Notícias de algumas guerras particulares
Diretor de filme ainda inédito sobre a Guerra do Iraque, Fernando Coimbra elege seis produções sobre conflitos que ajudam a entender o mundo hoje
Fernando Coimbra passou quatro meses na Jordânia (conhecida zona neutra do Oriente Médio), próximo à fronteira da Síria, filmando Sand castle, longa que se desenrola durante a Guerra do Iraque, em 2003 . "Víamos os caças voando acima das nossas cabeças", lembra o diretor, que ficou conhecido pelo thriller O Lobo atrás da porta (2013) e dirigiu dois episódios da primeira temporada de Narcos – Fernando voltou à Colômbia este mês para gravar a terceira temporada da série. "Foi um grande aprendizado: é uma estrutura grande até mesmo para um filme e que raramente temos na TV", ele conta à Trip. "Nos últimos três anos, meu trabalho está bastante fora do Brasil".
LEIA TAMBÉM: Registrando a vida atrás das linhas sírias
Em janeiro, Fernando saiu do Sundance Film Festival com o Global Filmmaking Award, que premia quatro novos diretores com base no roteiro de seus próximos filmes: ele levou o prêmio pelo ainda inédito Os enforcados, "um thriller tragicômico", define, que deve começar a filmar no segundo semestre. Nesse trânsito internacional, recebeu o roteiro de Sand castle. Com Nicholas Hoult (Mad Max: Estrada da fúria) e Henry Cavill (Batman vs Superman), o filme acompanha um grupo de soldados enviado para os arredores da cidade de Baqubah, no Iraque, para consertar uma estação de bombeamento de água danificada por bombas americanas. Sand castle vai ser o primeiro longa original de um diretor brasileiro com lançamento global pela Netflix, ainda este ano. Depois de mergulhar na pesquisa do filme, a pedido da Trip, o diretor elege e comenta seis filmes de guerra disponíveis no serviço de streaming que ajudam a entender o mundo hoje.
Soldado anônimo (2005), de Sam Mendes
"O filme se passa na Guerra do Golfo (1990-1991), do George H. W. Bush: os soldados estão ansiosos para invadir Iraque, mas nunca vão. Traz muito da psicologia desses caras, como eles estão reagindo à situação. O longa é mais importante sob a perspectiva humana e menos pela geopolítica. Soldado anônimo me serviu muito de inspiração para o Sand castle: a forma de fazer um espetáculo cinematográfico com aquela situação era o que eu estava buscando. Os filmes sobre a Guerra do Iraque têm um tom bem documental como o Guerra ao terror (2008), mas queria fugir um pouco dessa estética e fazer Sand castle de uma maneira mais clássica, épica, cinematográfica."
LEIA TAMBÉM: O diretor de Dois Coelhos quer emoção
Dr. Fantástico (1964), de Stanley Kubrick
"É um título antigo, mas que nesta Era Trump ficou novamente atual. Dr. Fantástico é um filme de guerra, mas não do campo de batalha; é uma sátira à Guerra Fria, um lunático que pode apertar um botão e destruir o mundo. Estamos voltando a essa polaridade entre Rússia e Estados Unidos, apesar de a gente não conseguir entender se eles estão se ajudando."
Jogos do poder (2007), de Mike Nichols
"Com um elenco super estrelado (Julia Roberts, Tom Hanks, Philip Seymour Hoffman), o filme mostra como o congressista Charlie Wilson teve a sacada e os EUA venceram a Rússia no Afeganistão, armando o segundo país. Mostra bem esse jogo geopolítico americano, que depois acaba gerando uma nova guerra em que os próprios americanos tem que lutar, como aconteceu com o Afeganistão e a forma como armaram o Bin Laden – os inimigos americanos que geralmente são munidos por eles próprios. Mostra os bastidores da guerra dos gabinetes e o que faz ela acontecer."
A hora mais escura (2012), de Kathryn Bigelow
"O que acho interessante neste filme é que ele conta uma história que não aconteceu. Para mim, a morte do Bin Laden é algo muito mal contado. Tem gente do exército americano e da CIA que afirma que não foi nada daquilo. Há muitas dúvidas se pegaram o Bin Laden, jogaram no mar e ninguém viu. Ele era um um bode expiatório. Pouco antes de sua morte, veio à tona um grupo de força especiais que entrava sem autorização em outros países: os EUA não tinham uma guerra declarada, mas ainda assim entraram no Paquistão sem autorização. Chegou uma hora que não tinham mais como esconder a verdade e vieram com a história desse grupo que capturou o Bin Laden. Há a teoria que isso surgiu para limpar a pele deles. Na minha opinião, esse filme é uma ficção: juntaram todas as coisas que precisavam justificar em uma história mal contada."
Winter on fire: Ukraine's fight for freedom (2015), de Evgeny Afineevsky
"É um momento específico da história da Ucrânia em que o povo se revolta contra o governo, que age conforme o interesse russo, diminuindo a independência do país. Eles vão para a rua, acampam em uma das principais praças de Kiev, passam meses lá. Há crianças, velhos; criam uma espécie de exército civil. A repressão policial é fortíssima, muita gente morre. É a história de um protesto único e, ao mesmo tempo, retrata o que estamos vivendo em outros países."
O ato de matar (2012), de Joshua Oppenheimer
"É uma história muito delirante do massacre que tomou o país em 1964/65, quando os Estados Unidos, após o Vietnã, também promoveram uma caçada aos comunistas, patrocinando um golpe militar. Um grupo de matadores de aluguel passou a assassinar os comunistas, o que virou uma chacina brutal. Vários deles são entrevistados e simulam como torturavam e matavam. Muitas vezes, fazem o papel do torturado e um deles surta quando se coloca no lugar da vítima e passa a entender o outro lado. É uma loucura. Hoje, eles são vistos como heróis, que se vestiam de uma forma glamourosa, imitando os gângsteres de Hollywood, e ainda existem milícias anticomunistas."
LEIA TAMBÉM: Os melhores filmes, quadrinhos e séries para 2017