A segunda-feira, o sono e nossos demônios

por Mariana Perroni

Que ninguém venha com o papo de que só reclama da 2a feira aquele que não ”ama o que faz”

 

Amanhã é segunda-feira. Se você tem um emprego convencional, sabe que é o dia oficial do descontentamento e da desmotivação. Mas por que é terrível assim? Porque marca o início de cinco longos dias (se você não trabalha nos fins de semana também) de piloto automático e obrigações nem sempre agradáveis e glamourosas? Que ninguém venha com o papinho de que só pensa isso quem “não ama o que faz”. Amor não acorda às 5h00 da manhã, nem enfrenta trânsito para bater cartão todo dia às 7h00.

O pânico do domingo à noite, agravado pela musiquinha da vinheta do Fantástico, e o mau-humor de colegas na segunda-feira sempre me intrigaram (talvez isso até tenha contribuído para que eu escolhesse uma carreira sem “horário comercial”). Até me deparar com um estudo apresentado no SLEEP desse ano, que me fez cogitar que isso pode acontecer por um motivo bastante simples: considerando que pessoas normais saem no sábado à noite, acordam tarde no domingo e, consequentemente, não conseguem dormir cedo para enfrentar a semana de trabalho, a segunda-feira é o dia em que mais se tem sono.

Mau humor, irritabilidade e numerosas reclamações são efeitos colaterais já bem estudados de sonolência, mas o novo estudo parece ser o pioneiro a explorar a forma como o pensamento do ser humano funciona quando se está com sono. E não é bonito: o sono parece ativar nosso pior lado. As pessoas ficam mais negativas em relação aos acontecimentos cotidianos, com mais tendência se envolver em conflitos desnecessários, a culpar os outros (especialmente subordinados) e, até mesmo, a buscar vingança frente a pequenos desentendimentos.

David Mastin, o pesquisador responsável pelo estudo, defende o quanto a privação do sono é debilitante e faz com que as pessoas tenham  julgamentos pobres. E nos convida a ponderar sobre o impacto que isso pode ter em nossos casamentos e na maneira como tratamos os outros no local de trabalho.

Segundo ele, as culturas latinas, ao contrário da americana, parecem já compreendido que dormir o suficiente é vital para uma vida de qualidade.”Eles têm períodos de sesta! Em nossa cultura, isso é tido como infantilidade”, diz ele. Obviamente, o Sr. Mastin nunca conversou com alguém de São Paulo.

A privação de sono pode afetar a coordenação motora de forma tão perigosa quanto dirigir sob a influência de álcool. Se não toleramos que alguém trabalhe bêbado, por que aceitamos que trabalhem com sono? Eu continuo a favor de maior reflexão sobre o horário do expediente e os regimes de trabalho, tornando-o mais fisiológicos e, consequentemente, produtivos.

(meu twitter: @mperroni)

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