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Descaminho das Índias

por Nina Lemos
Tpm #85

Sáris que deixam o umbigo de fora, personagens que falam como profetas e por aí vai

Sáris que deixam o umbigo de fora, personagens que falam como profetas e por aí vai. Chamamos dois especialistas em Índia para analisar a trama de Glória Perez. E aproveitamos para sugerir temas para próximas novelas da autora!

Depois do mundo árabe retratado na no­vela O Clone, agora é hora de o país in­tei­ro só falar da Índia, porque, claro, a no­vela da Glória Perez tem um núcleo lá. Por aqui, começamos a pensar, será que eles es­tão mostrando o país (adorado por tan­ta gente) do jeito certo? E tratamos de con­versar com especialistas no assunto.

A jornalista Mariana Scalzo, duas via­gens de meditação para a Índia e nove­­lei­ra confessa, de cara soltou: “Os sáris da no­­vela são sáris da Gang”. Explica-se. Na te­le­novela, as meninas aparecem com a saia indiana de cintura baixa, coisa, se­gundo ela, completamente fora da reali­da­de in­diana. “Olha, sári com umbigo de fo­ra, só no Projac.”

Apesar de achar legal que a novela aborde a Índia, “amo tanto aquele lugar que quero mais é que todo mundo co­nhe­ça um pouco da cultura”, Mariana tem ou­tras críticas. “Os indianos são pessoas nor­mais, na novela eles falam como se fos­sem profetas! O personagem do Lima Duar­te [Shankar, um mestre] chega a er­guer os bra­ços enquanto fala. Parece que lá as pes­soas não conversam, ficam só fa­lando em tom de profecia.”

Nosso colega Arthur Veríssimo, o maior especialista em Índia do mundo – ele foi para o país mais de 15 vezes –, avisa que só viu três capítulos da novela. Mesmo assim, acha que a equipe está bem assessorada e, por isso, mos­tran­do uma imagem da Índia convincente. “A parte da Índia está legal pra caramba. O diretor de fotografia é demais.” A única coi­sa esquisita, segundo Arthur, é ver a personagem da Juliana Paes “andando toda contente pelas ruas”. “Ali é todo mundo vigiando a vida de todo mundo, não é moleza não.”

E nosso sacerdote vai adiante: “O Caio Blat, por exemplo, não tem noção alguma de movimentos de dança indiana, ele é duro”, observa.

E mais nenhuma reclamação, Arthur? “Só o que falta na novela é mostrar o lado mais bizarro do país. Mas só po­pu­larizar um país como esse, que tem tanto a ver com o Brasil, já é bacana”, diz.

Moda indiana
Além de mostrar algumas maluquices sobre a Índia, a novela criou uma febre de penduricalhos indianos. A moça indiana é a nova Jade (O Clone, lembra?). E, segundo apuramos, já existe taxista carioca falando “namastê” em vez de “até logo”.

“A 25 de Março [rua de comércio popular de São Paulo] já está cheia de acessórios indianos”, diz Mariana Scalzo. E, nas ban­cas, vemos dicas e mais dicas de como pintar o olho com ca­jal, como fazer um jantar indiano etc. etc. etc.

Leia mais sobre a Índia, nos próximos meses, em alguma não entrevista do mês. Sim, porque alguma hora teremos nos cansado, e muito, desse assunto, como provavelmente todo o res­to do país. E, até lá, namastê!

E nos próximos capítulos...
Depois de criar uma febre árabe no país e uma country (lem­bra da novela América?) e agora trazer a Índia para a 25 de Mar­ço, que tipo de país ou etnia será que a autora Glória Perez vai explorar? Aproveitamos este espaço para enviar sugestões.

 

 

Namíbia. Esse país africano anda muito em voga desde que Angelina Jolie e Brad Pitt adotaram crianças no país afri­ca­no. A novela poderia ter um núcleo rico no Brasil, que teria, cla­ro, uma personagem com câncer de útero (doenças são ou­tros temas que a autora adora) que decidiria adotar uma crian­ça na Namíbia, onde alguma personagem brasileira faria um trabalho social.

Paraguai. Uma personagem brasileira compraria muamba lá. Por isso, teríamos um núcleo de personagens comerciantes paraguaios. Seria ótimo, pois os personagens falariam em por­tunhol selvagem (a “língua” adotada por alguns escritores bra­sileiros e paraguaios). Hablariamos muy bien y el dialeto se es­palharia por todo el Brasil.

Faixa de Gaza. Essa novela seria óti­ma, pois possibilitaria que a autora crias­se, além do núcleo brasileiro, o israe­len­se e o paquistanês. Claro, um casal que se ama desesperadamente ficaria sepa­ra­do. Um deles na Faixa de Gaza e outro em Is­rael. O problema é que seria realmente pe­rigoso para os atores gra­varem na re­gião!

Berlim. Como a cidade está na moda entre os alternativos em geral, a no­vela representaria o cotidiano de um gru­po de brasileiros artistas plásticos viven­do em um squat (prédio ocupado). Claro, a no­ve­la mostraria também as diferenças en­tre as antigas Berlim Oriental e a Oci­den­tal. E te­ria a história de um casal que viveu anos separado por causa do Muro de Ber­lim e hoje passa a velhice em paz, reunido.

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