por Alê Youssef

Minha coluna na edição Trip sobre TV. Uma fábula para reflexão sobre nossa política.


O candidato a presidente da república está dentro de um estúdio de TV, cercado de assessores, estudando e analisando cada detalhe do que vai falar em instantes. Clima tenso e medo de errar naquela oportunidade de ouro para falar diretamente em rede nacional de TV com milhões de brasileiros. Foi-se o tempo em que ele poderia somar os tempos de TV que a a lei eleitoral fatiava por partidos políticos, de acordo com o tamanho de suas bancadas. Sua super coligação que reúne gregos e troianos, não garante mais aqueles 15 minutos de ouro, editados e com efeitos especiais. Padrinhos políticos, artistas, jogadores de futebol e todos aqueles que estão com ele não podem mais aparecer. 


Desde que a reforma eleitoral foi aprovada por aquele governo que pregava uma nova política em que não se podiam trocar cargos em ministérios por tempo de TV, o esquema mudou: a transmissão agora é uma vez por semana, ao vivo, sem edição, sem "tele pronter", sem efeitos que deixam tudo mais lindo e sem ninguém além do próprio candidato. 


Tem também as mudanças da reforma política aprovada junto com aquela onda de pressão popular esquisita. Agora não tem mais reeleição e dinheiro de empresa na campanha e cada um tem que se virar com a doação de pessoas físicas que se identificam com as propostas. Disseram que foi para acabar com os acordos espúrios, mas não imaginavam como isso iria gerar dores de cabeça aos candidatos.


Além das novas leis deixarem toda equipe muito apreensiva com os eventuais deslizes da conhecida falta de capacidade de comunicação e improvisação do candidato e a falta de dinheiro farto, a tensão aumenta ainda mais por terem que aguentar outra estranha situação. Agora todos os candidatos tem o mesmo tempo de TV e até os nanicos tem o mesmo espaço. Como era bom quando esse pessoal quase folclórico tinha que falar tão rápido que ninguém entendia, ou quando se podia usar o longo tempo disponível para desconstruir (a palavra era essa mesmo) alguém que ameaçava.


Para piorar o clima no estúdio, tem também uma disputa interna chata: assessores divididos com a quantidade de partidos na coligação do candidato, todo mundo dando palpites para o homem prestes a aparecer na TV, uma loucura. A figura do marqueteiro todo poderoso desapareceu depois que as leis mudaram. Sem aqueles muitos minutos para deitar e rolar e grana alta das doações de corporações ficou complicado mesmo.


A ala contrária às coligações não entende a vantagem de reunir gente tão diferente e com visões de mundo opostas, já que não existe mais o latifúndio da TV. Mas os que defendem as coligações, querem deixar tudo preparado para terem a maioria no Congresso. Caso vençam as eleições, alteram novamente essas leis para tudo voltar a ser como era antes. A nova política agora é a volta ao passado, dizem os especialistas próximos ao candidato. Mas, agora na solidão do estúdio, já na hora da gravação sem os assessores e aliados ao lado, ele se ressente em seu íntimo, pois no passado ele concordava com todas essas novas leis. Por achar impossível coloca-las em prática e por não ter sido ele quem as fez, ele mudou de lado. Ao vivo.

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