A Igreja pede desculpas?
Padre Beto, excomungado pelo Vaticano, fala sobre pedido de perdão aos gays de Papa Francisco: 'são apenas frases de efeito'
Não fez um mês desde que o Papa Francisco declarou que a Igreja Católica, assim como todos os cristãos, deveriam pedir perdão à comunidade LGBT. É a primeira vez que a instituição se posiciona sobre uma histórica caça a gays, lésbicas e bissexuais. "O Papa tem o dom de dar respostas com efeito, mas que não correspondem a mudanças concretas", diz Padre Beto, que tem 50 anos e foi excomungado pelo Vaticano em 2013. O motivo? Ele, enquanto atuante na religião, defendeu a relação homoafetiva.
Beto é protagonista de uma das mais recentes perseguições religiosas por homofobia. Depois de se mostrar favorável a questões como bissexualidade, homossexualidade e também divórcio, recebeu um comunicado pela Diocese de Bauru de que seria afastado. Foi convidado a entregar uma carta de afastamento em mãos, quando se viu no Tribunal Supremo da Sé Apostólica sentado em cadeiras destinadas a réus, sem saber que seria intimado a um processo e sem o direito de um advogado.
"Se eu peço perdão, isso me exige uma transformação. Não basta dizer 'desculpa'. Para demonstrar isso na prática, a Igreja precisa mudar sua moral sexual. A sexualidade por si já é vista como negativa", acredita. Afastado da religião católica, Beto não deixou que isso o afastasse de seu caminho espiritual. Ele, formado em teologia na Alemanha e também professor universitário de filosofia, acredita piamente que religião é transformação e criou a sua própria doutrina, que também é uma igreja: a Humanidade Livre. Por isso, ainda se considera padre.
“É preciso uma transformação profunda na mentalidade do clero”
Padre Beto
Em sua igreja, pessoas de diferentes criações religiosas se encontram. Sejam evangélicos, católicos, espíritas ou umbandistas. "Conheci pessoas que se sentiam muito mal frequentando certos espaços, que eram julgadas. Tem quem tenha sido expulso de grupos de oração. Por isso digo, se querem ter uma voz ética na sociedade, é preciso uma transformação profunda na mentalidade do clero", conta.
A Humanidade Livre tem sua sede em Bauru, interior de São Paulo. Embora não exista uma doutrina específica, as missas são centradas na figura de Jesus Cristo. Também não são impostas regras morais, o que basta é "ter amor ao próximo". Não foi fácil para Beto criar sua própria religião. Diversos padres locais ameaçavam excomungar também os fieis caso frequentassem suas missas, consideradas ilegais até o momento em que foi criado um CNPJ, único documento necessário para validar uma nova religião e prática cerimonial que não fossem ligadas ao catolicismo.
“É muito midiático e pouco racional, como o padre Fábio de Melo falando das mulheres, que escolhem ser abusadas”
Padre Beto
Padre Beto não hesita em dizer que a religião católica é uma hierarquia absolutista. "Tudo se trata de poder." Com as crescentes aparições de padres alternativos, principalmente na televisão e rádio, ele duvida que exista um efeito religioso ou crítico no discurso desses personagens. "É muito midiático e pouco racional, como o padre Fábio de Melo falando das mulheres, que escolhem ser abusadas. Não temos ninguém crítico ou engajado em questões sociais", pontua.
Para o padre, os discursos daqueles que aparecem na TV são simplesmente emocionais, de acalanto. "O Papa até que tenta ser um pouco mais avançado, mas são apenas frases de efeito." A solução, então, seria entender que religião é para unir as pessoas e não criar muros entre parcelas diferentes da sociedade. "O futuro da humanidade, pra mim, não é dentro de igrejas."
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Imagem principal: Soul Fotografia