Adriana Falcão, roteirista e mãe orgulhosa, escreve para a filha
Clarice,
Em algumas entrevistas, você conta que, quando pequena, eu te ninava com canções de Chico Buarque e Luiz Tatit, dois gênios da palavra.
Você menciona essas influências quando tenta explicar o inexplicável: esse seu talento para contar canções/cantar histórias, e fazer a gente chegar naquele lugar do “eita, Clarice, obrigada aí por essa”.
É verdade, eu cantava, na cadeira de balanço, e você ouvia, muito atenta, os olhinhos abertos esverdeando o escuro do quarto. Enquanto fosse possível, você lutava contra o sono, pra não perder nenhuma nota, nem um som, nenhuma palavra. Mas eu ganhava sempre. Você dormia.
Era então o momento em que eu cantava pra mim mesma, antes de te colocar no berço. E era sempre a mesma música. Uma das que minha mãe cantava pra me fazer dormir, uma das muitas que me trouxeram até aqui (obrigada, anjos que cantam música pra gente!).
“When I was just a little girl,
I asked my mother what will I be?
Will I be pretty?
Will I be rich?
Here’s what she said to me:
Que será, será,
What ever will be, will be,
The future is not ours, to see
Que será, será.”
Nessa hora, Clarice, eu sempre chorava.
O que será que você seria?
Eu tinha medo, eu tinha sonho.
Hoje, você é essa. (Obrigada, anjos que escolhem os filhos da gente!) Linda, comilona, inteligente, generosa, engraçada, cabeça na lua, headphone nos ouvidos, quarto bagunçado, odeia perder em jogo, não se enquadra, meio estranha, meio doida, esquisita, atrevida, vive inventando coisa e, não bastasse, sabe fazer brownie de chocolate.
Mas ainda tem muito o que será pela frente.
Por isso, todo dia eu rezo: “Minha Nossa Senhora das Mães Agoniadas, proteja essa menina, enquanto ela espalha o seu encanto”. Pra você continuar com essa mania de se enveredar por caminhos que nos tragam coragem, justiça, liberdade, graça, amor e cantigas.
Talvez, um dia, você cante “O que será, será” quando ninar a sua filha.
Que você tenha a sorte que eu tive, meu anjo.