Otimismo pessimista ou pessimismo otimista?

Talvez o otimismo não seja o segredo milenar para atingir o sucesso...

por Mariana Perroni em

 
A cada segundo que corre no relógio, decisões são tomadas em todo o mundo. Boas ou ruins. Sensatas ou questionáveis. Realistas ou otimistas. Essa semana, por exemplo, um cara de 30 anos resolveu cheirar cocaína pela primeira vez. Para a surpresa dele, não ganhou só a euforia e a noite maravilhosa prometidas ao se esparramar a droga ali na pia do banheiro. Ele também ganhou um brinde: fortes dores no peito... que só foram piorando e começaram a se somar a falta de ar, obrigando-o a procurar um pronto-socorro. E foi lá que ele soube que estava infartando. Aos 30 anos de idade. E que teria que ir para a UTI para ser tratado (mas essa é a parte boa, certo?).
 
Interessante como todo mundo sabe que fumar mata... Mas mata o cara ali do lado. Não a mim. Que ser sedentário faz mal... Para a  menina sentada ali naquela mesa, não para mim. Ou que cheirar cocaína pode causar infarto. No cara ali perto do bar, não em mim. Somos tão otimistas, que, mesmo com todos os exemplos de catástrofes relacionadas nos jornais, nunca as levamos pessoalmente e persistimos acreditando que nunca vai haver problema quando fazemos as mesmas coisas.
 
Ao contrário do que foi absolutamente doutrinado e repetido em diversos livros de auto-ajuda, talvez o otimismo não seja o segredo milenar para atingir o sucesso... Talvez o otimismo possa ser, também, perigoso. Por mais que ele reduza o stress e a ansiedade, ele traz consigo algo chamado de "o viés otimista", algo que vem sendo objeto de interessantes estudos, principalmente de uma neurocientista inglesa chamada Tali Sharot.
 
Segundo ela, o viés otimista é aquilo que faz com que as pessoas superestimem a probabilidade de que coisas boas aconteçam em suas vidas (como ser promovido no emprego) e subestimem a chance de eventos ruins. É ele que faz com que pensemos que nossos diferenciais serão vistos e teremos uma promoção no emprego, ao mesmo tempo que nos diz que não tem problema tomar mais um drink e dirigir para casa pois somos bons motoristas. E tem até explicação anatômica e fisiológica para o fenômeno: ressonâncias magnéticas e tomografias funcionais realizadas em pessoas "normais" mostraram que a área do cérebro responsável pelo processamento de eventos bons superpõe a que faz a mesma coisa com os eventos ruins. Já naquelas com depressão severa, os achados foram o oposto. E, curiosamente, nos indivíduos com depressão leve, o funcionamento das duas regiões foi o mais equilibrado (e, consequentemente, o mais realista).
 
Ao mesmo tempo, há estudos comprovando que pessoas otimistas geralmente têm menor risco de desenvolver doenças cardíacas. Pois eles acreditam mais na importância de fazer exercícios físicos, comer pouca gordura e tomar remédios corretamente. Além disso, questiona-se se, evolutivamente, não foi otimismo que permitiu que o homem fosse adiante. Afinal, se o medo de que algo desse errado fosse incapacitante, ainda estaríamos passando as noites, no escuro e com frio, dentro de cavernas. Ou acessando internet por conexão discada.
 
Então o otimismo é uma coisa boa ou ruim? É possível se beneficiar dele e permanecer esperançoso sem cair em suas armadilhas? Ou é preciso sonhar em ter depressão leve? Eu concordo com a Tali Sharot. Acho que o otimismo é algo como uma ilusão de óptica: você não deixa de senti-lo só por saber como ele ocorre. É parte da natureza humana. Felizmente, fazer escolhas também é algo extremamente humano. Dessa forma, acho que a solução está em fazer a escolha de não ignorar a existência do viés otimista. E, dessa forma, evitar ter que decidir se a UTI está meio vazia ou meio cheia ao acordar e dar de cara comigo após um infarto.
 

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