"Trate sempre os outros como você gostaria de ser tratada"... Mesmo?

Quem nunca ouviu isso da boca da mãe ao chegar em casa triste por algo que nos fizeram?

por Mariana Perroni em

 

"Trate sempre os outros como você gostaria de ser tratada". Quem, quando menina, moça ou mesmo mulher, nunca ouviu isso da boca da mãe, tia ou avó ao chegar em casa triste por causa de algo, geralmente abusivo, que alguém fez contra nós? A máxima surgia em diversas situações e momentos da vida. Podia ser porque um grupo de coleguinhas nos isolou no recreio por não termos a lancheira da Moranguinho, porque um adolescente fez piada sobre nosso aparelho dentário no colégio, ou porque um chefe foi extremamente rude conosco sem motivo.

O que deveríamos fazer nessas situações?  Demonstrar incômodo e tirar satisfação? Nunca. Devíamos é tratar bem aquele que nos agrediu, pois isso o faria ver como ele foi injusto. Consequentemente, ele se sentiria mal com isso e passaria a nos tratar bem. Ah, a fantástica lógica do pensamento feminino...

Quando comecei a frequentar hospitais e que passei a ter a conviver com pessoas em diversas fases da vida, estados de espírito e de saúde, passei a me interessar muito por psicologia e filosofia. Devorei Jungs, Schopenhauers, Nietzsches, Freuds, Sartres e Kants em noites de insônia, nas férias ou naqueles momentos em que eu precisava dar um tempo das vísceras e mecanismos de ação de remédios.

Foi numa dessas noites que me deparei com o conceito de Lei do Efeito, que diz respeito à maneira como as pessoas entendem e interpretam os comportamentos umas das outras. Ele diz que comportamento varia de acordo com as consequências que ele causa. Dessa forma, se tratamos bem um adolescente nos chame de "gorda" no colégio ou um chefe grite ou nos trate mal gratuitamente, basicamente estamos criando um sistema de recompensa para o mau comportamento e a babaquice. (psicólogas e estudiosas, fiquem à vontade para me corrigir).

Quando eu tinha meus 10 anos, presenciei algo corriqueiro ao visitar minha bisavó no asilo em que ela vivia... ou morria (eu nunca soube ao certo).
Só esses dias, ao lembrar do ocorrido, consegui notar que aquilo que parecia tão banal e espirituoso, na realidade era pura sabedoria e ilustrava perfeitamente o conceito sobre o qual falei:

Depois de sairmos do quartinho em que minha bisavó Alice tomava seu café com leite, minha mãe e eu fomos educadamente cumprimentar a velhinha que era "vizinha" de quarto, uma senhorinha de aparência doce e rugas tão profundas quanto o que ela viria a me ensinar, mesmo sem imaginar. Ela estava tomando sol calmamente no jardim do local enquanto afagava um gato de cor caramelada.

- Ô, Dona Ceci! tudo bem com a senhora?
- Agora sim, minha filha.

Dona Ceci, então, pega um caderno de folhas amareladas, abre o mesmo e mostra a seguinte anotação para minha mãe: "Alice me beliscou no dia 04/08/1993"... E então completa com a seguinte frase:

- Sabe, filha, eu briguei com ela mas já conversamos e eu a perdoei. Só achei melhor anotar pra não esquecer.

Não quero, de forma alguma, incitar conflitos, grosseria gratuita, bate-boca ou discórdia. Essas coisas, inclusive, me atormentam muito. Só que também sei, por experiência própria, que ser gentil em excesso é uma excelente forma de evitar confrontações difíceis mas necessárias. De qualquer forma, acredito que quando formos um pouquinho mais Dona Ceci e começarmos a expressar nosso descontentamento, com classe, frente a comportamentos que nos desagradem, talvez comecemos a deixar de ter braços quebrados quando não quisermos ficar com um cara numa festa.

 

(meu twitter: @mperroni)

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