Sobre machismo no Brasil: desculpem, amigos, mas vamos ser chatas!

Eu sou do feminismo sem carteira e acho que os homens podem e devem colar. Mas, para mudar as coisas, vamos ter que reclamar, brigar e correr o risco de sermos chamadas de mal comidas e loucas.

por Nina Lemos em

Talvez você leia esse texto e fale que eu sou chata. Talvez você leia e fale que eu sou mal comida. Ou que eu sou louca. Nos três casos, se você pensar isso, é provavelmente porque você não entendeu nada.

Está bem bonito de ver os homens chocados com os nossos relatos de #primeiroassédio e falando que agora nos entendem e mudando seus avatares de redes sociais. Muitos nos acompanham (e são bem vindos) nesse momento em que decidimos expurgar nossos demônios e falar qual é a real. E a real é: ser mulher no Brasil é uma coisa horrorosa. E se o Eduardo Cunha quer piorar, desculpem, mas já era ruim antes, bem antes.

Um dos motivos de ser uma coisa horrorosa é esse: quando reclamamos dos nossos tormentos, somos chamadas de chatas, mal comidas e loucas. Talvez seja chato mesmo a gente ficar repetindo, mas se a gente não repetir, não vai mudar. Então, o que eu entendo deste momento no Brasil é assim: se resolvemos que chegou a hora de mudar as coisas, não vai ser divertido o tempo todo. Vai ser chato, vamos ser muito chatas. E se reclamarem vamos ser mais chatas ainda.

Outro dia conversava com amigas sobre um tabu: e os nossos amigos que assediam? Bem, no meu caso eles existem e não são nem um, nem dois e nem três. Vocês podem continuar a nos abraçar e nos amar. Mas quando a gente fala não… é não. E quando vocês, por exemplo, começam a tentar nos beijar bêbados e a gente fala não e você insiste é porque você está sendo chato, abusivo, pentelho e sem noção. Dica para os amigos: respeitem os nossos nãos. Não é tão dificil.

Lembro das últimas brigas que tive com amigos homens no Brasil, amigos descoladinhos, de humanas. Amigos que, olha, ninguém diria! Um deles, uns 40 anos na cara, disse em um bar em Botafogo: "fico louco com essas ninfetas. Gosto desse bar porque é cheio de ninfetinha. E passou o resto da noite olhando para bunda de mulher. Até que eu dei um escândalo. Levantei, falei que ia embora, chamei de machista. Chamei de nojento. O amigo do amigo voltava de uma longa temporada na gringa e tinha namorado um islandesa (sim, a terra mais feminista do mundo). Ele me chamou em um canto e disse: "eu te entendo. É absurdo." Mas para o amigo que queria passar a noite olhando para bunda de "novinha", eu fui chata. E louca. Talvez porque eu estivesse mal comida. Brigamos. Bloqueei do Facebook.

É porque eu sou louca, gente, louca!

Um outro amigo teimou comigo quando eu disse que eu não podia entrar sozinha em um boteco em São Paulo. "Você pode". "Não, não posso". "Você não vai porque você não quer, se você acha que não pode você devia ir para quebrar esse tabu. É só ir." Qualquer mulher que leia isso aqui deve concordar comigo que não é assim tão simples, né? Mulher sozinha no boteco vai levar cantada pesada e ser chamada de alcóolatra mal amada que está "na pior" se alguém a vir por lá.

Eu sou do feminismo sem carteira! Eu sou aquela que acha que os homens super devem colar. Continuo achando.

Mas sério, queria dar esse toque. Ficar chocado com assédio e sair pra olhar bunda de novinha não vai valer. Eu to falando para vocês que vai ser chato. E talvez vocês me chamem de louca. Tudo bem. Faz parte. Já acostumei.

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