Dicas para o exílio contemporâneo
Pensando em fugir do Brasil? Se joga, mas saiba que você vai ter que desapegar do seu "eu patricinha". Ter nutricionista, personal? Só se você for a Madonna!
Não era pra ser um exílio. Pelo contrário. Quando me apaixonei por Berlim, eu amava o Brasil (ainda amo, mas o relacionamento está em crise). Na primeira temporada de seis meses aqui, em 2013, cheguei a brigar com um espanhol racista que disse que eu era de um país pobre e subdesenvolvido. "Pobre? Pobre é a Espanha! Nós somos a quinta economia mundial. Quinta economia mundial", eu disse. Tolinha.
Bem. Na iminência do Eduardo Cunha ganhar ainda mais poder posso dizer que isso virou sim, de certa forma, um exílio. Às vezes tenho vontade de usar uma daquelas roupas que o Caetano usava e sair por aí cantando: “Sunday, Monday, years and I agree”. E como todo santo dia recebo mensagem de amigos (meio rindo, meio falando sério) dizendo: “Tô pensando em ir para aí!”, decidi dar algumas dicas sobre o exílio contemporâneo -- Contém ironia.
1) Case
Se você tem passaporte europeu, se joga bi! Senão, case com alguém. Serve namorado, amigo, amiga. Se tiver grana compre um casamento (a louca). Sem isso, a vida aqui fica quase impossível. E não, a Europa não irá aceitar exilados brasileiros. A maioria acha que já tem refugiados demais por aqui. Por mais que a gente grite “say it loud, say it clear, refugee are welcomed here”… não é isso que o governo pensa. Eles aceitam (mais ou menos) exilados de guerra. Exilado político de um governo liberal? Esqueçam.
2) Desapegue
Móveis? Gato? Roupas? Você não precisa disso. Deixe com amigos ou parentes. Dê a maioria de suas roupas, livros e objetos de decoração. Eu fiz isso. Não doeu nada. Sério. Lembre que os exilados de verdade iam direto da prisão para um avião. Amor e respeito eterno por essas pessoas.
3) Abandone do seu "eu patricinha"
Desapegar é bom porque chegando no lugar de exílio você vai ter que desapegar geral. Seu eu patricinha que ainda morava em algum lugar vai ter que sumir. E você não vai ter faxineira (óbvio). Mas também não vai ter nutri, dermato, personal. A não ser que você seja a Madonna. Ou a Ivete. Vai que a Ivete decide exilar!
4) Prepare-se para ser ninguém na fila do pão
Sua família tem um sobrenome chique? Hahaha! Você construiu sozinha uma carreira bacana do nada e publicou seis livros? Ninguém vai saber ou ligar. Você é super hype formador de opinião? Não: você era. Aqui você é um imigrante. Se você é de classe média no Brasil, já nasceu com alguns passos dados na fila do pão. Pois aqui você vai voltar para o fim. Não pense que se você é um fotógrafo badalado, você vai chegar em outro país e abalar. Não vai! Tá, você fez um monte de coisas legais. Mas um monte de gente também fez! Tem um monte de refugiado sírio e africando vivendo em asilo que é PHD, escritor, fodão. Então pare.
5) Você vai fazer trabalhos não hipsters (se achar um)
Call center? Claro, por que não? E mano: São só 4 horas por dia!! Servir café? Trabalhar num bar em um lago no meio de nada? Que foda! Se você leu esse item e pensou: “mas eu não estudei pra isso”, leia todos os itens acima de novo. Ou não venha. Não vai dar certo. Lembram que o Gabeira foi motorista de metrô na Suécia? Pois então.
6) Não esqueça a escova, o sabonete e o violão