Planeta Terra 2010

por Millos Kaiser

Os altos e baixos não ficaram só na montanha russa do festival realizado no Playcenter

Vinte mil pessoas – boa parte delas vestindo roupa xadrez – estiveram ontem no festival Planeta Terra. Ao todo, foram quinze atrações, 10 internacionais, num total de 10h de música. A exemplo das três ultimas edições, o evento ocorreu sem maiores problemas. Os shows foram pontuais, as filas de banheiro e das lanchonetes estavam aceitáveis durante a maior parte do tempo, mas cresceram ao longo do dia. A qualidade do som para lá de digna.

Os ingressos haviam esgotado há dois meses. Na entrada do parque, diversas pessoas ainda tentavam comprar o seu. A única opção foi recorrer aos cambistas, que cobravam entre R$300 e R$500 pelo tíquete.

Muitos brinquedos estavam funcionando e chegaram a ter filas. Apesar da combinação de venda de bebida alcoólica com montanha russa não soar muito segura, não houve registros de acidentes – apenas uma ou outra golfada. As maiores filas eram para os carrinhos bate-bate e para ver a Monga (aquela em que a mulher vira um macaco). Havia também um stand do Rock Band, onde muita gente preferiu ficar brincando de rock star a ver os próprios em ação nos palco. O único tumulto registrado foi no caminho do Indie Stage na hora do show do Hot Chip, quando alguns fãs mais exaltados tentaram entrar por uma passagem proibida.

Palco principal

No palco principal, as palavras de ordem foram as mesmas da montanha russa do parque: altos e baixos. O dia começou quente às 16h com o show dos pernambucanos do Mombojó, que lançou em 2010 seu terceiro e elogiado disco Amigo do Tempo. O público ainda chegava, mas a banda caprichou no peso do som e na empolgação. Primeiro alto.

Depois, o clima do palco esfriou às 17h30 (apesar da temperatura estar bem alta no Playcenter) e os Novos Paulistas fizeram uma apresentação que ficou pequena demais para o tamanho do palco. Tatá Aeroplano, Thiago Pethit, Tulipa Ruiz, Tiê e Dudu Tsuda são amigos e fizeram sua festa particular no palco, mas sem dar muita chance para o público, que ouviu meio desanimado ao set da banda. A noite começava em baixa.

Mas houve quem resgatasse o ânimo com dançarinos, luzes coloridas e batidas dançantes e os responsáveis foram os americanos do Of Montreal. Às 19h a banda pisou no palco e disparou hits indies que fizeram o público pular alto pela primeira vez no palco principal (chamado de “Main stage”).

Pulos e mais pulos marcaram a vez de Mika, sua primeira no Brasil. Ele pulava, os fãs pulavam, cantavam e celebravam o carismo do britânico no palco. “Take it easy”, “Love today” e “Grace Kelly” garantiram a noite do cantor, que misturou passos de Fred Astaire, vocais de Freddie Mercury e batidas eletrônicas do Pet Shop Boys para arrebatar até quem estava meio distraído por ali.

Nada melhor do que um público quente para receber Thomas Mars e seu Phoenix ao som de “Lisztomania”. Parecia que os franceses manteriam o ritmo, mas não foi o caso. O começo do show animou, mas o meio da apresentação perdeu o ritmo e cortou o barato de quem queria dançar. A banda se achou de novo no fim do set e terminou de maneira apoteótica, empolgando o público e levando Mars a mergulhar do palco na última música.

O Pavement não teve o mesmo quórum do Phoenix. Parte das pessoas deixaram o palco principal, deixando espaços vazios na plateia. Mas quem saiu dali perdeu o melhor show daquele palco. Contando com a experiência e o peso de suas guitarras, os americanos foram o ponto alto da noite. Todas as músicas viraram hits. Stephen Malkmus comandou o show discretamente e deixou a banda toda brilhar. Destaque para "Grounded" e "Perfume V". Um belo alto na noite.

Sem dúvida, o maior potencial para fechar a noite com empolgação eram Billy Corgan e seu trio. Sim, os Smashing Pumpkins. Donos de canções capazes de levantar qualquer estádio, os americanos erraram a mão no setlist. Claro que clássicos como “Today” e “Tonight, tonight” estiveram presentes, mas músicas longas, vagarosas e solos desnecessários de guitarra e bateria tiraram todo o ritmo do show. Corgan tocou o hino nacional americano na guitarra com os dentes. Algumas pessoas olhavam incrédulas. Até no bis os Smashing Pumpkins erraram. Havia ainda uma lista enorme de sucessos poderosos para encerrar a festa. Só que a escolhida foi a obscura “Heavy metal machine”, do disco Machina/The machines of God. Esse seria o último baixo da noite.

Palco indie

O sol ainda rachava forte quando o República subiu ao palco Indie Stage às 16h. Ninguém sabia explicar muito bem como os tiozinhos foram parar na programação em meio a tantos nomes incensados, mas eles não fizeram feio. Rock bem tocado e sem firulas.

Depois foi a vez do Hurtmold, grupo instrumental que recentemente ganhou maior projeção ao acompanhar Marcelo Camelo, do Los Hermanos, em sua carreira solo. O som um pouco mais “cabeçudo” dos rapazes não prendeu a atenção de todos, mas havia quem parecesse estar em transe acompanhando as viagens sonoras do quinteto, que mudam do rock ao jazz em questão de um acorde. Um belo fim de tarde coroou a performance cheia de experimentalismos.

O Holger foi recebido sob gritinhos dignos de banda consagrada. Na platéia, vários amigos e fãs. “Fomos em todos as edições do Festival e agora estamos tocando nele”, disseram, nitidamente felizes. Os integrantes revezavam-se nos intrumentos e não fizeram feio. A mesa de som, no entanto, nem sempre acompanhava a mudança e deixava algum ou outro som inaudível. Misturando indie rock com batuques africanos e jogos de voz, o Holger é, em seus melhores momentos, uma resposta brasileira ao Vampire Weekend.

O clima ficou mais soturno com o Yeasayer. O quarteto hippie-eletrônico do Brooklyn começou morno mas mostrou ao que veio em “Wait for the Summer”, terceira do set list. “Eu não lembrava de já ter tocado do lado de uma montanha russa, um castelo de terror e uma placa da HP antes”, disse o performático vocalista que começou o show com um “olá, Buenos Aires”. O quarteto, acrescido de um músico de apoio, faz um som globalizado e ao mesmo tempo étnico.

O Passion Pit é a prova de que o indie virou pop – literalmente. Seu som pilotado por sintetizadores é bem açucarado e, mesmo não sendo cheio de refrões, é de fácil assimilação. Ao vivo, a banda emula com perfeição o som das suas gravações em estúdio . Mesmo com o Phoenix começando no outro palco, muita gente preferiu ficar até o fim, sendo presenteado com um cover de “Dreams”, do Cranberries.

O Hot Chip fez a melhor apresentação do Indie Stage. Conseguem fazer musica eletrônica ao vivo com a liberdade de um grupo de rock. Clássicos como “Over and Over” e “Ready for the Floor” ganham barulhinhos e extras, arranjos novos. “Hold On” praticamente dobrou do tamanho original e fez quem ainda estava parado mudar de ideia. No palco, seis caras desengonçados e nada descolados fazendo um som altamente moderno. Nada mais cool que isso.

A discrição não foi partilhada pela banda australiana Empire of the Sun. Um telão 3D passava imagens do espaço sideral, enquanto bailarinas repetiam uma coreografia usando uma fantasia de peixe. Pense nas aberturas do Fantástico na década de 80. Começaram o show com “Standing on the Shore”, um dos dois maiores hits seus. O outro, “Walking on a Dream”, encerrou a apresentação.

Quem encerrou o Planeta Terra foi um cara que não faz música – pelo menos, não do jeito convencional. Usando um laptop e nada mais, o Girl Talk metralhou centenas de musicas copiadas e coladas em uma hora de apresentação. O palco mais parecia uma festa, com diversos convidados dançando em volta do artista. Duas ajudantes disparavam papéis higiênicos de uma arma especial o tempo todo, alem de confetes e bolinhas de sabão. No som, Kelly Clarkson com Rage Against the Machine com Guns n` Roses com Jay-Z. Tudo ao mesmo tempo agora. Nada mais contemporâneo.

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