Os transgênicos contra a Zika

Aedes aegypti geneticamente modificado pode ser a solução

por Lygia da Veiga Pereira em

Como se não bastasse o vírus da dengue, que atinge 100 milhões de pessoas por ano no mundo todo (e 10% dessas morrem da doença), a mais nova gracinha do mosquito Aedes aegypti (ou, do grego e do latim, Odioso do Egito) é nos infectar também com o vírus da zika, um primo próximo do dengue.  Esse novo vírus deve ter chegado ao Brasil durante a Copa de 2014, no sangue de alguns turistas provavelmente da África ou da Ásia.  Ao picar esses turistas e sugar seu sangue cheio de zika, os Aedes locais se tornaram transmissores de mais um vírus (e vocês achando que o 7 a 1 tinha sido a maior catástrofe da Copa de 2014...).

Só que comparados com dengue, os sintomas da zica são muito amenos, e assim ninguém estava muito preocupado com mais essa doença infecciosa – afinal, melhor zica do que dengue ou febre amarela!  Até que começaram a surgir os casos de microcefalia...  E aí descobrimos um efeito inesperado e perverso do vírus zika: ele ataca o cérebro de fetos, causando inflamações que durante o desenvolvimento do órgão têm consequências desastrosas... O cérebro menor e mal formado não funciona bem, levado a deficiências intelectual e motora.

Para vocês terem uma ideia, entre 2010 e 2014, o país registrou uma média de 150 casos de recém-nascidos com microcefalia por ano. Nos últimos 12 meses, foram diagnosticados quase 1.250 casos da doença! Ora, é claro que há algo de novo (e podre) no reino Brasilis, e essa novidade se chama zika.

Crédito: wikicommons


Mas o vírus da zika só deitou e rolou aqui desde sua chegada em junho de 2014 porque nossas terras estavam infestadas de Aedes aegypti – e seguem infestadas, com os programas de erradicação do mosquito baseados em inseticidas e em educação popular claramente insuficientes para controlar a multiplicação do bicho.  Sim, estamos trabalhando na vacina contra a dengue, estamos quase lá, mas ainda precisamos de mais tempo... Além disso, precisaremos também de vacina contra zika, chikungunya, e febre amarela, todas transmitidas pelo mesmo mosquito. Não era mais fácil então eliminar o mosquito transmissor disso tudo?  Pelos métodos tradicionais aparentemente não...

Foi aí que entrou a biotecnologia para salvar o dia.  Uma empresa, Oxitec, criou Aedes geneticamente modificados, ou transgênicos, que possuem um gene suicida que mata o mosquito na fase de larva!  A ideia é produzir milhões desses mosquitos transgênicos MACHOS (só as fêmeas picam, machos são “vegetarianos”) e solta-los nas ruas.  Eles vão cruzar com as mosquitas fêmeas que andam nos picando por aí, só que as larvas produzidas morrerão por causa do gene suicida que receberam do papai transgênico! É o controle de natalidade do Aedes!

Nos primeiros testes em dois bairros de Joazeiro, na Bahia, em 2011, a liberação dos Aedes transgênicos levou a uma diminuição de até 96% (vou reforçar: NOVENTA E SEIS PORCENTO!!) da população de Aedes aegypti local!!!  Entre maio e junho de 2015, os mosquitos transgênicos foram liberados em Piracicaba.  Em Junho de 2015, 80% das larvas de Aedes encontradas nas ruas de Piracicaba eram transgênicas, ou seja, iriam morrer! 

Para aqueles fóbicos dos transgênicos, esses Aedes aegypti transgênicos do bem mostram que a tecnologia, quando bem utilizada, pode trazer enormes benefícios à população sem malefícios ao meio ambiente – no caso, sem utilizar inseticidas tóxicos para os mosquitos e para nós. Com uma cajadada, o mosquito transgênico, podemos matar vários coelhos: dengue, zica, chikungunya e quem sabe até a febre amarela, endêmica em dezenas de países há décadas! 

Mas o maior desafio da estratégia do mosquito transgênico é EDUCAÇÃO – conseguir explicar aos governos e às populações das áreas a serem tratadas que soltar milhões de mosquitos vai ser bom, que eles não vão passar o gene suicida para ninguém, que eles não vão transmitir nenhuma doença, e que vão eliminar os Aedes e todas as doenças que ele carrega. Enquanto isso, pelo amor de Deus, mulheres em idade reprodutiva, considerem o risco de engravidar com a zika descontrolada no país.

Arquivado em: Tpm / Saúde