Click, clack, boom
Primeira geração de fotógrafos de guerra brasileiros ganha exposição no Museu da Fotografia Fortaleza
O Brasil nunca teve uma geração de fotógrafos de guerra tão relevante. Essa é a percepção de Fernando Costa Netto, curador da mostra Na linha de frente, em cartaz até maio do ano que vem no Museu da Fotografia Fortaleza.
A mostra traz mais de 70 registros de conflitos, como a guerra da Líbia, a retomada de Mossul – cidade iraquiana que esteve sob domínio do Estado Islâmico –, campos de refugiados e a destruição de cidades sírias. “É a primeira geração de brasileiros tão interessados em conflitos armados pelo mundo. São olhares muito diferentes um do outro”, explica o curador.
Integram a mostra o fotojornalista da Associated Press, Felipe Dana, André Liohn, autor de um trabalho marcado por crueza e originalidade, Mauricio Lima, primeiro brasileiro a ganhar o prêmio Pulitzer, João Castellano, focado em retratar as consequências da guerra, Gabriel Chaim, que registrou as violentas ações do ditador Bashar Al-Assad e o fotojornalista Yan Boechat.
A série Uma visão independente, de Boechat, apresenta relances das batalhas entre o Estado Islâmico e as forças armadas iraquianas.
Trocamos uma ideia com ele sobre os detalhes de uma das mais belas fotos da exposição:
Pode contar um pouco sobre a história da foto em que um soldado pula um canhão no front? Essa foto foi feita no início de janeiro deste ano, em uma região do Iraque conhecida como Makmour. É um front, em que o Estado Islâmico estava a cerca de 1 ou 2 km distante de onde estávamos. Essa região fica a mais ou menos 60 km ao sul de Mossul e era uma área controlada pelo Estado Islâmico até alguns meses antes de essa foto ter sido feita. Esse era um dia de pouca atividade no front, com alguns poucos disparos de snipers. Um dia realmente calmo. Esse soldado estava sobre um tanque usado para coibir possíveis avanços do Estado Islâmico. O vi se preparando para pular do canhão e imaginei que seria uma boa foto. Não conversei com ele e não sei nada sobre ele, além de que é soldado da 9ª Divisão das Forças Armadas Iraquianas. Provavelmente, é xiita.
Você trabalha com medo de morrer? Vivi alguns momentos tensos. Mas na maior parte do tempo, a cobertura de guerra da maneira que eu faço é relativamente tranquila, com uma espécie de risco controlado. Claro, as coisas podem dar errado. Mas é mais comum que deem certo. É perigoso, mas talvez menos do que a maior parte das pessoas imagine. Não tenho esperança de paz mundial ou o fim do sofrimento de civis. Tenho a mais absoluta certeza que milhares de pessoas continuarão morrendo e sofrendo por conta dos interesses geopolíticos, de poder e riqueza de nações ou pessoas poderosas. Mas não pretendo morrer tão cedo e não pretendo me machucar fazendo nenhuma matéria. Mas é claro que riscos existem. Apesar do medo, paradoxalmente, aceito a ideia de que morrer é parte da vida. Cada ambiente tem suas próprias regras, seus próprios códigos. É importante saber quais são eles para que você se faça entendido e as pessoas entendam o que você quer. Em um ambiente de guerra não é diferente.
Créditos
Imagem principal: Yan Boechat