por Luciana Obniski
Tpm #116

Alan Pauls e a influência do cabelo nos anos 70 para falar de política argentina

O escritor argentino Alan Pauls pesquisou a influência do cabelo nos anos 70 para escrever um romance sobre a política argentina. E a mistura deu certo

Alan Pauls, 52 anos, esteve no Brasil para lançar seu segundo livro, História do cabelo. Nele, o escritor argentino fala de um homem de Buenos Aires obcecado por cortes de cabelo – e pelo corte perfeito. A história, aparentemente frívola, serve de pano de fundo para Pauls explorar a crise política argentina dos anos 70. Aproveitando o tema central do livro, num bate-papo exclusivo o escritor fala mais sobre vaidade masculina, a relação entre cabelo e poder e os atuais ídolos capilares.

Tpm. De onde vem a obsessão do protagonista pelo corte de cabelo perfeito?
Alan Pauls. O cabelo tem uma coisa muito interessante: é a única parte do corpo que se aceita cortar em público. A cerimônia de cortar o cabelo sempre me chamou muito a atenção, porque os homens não permitem que a ida ao salão seja uma hora de socializar, e para as mulheres é exatamente isso. É difícil um homem estabelecer uma relação com o seu cabeleireiro. Muitas vezes não sabem nem pedir ou descrever o que querem que seja feito com o seu cabelo.

A exaltação da relação do homem com o cabelo, no seu livro, é uma ode para que os homens se cuidem mais?
Não. Não quero propor uma reforma ao meu gênero. Mas me parece que o cabelo, para os homens, é uma espécie de tabu. O assunto me interessava mais por ser um tópico superficial, a princípio. Gosto de transformar coisas frívolas em assuntos sérios. Não há nenhum assunto que seja frívolo. As coisas são o que são. A história política de um país pode estar presente em algo muito importante, como o parlamento, ou em um elemento aparentemente frívolo, como os cortes de cabelo dos anos 70.

Mas nos anos 70 os cabelos tinham muito a ver com política.
Sem dúvida. Os Black Panthers tinham cabelo afro como parte de seu uniforme, com jaquetas de couro pretas e discurso antiariano.

E hoje? Os grupos que ainda se distinguem pelo cabelo têm a mesma força?
Me parece que os grupos de hoje, como punks e skinheads, têm cabelos para se sentirem parte de uma tribo, e não pelas atitudes políticas. Esses grupos todos coexistem hoje em dia, e nos anos 70 não era assim. Ou você era um ativista político, ou não era. Não havia meio-termo. Ou se era revolucionário, ou reacionário.

Ao contrário dos anos 70, quando os ídolos dos cabelos eram roqueiros e ativistas políticos, hoje em dia os jogadores de futebol ditam moda nessa área.
Pois é. A diferença é que os roqueiros cortavam seus cabelos de maneira diferente porque queriam mostrar que tinham personalidade e estilo de vida diferentes. Hoje, os jogadores de futebol são absolutamente comuns e ordinários e somente cortam seus cabelos de uma forma diferente, sem razão aparente. E as pessoas que copiam esses penteados também não o fazem por outra razão que não somente por ter um cabelo diferente. Não há nada por trás disso.

Vai lá: História do Cabelo, de Alan Pauls, ed. Cosac Naify, R$ 45

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