Marina de La Riva
Conversamos sobre música, amor e Cuba com a cantora que está lançando seu segundo disco
Além da visceralidade, o tema do novo disco de Marina de La Riva é o amor. E quem ouve as canções fortes de Marina logo percebe que não poderia ser diferente para cantora que traz a passionalidade no sangue. Apesar de ter nascido no Brasil, a carioca foi criada com um um pé na cultura da ilha de Cuba, onde nasceram seu pai e avô. "Minha Cuba não é a da camiseta do Che Guevara. Minha Cuba é outra: da família, da receita, da clave, da saudade do avô. Eu amo este lugar, tenho memórias afetivas."
Conversamos com a cantora por telefone e falamos, entre outros assuntos, sobre escolhas estéticas, a recepção do público, a influência de Cuba em seu trabalho e os temas que permeiam a cabeça e arte de Marina.
Entre o lançamento do seu primeiro disco e o lançamento de Idílio houve um intervalo de 5 anos. Por que você demorou esse tempo para gravar um novo trabalho?
Muito legal você estar me perguntando isso porque eu acredito que a arte tem um outro tempo, que não é o tempo do relógio. Me dei esse luxo de respeitar isso, mas não quer dizer que o próximo será assim. É como o tempo interno de uma fruta, ela tem que estar pronta. Fiz no momento em que eu senti que estava pronta.
A música foi sua prioridade neste período?
Sim! O tempo inteiro. Não parei de trabalhar, nem pesquisar. Enquanto eu estava fazenndo shows do disco anterior já estava ligada no Idílio, ele já estava acontecendo em mim. Tanto é que a musica "Ausência" eu conheci em 2007 e a "Cancion de las simples cosas" eu gravei em Cuba em 2009. Eu vim construindo. E de repente eu fui pro estúdio e fiz o disco em uma semana. É um processo interno mesmo. Mas eu nunca me afestei da música.
Muitos artistas ficam um tempo sem gravar para se dedicar a outras coisas que não sejam a música...
Sim, eu entendo e adoro a pergunta porque eu mesmo me questiono [risos]. E no fundo... Vou te contar uma coisa maluca... Eu já comecei a pensar no outro disco.
O clipe de Voy a Tatuarme do disco novo foi filmado em Buenos Aires com direção de dois argentinos, Juanito Jaureguiberry e Picky Talarico [que já trabalharam com o grupo Bajofondo e com o cantor Julio Iglesias]. Por que você escolheu essa dupla para dirigir seu clipe e porque a escolha de gravar em uma casa de tango?
O Juanito é um grande diretor de arte que já trabalha do comigo desde o primeiro disco, eu admiro muito o trabalho dele e gosto de ouví-lo. Eu sonhei com a capa de Idilio e por mais que o Juanito seja um diretor de arte que faz e acontece ele me ouve muito. Não consigo trabalhar com quem eu não tenha diálogo. Eu quero ser surpreendida, mas eu quero dizer o que eu sinto também. Eu sonho com meu trabalho, tomo banho pensando na minha música e ninguém melhor que o próprio artista pra dizer o que ele fareja e o Juanito respeita muito isso. O Picky é um diretor muito amigo do Juanito, com quem eu sempre quis trabalhar. Eles sugeriram a estética noir, a coisa meio Marlene Dietrich. A estética é meio punk, mas ao mesmo tempo muito clássica. O cabelo é perfeitamente alinhado, mas o bracelete que eu uso é meio punk. Essa jogada estética traduz muito do que eu quis dizer. Tatuar o nome de um amor é uma coisa que sai um pouco do bom senso, a pessoa está se arriscando. Tudo isso está nas entrelinhas da música. A sugestão de fazer em Buenos Aires foi deles e eu gostei muito porque adoro a cidade. A escolha da casa de tango foi por ser um lugar que vibra arte, além de ser muito bonito.
"O artista para ser transparente tem que estar falando do que ele sabe"
Aliás, você usou um modelo do estilista paraense André Lima no clipe. O figurino é uma coisa importante nas suas apresentações?
Nós somos seres indivisíveis. A música tem que estar traduzindo o que você está querendo dizer. Eu gosto muito do trabalho do André, ele faz uma mulher extremamente feminina. A minha personagem é uma mulher que não tem temor em ser feminina e não tem nada a ver com ser vulgar, tem a ver com ser uma dama. Acho que o André é especialista neste tipo de roupa. Ele curte meu trabalho e sempre me apoiou desde o princípio. Realmente ficou lindo.
E as roupas pro dia a dia, como são?
No dia a dia eu sou muito confortável e clássica. Eu não gosto nem de pensar na roupa que eu estou usando. Se algo me incomoda na roupa, já jogo fora. Não sou de arriscar muito em termos de moda. Me interesso pelo conceito, pela linguagem e pela estética.
Nos dois discos você canta em castelhano e português. Em que língua você se sente mais confortável cantando?
Você sabe que depende muito da música? Levei meu filho à fonoaudióloga e ela estava justamente falando sobre as diferenças nas línguas, onde cada uma retumba. Com o português e o espanhol é assim. Dependendo da música eles soam diferentes. Como a minha memória afetiva em espanhol é muito forte, sinto que canto com muito coração, mas também canto com muito coração em português. Meu trabalho é bilíngue porque simplesmente eu não soube fazer diferente. Na minha casa meu avô falava em espanhol e eu respondia em português. Não havia divisão. Talvez em algumas músicas uma língua soe melhor que a outra, mas é mais pela parte técnica e não pelo coração e nem pela minha conexão com a música.
Na época do lançamento do seu primeiro disco você afirmou, sobre as canções cubanas antigas, que "o resgate é como uma dívida que você tem que pagar, senão ela fica sendo cobrada e acaba se transformando em um espinho". Você ainda se sente assim?
Boa pergunta [risos]! Eu acho que a gente gera dívidas novas [risos]. Aquelas eu já paguei! Agora eu tenho novas dívidas e estou pagando todas. Mas o que me move é a vontade de cantar, é estar mergulhada no mar de música. É isso que me faz ser cantora e o Idílio é absolutamente visceral e eu estou muito feliz de ter parido este disco, foi um alívio, porque eu fui muito sincera.
Além da visceralidade, Idílio tem um tema? Algum fio condutor?
Amor... Sem dúvida nenhuma! O artista para ser transparente tem que estar falando do que ele sabe. Eu penso que pra cantar com todo o seu ser você precisa viver. Eu acho que o valor mais importante da humanidade é o amor.
Você tem muita influência de Cuba, seu pai inclusive é cubano. Você costuma ir muito pra lá?
Tenho muita influência, mas não vou para lá o tanto que eu gostaria. Eu não estou de acordo com o regime [castrista], eu sofro muito quando eu vou. Tenho muitos amigos lá. Tenho um gráfico emocional toda vez que vou pra lá. Fico esfuziante quando eu chego e no meio do caminho enquanto estou lá fico super triste por ver minha família exilada. Não posso estar de acordo com um regime que proíbe a liberdade de ir e vir de alguém, além das questões de direito humanos. Mas eu amo aquele lugar, tenho memórias afetivas. São as minhas raízes, a gente vem de uma árvore e essa é a minha. Mas a minha Cuba não é a da camiseta do Che Guevara, que quem não mergulha acha que é só isso. Minha Cuba é outra: da família, da receita, da clave, da saudade do avô...
Em janeiro deste ano, ainda sem o novo disco, seu show em Fortaleza teve os ingressos esgotados 4 horas depois de terem sido disponibilizados na bilheteria do teatro. Como você se sente com uma repercussão tão boa em um show no Nordeste, fora do eixo Rio-SP?
Que lindo. Eu fiquei tão emocionada. E também nervosa porque eu queria arrumar mais ingressos. Era de graça e fiquei chateada porque quero chegar nas pessoas. Nós tentamos fazer um show no dia seguinte, mas não conseguimos nenhum lugar. É muito emocionante ter um trabalho tão verdadeiro bem recebido pelas pessoas. Ser bem recebida desse jeito, de uma forma transparente, é maravilhoso. Me dá a impressão que eu posso ter uma vida longa. Até morrer eu vou estar fazendo música.
E quais os planos para depois do lançamento de Idílio?
Menina do céu. Já está na Apple Store. Eu estava na faculdade super ansiosa e ainda não consegui entrar na internet.
Você faz faculdade?
Sim! Eu voltei pra faculdade de Direito e me formo esse ano. Eu "dropei" a faculade e resolvi terminar. Tá vendo as dívidas?
Por que você resolver voltar?
De verdade, eu vou te dizer. Eu acredito que o artista tem muita voz ativa e se ele não tiver nada na cabeça ele será uma marionete. Queria estudar direitos humanos e também os autorais. É difícil fisicamente, porque trabalhar e estudar não é fácil pra ninguém! Mas eu estou muito contente.
Bom, voltemos aos planos pra depois do lançamento...
Agora é só fazer shows e divulgar o trabalho. Tenho um show já marcado no Auditório Ibirapuera para o dia 24 de março... E fazer a música voar. Fazer a música do silêncio.
Abaixo você assiste ao clipe da música "Voy a Tatuarme", do novo disco de Marina de La Riva: