Tássia Reis segue otimista em meio ao caos

A cantora fala sobre novo disco, Próspera, moda, beleza, samba e família

por Nathalia Zaccaro em

Em Próspera, seu novo disco, Tássia Reis transforma otimismo em estratégia de combate e resgata suas memórias mais antigas — como as influências do samba que embalaram sua infância em “Amora” e a música dedicada à mãe, “Myriam”. Em outra faixa, “Ansiejazz”, ela relembra seu primeiro single, “Rapjazz”, e fala abertamente sobre a ansiedade que permeia os relacionamentos amorosos contemporâneos. "Acho que a gente está aqui para construir coisas. E, para mim, Próspera tem a ver com isso. É um passo para ir em direção ao que você acredita, do jeito que você julga ser o melhor", conta. O show de estreia vai rolar no dia 9 de agosto, no Cine Joia, em São Paulo.

O disco mistura rap, trap, rhythm & blues e a voz suave de Tássia, que canta sobre um tanto de tudo, de política a balada. “Dólar, dólar, euro, euro, euro/Eu vou fazer dinheiro com aplicações/Olha, olha, olha que maneiro, se o gueto inteiro receber milhões”, canta em “Dollar Euro”, parceria com a rapper Mona Bruttal.

Ela dividiu com a Tpm os pensamentos que guiaram a produção no novo trabalho e mostra a autenticidade que é sua marca: “A gente vive em uma sociedade que exige padrões inalcançáveis de beleza e, quando uma pessoa é minimamente feliz dentro de quem ela é, acaba chocando um pouco”. Se liga:

"A gente vive em uma sociedade que exige padrões inalcançáveis de beleza e, quando uma pessoa é minimamente feliz dentro de quem ela é, acaba chocando" - Crédito: Caroline Lima/Divulgação

Tpm. Por que você escolheu “Próspera” como título do disco?

Tássia Reis. Comecei a pensar nesse disco em 2015. Queria falar de evolução e a palavra surgiu, não me lembro muito bem como, posso ter sonhado. Eu acredito que a gente tem propósitos e um deles é certamente evoluir, se desenvolver espiritualmente, amorosamente, afetivamente. Acho que a gente está aqui para construir coisas. E, para mim, "Próspera" tem a ver com isso. É um passo para ir em direção ao que você acredita, do jeito que você julga ser o melhor. É uma busca. Eu não acredito que "ah, beleza, agora estou próspera". Acho que é uma busca que vai além, é uma vida inteira buscando. 

Esse disco tem um pouco de samba. O ritmo é uma influência pra você? Tenho uma influência de samba bem grande por conta da minha família, que gosta muito. Os meus pais se conheceram em um ensaio de escola de samba, é uma coisa muito viva dentro da minha família. Em Outra esfera já tinha a música “Se avexe não”, que acaba em samba. Nesse disco eu quis trazer um pouco mais dessas referências.

Em quais faixas de Próspera você percebe isso?  Em “Amora”, que tem a participação do Melvin Santhana.  Ele também veio do samba, na verdade ele é músico, produtor, cantor. E aí ele vem com essa bagagem. A música “Myriam” é um samba flow que fiz para a minha mãe. Ela sempre reclamava que não tinha música com o nome dela. E também em “Try”, talvez não seja tão evidente assim, mas o jeito de cantar eu acho que é samba. É uma faixa que acabou ficando um pouco mais hip hop/jazz, eu fiz pensando em um samba jazz, misturando um pouco de tudo isso. Talvez não seja tão notória a referência, mas está aí. 

A faixa “Ansiejazz” é uma referência a  “Rapjazz”, seu primeiro single? Sim, tem a ver. “Rapjazz” é mais jazz mesmo, “Ansiejazz” é mais neo soul. Fiz essa alusão no título como se eu estivesse trazendo uma menção ao meu começo. Claro que tem uma influência de jazz também, mas a sonoridade acaba sendo mais neo soul. Eu estava falando da ansiedade dos relacionamentos e acho que resgatar essas sonoridades um pouco mais antigas é muito interessante. 

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"Eu sou realista, apesar de otimista. Acho que se eu não fosse não conseguiria viabilizar uma carreira dentro da arte, no Brasil." - Crédito: Caroline Lima/Divulgação

O disco todo tem um lance com o otimismo. Você é otimista? Eu sou realista, apesar de otimista. Otimista e realista. Se eu não fosse, não conseguiria fazer arte, ou tentar viabilizar uma carreira dentro da arte no Brasil. É muito complexo ser artista independente no Brasil. Acredito que, nesses momentos de mais dificuldade, a gente se fortalece. Temos que mostrar resistência, mas temos que nos cuidar. Não está fácil, se a gente der brecha, pode ficar mal, depressivo, triste. Eu fiz o disco muito pensando nessa ideia de a gente se cuidar, ficar alerta. Independentemente do que aconteça no mundo, a gente tem que estar bem com a gente mesmo.

Você compõe desde o início da carreira. Como sente que está desenvolvendo essa parte do seu trampo? Olha, acho que o meu jeito de escrever não mudou muito, mas, claro, a gente aprimora a forma de desenrolar as coisas. Meu jeito de escrever é muito cotidiano. Ao mesmo tempo gosto de fazer poesia. 

O que te inspira? Eu acho que inspiração é um estado. Claro que alguém pode te inspirar, como a minha mãe me inspirou, por exemplo, mas sinto esse lance de estado, do sentir-se inspirada. E aí qualquer coisa pode virar poesia. É algo muito peculiar, perceber o estado da respiração. Eu sinto: "Hum, acho que vou criar alguma coisa". Ou então nem consigo pensar e já estou fazendo. 

Como você lida com a galera que te vê como inspiração? Eu recebo muitas mensagens. A gente vive em uma sociedade que exige padrões inalcançáveis de beleza e, quando uma pessoa é minimamente feliz dentro de quem ela é, acaba chocando um pouco. As pessoas me dizem: "Nossa, você usa cropped, barriga de fora". Elas ficam espantadas, me perguntam como eu tenho coragem de usar biquíni. Eu fico triste porque as pessoas acabam entrando nessa do que o outro vai pensar e o que o outro acha é problema do outro, não é problema nosso. O importante é a gente se sentir bem e ir atrás do que a gente acredita. Eu gosto de saber também quando as meninas falam que me viram e decidiram usar essas roupas também, acho bacana. Referência é uma coisa que importa, as pessoas precisam saber que é possível. Infelizmente, a sociedade coloca um monte de padrões e as pessoas se sentem podadas, se sentem incapazes de fazer coisas que são simples. É só vestir o biquíni e ir para a praia.  

E você acha que a moda foi uma aliada no seu processo de autoestima? Moda é comportamento. Para mim, tem a ver com identidade. É por isso que talvez eu tenha conseguido ser a mulher que eu sou. 

Você tem uma marca, a Xiu. Como rolou? Eu fiz a marca porque era um sonho. Estamos desenvolvendo algumas coisas novas, acessórios. Como sou eu que faço quase tudo, tenho que ir por partes, se não me dá uma pane. Mas estamos aí, devagar e sempre. 

E você se considera uma mulher vaidosa? Sim, no melhor sentido da palavra. Eu gosto de estar bem comigo, de mudar o cabelo. Acho que pode ser um pouco uma coisa da minha mãe, ela é muito vaidosa, talvez eu tenha puxado dela. Meu pai também, na verdade. Meus pais são super elegantes, gosto muito do jeito deles de se vestirem.

"Moda é comportamento. Para mim, tem a ver com identidade. É por isso que talvez eu tenha conseguido ser a mulher que eu sou." - Crédito: Caroline Lima/Divulgação

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Imagem principal: Caroline Lima/Divulgação

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