Viver não é para amadores
Essa edição da Tpm foi às ruas buscar entender que tipo de futuro estamos construindo nessas bases. O que vai ser da gente daqui a 20 anos?
É bastante fácil nos convencerem de que seremos finalmente felizes quando conseguirmos juntar certa quantidade de dinheiro ou comprar o celular recém-lançado ou emagrecer, casar, ter filhos. Passamos pelos dias recebendo mensagens que nos incentivam a trabalhar, correr, acumular e, sem tempo para parar e refletir, acreditamos que felicidade é aquilo ali na frente que outras pessoas alcançaram e que eu, com sorte, alcançarei um dia.
Terra devastada é a que abriga pessoas sem inspiração seguindo rotinas sem significado. Nesse sentido, talvez estejamos todos vivendo em uma terra devastada e inundada pela crença de que a interpretação econômica de nossas vidas é a que vale.
Essa edição da Tpm foi às ruas buscar entender que tipo de futuro estamos construindo nessas bases. A inquietação que nos levou a construir a revista que está em suas mãos foi: o que vai ser da gente daqui a 20 anos?
Voltamos dessa nossa aventura com algumas certezas e muitas dúvidas. As certezas passam pelo fato de que, a despeito do que nos dizem, felicidade não é comprar dois sapatos pelo preço de um. Felicidade e liberdade são conceitos indivisíveis, que envolvem comunidade, igualdade e justiça. E que se não houver igualdade e justiça em doses mínimas para todos nós, dificilmente seremos felizes porque ninguém existe sozinho. Foi curioso também perceber que, especulando o futuro ou analisando o passado, as coisas que nos afligem, encantam, dilaceram, elevam – tiradas as camadas de reboco das ilusões – são sempre as mesmas.
As dúvidas se referem ao que precisamos fazer para conferir significado às nossas vidas. Como desacelerar desse corre diário? Como ser capaz de se entregar a uma relação verdadeira sem medo de se mostrar vulnerável? Como construir sentido? Como aceitar que somos imperfeitos e, exatamente por isso, belos? O que, verdadeiramente, importa?
A experiência humana é ao mesmo tempo terrível e arrebatadora. A consciência de que estamos acabando é capaz de nos devastar, mas a capacidade de amar e de conviver pode ser sublime. Para que a experiência seja mais arrebatadora do que terrível, precisamos enxergar que homens e mulheres estão juntos nessa nave chamada Terra, essa partícula de poeira perdida na vastidão do cosmo. E que apenas a mais absoluta e profunda compreensão de que somos todos iguais, temos os mesmos direitos e merecemos os mesmos privilégios é que vai nos reconciliar com as fundações da nossa existência e, quem sabe um dia, nos libertar.
*Milly Lacombe, editora convidada