Como ser um caçador de tendências
Um pequeno guia prático com ideias básicas sobre como as modas vão e voltam
Em uma época de permanente excesso de informação, filtros e referências são cada vez mais importantes. Por isso, o papel de curadores ou “caçadores de tendências” nunca foi tão valorizado. Pensando nisso resolvi preparar um pequeno guia prático com ideias básicas sobre como as tendências vão e voltam (baseado nas ideias de um dos meus ídolos, o artista escocês Nick Currie).
Para isso, é preciso dividir o tempo em diferentes segmentos. O primeiro é o presente, que vai de hoje até vários meses atrás. Se você olha para uma foto um pouco mais antiga e pensa “Que cabelo estranho estou nessa foto!” é porque ela já não pertence ao presente e sim a outro segmento bem mais delicado, o presente ansioso.
Esse intervalo é composto de tudo aquilo que bombou e foi tendência antes de agora, mas que neste momento soa meio passé e até mesmo constrangedor. É só pensar no fenômeno da “new rave”, com suas roupas coloridas e a mistura de rock e eletrônica. Há alguns poucos anos, fazia sentido. Hoje, é difícil encontrar um new raver assumido.
Antes do tempo de ansiedade, vem outro trecho que pode ser chamado de o passado amigável. Trata-se do período transcorrido já há algum tempo, que está pronto para voltar e ser revivido (por isso mesmo é para onde olha a maioria dos caçadores de tendência). Nesse momento o passado amigável é representado, por exemplo, por tendências da década de 90, como o indie rock do Pavement, guitarras distorcidas e vocais melódicos da onda shoegazer e assim por diante.
Existe, no entanto, um período que acho o mais interessante para a procura de tendências. Trata-se de um minissegmento entre o passado amigável e o presente ansioso. Vamos chamá-lo de o purgatório.
Esse intervalo é composto daquilo que ainda é novo demais para ser revivido, mas já é velho para fazer parte do presente. Enquanto trabalhar com o passado amigável é fácil, o purgatório é onde dá para encontrar as ideias mais arriscadas e interessantes (diria, por exemplo, que a onda do Eletroclash do início dos anos 2000 está hoje na região do purgatório).
O PASSADO TE CONDENA
Antes daí há mais duas outras zonas. A primeira é o passado ansioso, que nada mais é do que um período que acabou de ser revivido atualmente e que adquiriu ares de constrangimento (por exemplo, as festinhas de anos 80 trash). Depois vem o passado longínquo, que, apesar de não começar tão distante assim, vai embora em direções imemoriais. Essa é a outra área que, obviamente, é das mais interessantes e difíceis de trabalhar, até porque sua influência sobre o nosso tempo é indireta e espectral (um exemplo é a aposta atual na nova série de televisão Boardwalk Empire, que se passa nos anos 20).
É claro que os limites entre cada um desses trechos mudam o tempo todo (por exemplo, o presente está ficando cada vez menor). Claro também que estou falando aqui de apenas um detalhe sobre a dimensão temporal da busca por tendências. Há várias outras dimensões que renderiam boas conversas, como, por exemplo, a dimensão espacial (que envolve uma articulação das ideias de centro e periferia). Mas essa fica para a parte 2 deste texto, a ser escrita em algum lugar do futuro.
*Ronaldo Lemos, 33, é diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br