

Embora totalmente paralisados, emanava deles vivacidade e nada de ansiedade

Muitas vezes, sentada na minha cadeira, fico observando as pessoas. É tão visível a ansiedade de algumas que parece até que são de uma outra cor. Lembro-me quando eu tinha uns 22 anos, e muita ansiedade. Bem cedo, antes de começar qualquer atividade do dia, fazia acupuntura para parar de fumar e combater essa sensação de aflição sem causa evidente. Um dia, saí da acupuntura aparentemente nada serena... Entrei no carro e fui aliviando a velocidade interna em ações desordenadas: um pé inquieto no acelerador e o outro na embreagem enquanto uma mão liga o carro, a outra abre o vidro; uma pega o cigarro da bolsa, a outra aperta o isqueiro; uma liga o rádio e a outra põe o cigarro na boca; uma tira o isqueiro quente vermelho alaranjado e a outra mexe no botão sintonizador do rádio...

Em meio à fumaça – o cheiro de queimado da borracha derretida – acelerando, percebi que a acupuntura não estava funcionando. O pensamento de mudar a música foi tão veloz que desgovernou o movimento da mão.

Nessa época, morava com a minha avó e quase a derrubava pelo apartamento quando, decidida, eu mudava de ambiente. Para ela aquilo era a alta velocidade dentro de casa.

Conversando com amigas sobre o tema, comentei que, mesmo não me mexendo de forma óbvia, continuo fazendo várias coisas ao mesmo tempo, porém, hoje não tenho tanta ansiedade. A Deia perguntou:



– E aí, meu? Como é que você acabou com aquela ansiedade?

– Quebrando o pescoço.

– [Risos] Você recomenda?

Ficar parado pode impulsionar a assistir (nos dois sentidos) mais e com outra abrangência.

A Telma comentou:

– Não durmo direito no sábado se não souber onde almoçarei no domingo!

Será que nesse caso pode nem ser ansiedade, por ser causa sabida?

Fui convidada para falar no evento da Associação Brasileira de Amiotrofia Espinhal, que está indo para São Paulo. A Abrame é bem forte em Fortaleza. Essa doença é mais uma daquelas que paralisam a pessoa dos pés à cabeça, mantendo o intelecto totalmente íntegro. A cada 40 pessoas, uma tem o gene e, a cada 6 mil, uma nasce com a doença. Via de regra, as crianças não chegam à adolescência e, quando são acometidas pela versão mais forte da amiotrofia, morrem antes de 2 anos. Cada vez mais exceções têm aparecido.

Rosa vermelha

No evento, uma das mães tem uma filha de 20 anos. Nessa idade, é a única no mundo! Arthur e Vinícius, de 4 e 6 anos, têm movimento só de olhos e usam respirador artificial. Presentearam-me com uma rosa vermelha, cada um ajudado pela Juliana, que será a coordenadora em São Paulo.

Embora totalmente paralisados, emanava deles vivacidade. Não consegui sentir vindo dali nada de ansiedade, mas muita emoção. Eu tinha lágrimas pelo pescoço e sentia ter sido atingida por raios de garra e decisão.

Quais serão as relações entre movimento e ansiedade? Entre dor e anseio?

O que mais me impressionou, de tudo, foram as várias mães dessas crianças que transformam qualquer agonia em energia, para o bem-estar dos seus filhos.

Ansiedade? E daí...


Mara Gabrilli, 40 anos, é publicitária, psicóloga e vereadora por São Paulo. Fundou a ONG Projeto Próximo Passo (PPP), é tetraplégica e foi Trip Girl na Trip #82. Seu e-mail: maragabrilli@camara.sp.gov.br

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