Tudo o que rolou na Casa Menopausa
Em setembro, a Tpm reuniu mulheres inspiradoras para discutir um assunto que ainda é cercado de tabus e desinformação
"Ame envelhecer". "Odeie envelhecer". "Não tente parecer jovem". "Não fique com cara de velha". "Fale muito do assunto". "Pare de reclamar". Ufa! É fácil tudo se transformar em regra, proibição, estereótipo, especialmente quando se trata de assunto de mulher. Difícil mesmo é conversar sobre envelhecimento sem tabu, sem romantização e sem medo. Em setembro, a Casa Menopausa, um evento oferecido por Botik com curadoria da Casa Tpm, reuniu mulheres inspiradoras no Espaço Moní para discutir um tema que, por muito tempo, foi cercado de silêncio, preconceito e desinformação.
Quantas vezes a palavra menopausa foi sussurrada, evitada, ou tratada como algo a ser temido? Em algum momento, nos fizeram acreditar que era o começo do fim, uma fase que traria apenas limitações e desconfortos. Por muito tempo seguimos esse roteiro que inventaram para nós – e que moldou nossas expectativas e, muitas vezes, direcionou nossas escolhas por puro medo. Mas essa história não é só de uma de nós. Somos muitas.
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Até 2030, Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 1 bilhão de mulheres ao redor do planeta estarão vivendo a menopausa. Hoje, somos mais de 29 milhões aqui no Brasil – 27,9% da população feminina do país, de acordo com o IBGE. Trazer essa fase para o centro das conversas é mais do que necessário. Afinal, menopausa não é o fim de nada. Pelo contrário, é só mais um dos muitos rituais que vivemos ao longo da vida.
"Se todos os homens entrassem na menopausa, estava tudo resolvido há muito tempo. Já teriam filme, produtos, tudo. Há poucos anos a gente nem falava nesse assunto. Se eu tivesse começado a me tratar ainda no climatério, talvez teria entendido melhor o meu corpo quando chegasse na menopausa. E não teria o choque de não me reconhecer em mim, de falar 'quem sou eu?'"
Ingrid Guimarães, atriz
Alterações de humor, sono, libido, fogachos, escape de xixi… Como lidar bem com sintomas que sequer conhecemos? Menopausa, pré-menopausa, perimenopausa são assuntos pra mulheres de qualquer idade, mas só falamos disso quando ela bate na porta. "Nunca ouvi minha mãe falar de menopausa, ela sofria mais calada ainda. Temos que aproveitar que estamos conversando sobre isso para aprender sobre o nosso corpo", afirmou a jornalista Claudia Lima na mesa que dividiu com a atriz Ingrid Guimarães e a médica endocrinologista e metabologista Ana Priscila Soggia. "A gente sabe tudo da menstruação, mas nada da menopausa. Esse movimento é incrível não só para mulheres maduras, mas também para as mais jovens. Para saber, quando a menopausa bater na porta, que é hora de abrir"
Encarar essa transformação como tantas outras na nossa vida significa compartilhar mais, validar os sentimentos que surgem nesse processo e garantir que a gente possa ter todas as informações pra tomar as melhores decisões pra nossa saúde e bem-estar. "Cheguei à conclusão que ser Mulher Maravilha é uma furada. Sempre teve essa coisa da mulher que equilibra pratos, que faz tudo, e a gente achando isso muito maneiro. Depois que entrei na menopausa e passei todos os cansaços mentais, eu vejo que isso é uma bobagem", diz Ingrid Guimarães. "Hoje eu penso com o que quero me estressar daqui pra frente, quem vale esse esforço todo".
Para a médica Ana Priscila Soggia, é preciso debater mais e mais o assunto para desmistificar tabus, preocupações e estereótipos criados em torno de algo que deveria ser simplesmente mais uma fase da nossa vida. "A medicina repete a cultura da sociedade, que minimiza e banaliza pontos importantes do corpo da mulher. Antigamente a gente fazia estudos científicos só com homens. Como a gente sabe como uma medicação vai funcionar no corpo da mulher? Isso só mudou em 1993. Por isso a importância desse processo de conscientização sobre a menopausa", afirmou.
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"As mulheres são treinadas para achar que morrer é melhor do que envelhecer. Menopausa era uma palavra que a gente nem podia falar. Isso está muito fundo dentro da gente. Não é fácil se olhar no espelho depois dos 40, dos 50, e aceitar as rugas, o cabelo branco, ou decidir conscientemente que quer pintar. Se desfazer dessa opressão é um processo, não um evento"
Milly Lacombe, jornalista e escritora
Aos 30, aos 40, aos 50, aos 60, aos 70… Pode apostar: sempre vai ter alguém nos achando velhas – às vezes, nós mesmas também. Envelhecer significa lidar com mudanças, boas e ruins, com perdas, com poder, com julgamentos, com liberdade. Não precisamos brigar com o tempo, mas sim com quem usa a idade pra nos limitar, seja na carreira, nos relacionamentos ou na maneira como nos enxergamos. Se toda mulher souber, desde cedo, fazer as pazes com o tempo, talvez a gente possa impedir que nos façam ter tanto medo dele. "Autoconhecimento é fundamental para envelhecer. É preciso tirar esse opressor que a gente internalizou, que nos faz olhar no espelho e falar 'ferrou'. Não ferrou. Muito pelo contrário", afirmou Milly Lacombe. Na Casa Menopausa, a escritora e jornalista participou do debate "Envelhecer (não) dói" ao lado da psicanalista Sylvia Loeb, co-criadora da iniciativa Minha Idade Não Me Define, e da apresentadora e atriz Maria Gal.
Elas bateram um papo sobre o sentido da vida e as limitações, sejam elas imposições sociais ou não, da idade. "Na adolescência, eu tinha muito medo. Não que agora eu não tenha, mas sei lidar com ele de uma forma diferente porque já passei por tantas coisas... Acho que a gente pode viver com essa leveza também. Agora, eu valorizo mais a vida e as escolhas, com quem eu quero estar", contou Maria Gal. Para Sylvia, a relação com o tempo nem sempre é linear. "Tem dias em que me acho supervelha e dias em que estou ótima. Você perde muita coisa com a idade, mas tem soluções: você deixa ir embora o que não importa e se apega ao que você tem a mais. Às vezes o corpo nos lembra. Dói aqui, dói ali. E aí o que você faz? Cuida. Faz ginástica, faz fortalecimento, faz tudo o que precisa. Acho que é por aí", disse. "O sentido da vida é a gente que dá. O sentido da vida é viver. Eu ganhei isso, não pedi. Não posso fazer tudo o que fazia, subir, descer morro. Faço o que posso, mas posso muita coisa. A idade não nos define. O principal é ter uma cabeça e recursos emocionais, afetivos, intelectuais, que você produz e vai atrás. Ninguém nasce assim".
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"Se aqui o envelhecer vem com vergonha, na cultura africana vem com orgulho. Os mais velhos são extremamente honrados e são chamados de griot, que significa 'dono da sabedoria'. A gente tem muito a aprender com a Mãe África sobre reverenciar quem veio antes. Eu reverencio os mais velhos e todas as mulheres negras que tornaram esse pavimento possível"
Deh Bastos, diretora de criação e comunicadora
O que significa “poder” para você? Em um papo na Casa Menopausa sobre a potência que a maturidade pode trazer, a gerente sênior de gestão integrada de marcas do Grupo Boticário, Mariana Tozzini, refletiu sobre como a idade a permitiu redefinir suas prioridades e traçar novos limites na vida. “Não existe isso de ‘na minha época’. Parece que a gente só é feliz com 20 e poucos anos. Mas a minha época é hoje. O hoje é sobre pessoas reais, sobre o que é beleza para mim, não para a mulher da capa de revista”, disse. “Quando eu era mais nova, errei muito sobre os lugares que eu achava que gostaria de estar. Hoje me percebo confortável com quem sou graças ao repertório e quilômetros rodados que tenho para tomar melhores decisões sobre qual é esse lugar”.
A palestrante e criadora de conteúdo Ana Raia lembrou que se sentir bem na própria pele também tem a ver com deixar de se importar com a opinião dos outros: “Uma das coisas boas da idade é que, quando você vai realmente assumindo quem é e se aceitando, você se permite não seguir todas as regras sociais”, afirmou. “Quando a gente fala em poder, normalmente pensa em outra pessoa. Aos 51 anos, entendo o poder que há em envelhecer. Cada vez mais a opinião das pessoas deixa de ser importante e você consegue estar bem consigo mesma, dentro da sua pele. Independentemente se estou na pré-menopausa, na menopausa ou na pós-menopausa, isso é poder"
Mas precisa esperar ficar velha para priorizar suas próprias vontades e ter poder sobre suas escolhas? Na mediação da conversa, a comunicadora Deh Bastos explicou que conhecimento, principalmente sobre si mesma, também é parte do autocuidado – e isso não tem idade. “Quando dou aula de criatividade, falo muito sobre repertório. Tudo é repertório, é buscar referências em si para tomar uma decisão”, afirmou.
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O Espaço Moní, em São Paulo, foi onde tantas mulheres inspiradoras se reuniram para conversar sobre um assunto tão importante para todas nós. Além do espaço aconchegante para os debates, os papos continuaram na área ao livre, cercada por 20 árvores e mais de 100 plantas.