O rodeio itinerante do Matanza

por Luiz Filipe Tavares

Cariocas caem na estrada com disco novo e festival próprio em seis cidades do Brasil

Equilibrando country, hardcore e heavy metal no cano de seus revólveres, os cowboys malditos do Matanza estrearam em 1996 com a demo Terror em Dashville e, sem apoio, sem cena e sem sequer uma banda parecida com sua sonoridade em todo o Brasil, fez das tripas (alheias) coração até quase chegar no degrau mais alto do rock nacional na década seguinte.

Ilhada no eterno verão carioca, a banda passou a encontrar na Baixada Fluminense e no vizinho estado de São Paulo os primeiros espaços para crescer. Em 2001 veio o primeiro disco, Santa Madre Cassino, com hit estourando na MTV e direito a radiodifusão pesada de "Ela Roubou Meu Caminhão", tudo isso antes de, como disse o próprio vocalista Jimmy London em entrevista exclusiva à Trip, a banda levar um "soco na boca pelas mãos do establishment" e ser cortada das programações de rádios e TVs.

O segundo disco veio em 2003 com Música para Beber e Brigar, que catapultou a banda de volta para o mainstream. Dois anos depois saiu To Hell With Johnny Cash (2005), só com covers e versões de originais do Homem de Preto, Johnny Cash. A Arte do Insulto (2006), o ao vivo MTV Apresenta Matanza (2008) e Odiosa Natureza Humana (2010) seguiram nos passos do segundo disco, mantendo a banda em evidência mesmo sem grandes mudanças na fórmula do som do quarteto.

Para comemorar 15 anos na estrada, o Matanza lançou neste ano Thunder Dope, uma coleção de músicas dos primeiros anos de grupo que não chegaram a entrar em nenhum registro oficial de Jimmy, Donida e companhia. Junto com o disco, a banda começou no último dia 2 uma turnê de seis datas com o seu próprio Lollapalooza, o festival MatanzaFest, curado pelo quarteto sob a égide do lema: "música boa e bebida barata."

No meio de tantas celebrações, falamos com Jimmy pelo telefone enquanto ele ocupava alguma mesa de saloon no velho oeste para falar do novo disco, o que um show precisa para ser inesquecível e a responsabilidade do Matanza em carregar a bandeira do rock feio e barulhento em tempo de roqueiros galãs adolescentes.

Trip - Antes de mais nada, parabéns pelo disco novo...
Jimmy London - A gente ficou muito amarradão de ter feito esse disco. São umas musiquinhas que podem até não ser grandes bolas mas que a gente ficou amarradão de mostrar. São essas coisinhas que a gente fazia que deram nessa merda toda a que chegamos hoje em dia [risos].

É bem legal finalmente ter acesso a esse material mais ancestral do Matanza...
Porra, rola um orgulho dessas músicas. Eu sei que é uma certa lambida no nosso próprio saco ter feito esse disco [gargalhadas]. Mas pra gente é do caralho poder fazer isso: chegar em um momento da nossa vida e falar: ‘pô, vamo gravar essas músicas que a gente fazia ali quando era moleque’.

Pra vocês foi meio que uma volta no tempo?
Totalmente. Deu flashback de tudo que a gente tomava na época na mesma hora [risos]. Foi foda. A gente nem lembrava das músicas direito. Precisamos de um esforço coletivo pra lembrar aquelas merdas todas. Mas deu uma vibe de bons tempos que foi demais. A gente já falava de fazer isso há tempos, mas depois que nos juntamos pra tocar as músicas pela primeira vez, decidimos que faríamos esse disco agora. Foi assim que começou o trampo em cima dessas composições para podermos lançar um disco apresentável. 

"Não evoluimos tanto assim. Mas isso é bom porque quer dizer que a gente não virou uma banda de punheteiros. Esse é o nosso espírito: fazer música que saia com a força de um jato de vômito"

Como foi a escolha das músicas?
A gente escolheu tudo que conseguíamos lembrar. Tinha as músicas que desde sempre quisemos gravar, como as primeironas que a gente tocava no show anual do Matanza em noventa e poucos [gargalhadas]. Teve música que a gente não conseguia terminar porque éramos idiotas e não sabíamos mexer com a estrutura da música. Teve coisa que ficou sem letra. Coisa que era em inglês, enfim... O grande problema foi a memória mesmo, o resto foi bem fácil.

Quase 15 anos depois da primeira demo tape, como você vê a evolução da carreira do Matanza?
Musicalmente falando eu fico muito em dúvida se eu tenho orgulho ou morro de vergonha em ver que a gente não mudou porra nenhuma de lá pra cá [risos]. Beleza, eu sei que a nossa proposta sempre foi não sair dessa nossa linha e manter-se relevante apesar disso. Nunca quisemos sair fazendo o “Reggae do Matanza” nem um disco diferente do outro. Mas é engraçado ver como qualquer uma das músicas do Thunder Dope caberia em um disco de atuais do Matanza tranquilamente. Pensando bem, acho que a gente não evoluiu tanto assim [mais risos]. Mas isso é bom porque quer dizer que a gente não virou uma banda de punheteiros. Esse é o nosso espírito: fazer música que saia com a força de um jato de vômito.

E em relação à carreira da banda?
Bom, a gente começou sozinho. Éramos só nós e completamente céticos quanto ao nosso futuro. Nunca achamos que fosse rolar merda nenhuma pra banda, até pelo nível de coisas que a gente sempre falou nas músicas. Depois do primeiro disco a gente passou a acreditar no grupo e logo tomamos um soco na boca vindo do establishment que dizia: “abaixa a bola que não tem espaço aqui pra vocês, não”. Mas a gente entendeu que precisávamos trabalhar loucamente pra criar o NOSSO espaço. Hoje em dia até parece que o Matanza está muito bem de vida. Mas não. Hoje em dia o Matanza está trabalhando pra caralho. Fazendo isso a gente consegue chegar em uma situação de continuar fazendo uma porrada de show por ano e nos dar ao luxo de lançar um disco que não necessariamente é um disco “de carreira”.

Esse “espírito” ao qual você se refere se reflete nos fãs da banda de uma forma interessante. Grande parte deles vê essa manutenção da linha da banda como a responsabilidade social do Matanza em uma era de rockstars bonitinhos e engomados...
Eu vejo exatamente por aí. Alguém tem que levantar a mão e falar: “opa, opa! peraí, malandro. Não é assim não!” [gargalhadas]. E é isso mesmo. É só você vê quem são as bandas que trabalham. Lógico, sem querer me comparar com esses caras que não tem comparação. Mas você pega um Motörhead da vida, com o Lemmy com a idade que tem, trabalhando o tanto que ele trabalha, e você não acredita. Mermão, o cara é fodido! Ele sobe no palco e não quer nem saber: desce a porrada, berra que nem um desgraçado e destroi mesmo. É nessa hora que o rock vira pra você e fala: “Sua alma agora é minha. Você vai trabalhar na minha função”.

Mesmo entre as bandas nacionais, muitas também se destacam com essa filosofia.
A gente faz questão de manter a bandeira do rock sujo e pauleira levantada. E não estamos sozinhos. No Brasil tem muita banda muito mais fodida que o Matanza. Temos o Ratos de Porão, temos o Sepultura, o Krisiun e uma porrada de banda monstruosa. Mas enquanto tivermos chance de fazer parte disso, nós faremos.

Nesses quase 15 anos vocês não queimaram etapas. Fizeram quatro LPs, um disco ao vivo, um de covers e agora um resgate da primeira fase da banda. Qual o próximo passo para o Matanza nesse próximo ciclo?
A produção do Matanza nunca para. A gente está sempre fazendo alguma coisa. No ano que vem temos um projeto que está dando um trabalho do cacete mas que vai ser muito legal. Estamos esperando a aprovação de um incentivo para fazer uma porrada de shows pelos interiores em uma carreta-palco, tudo de graça. Estou envolvidíssimo com isso e quero muito que aconteça, porque vai ser do caralho. As composições também nunca param com o Donida, que está sempre escrevendo. Também tem a cerveja do Matanza, que finalmente está ficando pronta. Então é sempre uma porrada de coisa que a gente vai fazendo ao mesmo tempo. Quando algo fica pronto, a gente vai e lança. Tudo na hora. Eu acho que o que vai ficar pronto primeiro é um disco de inéditas para 2013, mas a cozinha não para.

"Um festival não precisa ter grandes merdas [gargalhadas]. Não precisa de muito pra um show de rock ser perfeito. E a gente sabe como fazer. Foi assim que decidimos fazer o nosso próprio evento"

Um desses muitos projetos que ficou pronto é o MatanzaFest. Fala um pouco sobre como essa ideia virou realidade.
A ideia surgiu de tanto ver os lugares onde a gente tocava, que a cada dia podiam ser muito legais ou uma merda completa. Cara, não precisa de muito pra um show de rock ser perfeito. E a gente sabe como fazer. Foi assim que decidimos fazer o nosso próprio show. Ali vai ser tudo do nosso jeito, como sempre quisemos fazer. Isso, antes de mais nada, é uma questão de respeito com o público. A premissa básica do festival é “música boa e bebida barata”. Mas isso não quer dizer que o festival vai ser só isso. Buscamos uma estrutura de som maneira e uma estrutura legal para as bandas, para que quem for tocar antes não se foder com o som. E o lance do respeito com o público, que hoje tem que passar por um monte de perrengue para ir em show de rock. Isso é um absurdo. A gente já não tem show de graça na praia em Copacabana. Não faz sentido a gente ter que ser maltratado quando vamos ver um show. Então o Matanza quer dar pro público o que eles merecem.

O que não pode faltar em um festival para ele ser um sucesso?
Esse é que é o lance: não é muito difícil. Um festival não precisa ter grandes merdas [gargalhadas]. O sucesso de um festival se baseia em duas coisas simples, que são as bandas felizes, tocando bem e com estrura, além do público feliz, confortável e em um lugar maneiro. Tendo essas duas partes envolvidas, que são o mínimo da logística, vai ser do caralho. O resto é mole.

Ouça abaixo "Estrada de Ferro Thunder Dope", uma das velhas novas músicas do Matanza

 

Vai lá: MatanzaFest

Data: 07 de Dezembro 
Cidade: Curitiba 
Local: Sociedade Abranches - Rua: Mateus Leme, 5932 – Abranches
Preço: De R$25 a R$50
Programação:
21:00 – Abertura das portas
21:30 – As Diabatz
22:20 – Trampa
23:10 – Semblant
00:00 - Hillbilly Rawhide
01:00 – Matanza

Data: 08 de Dezembro
Cidade: Brasília
Local: Rancho Uirapuru - Av. Contorno, Lote 4 – Gama
Preço: de R$20 a R$50
Programação:
20:00 – Abertura das portas.
21:30 – Banda vencedora da promoção
22:20 – Flashover
23:10 – Valhalla
00:00 – Bruto
01:00 – Matanza

Data: 14 de Dezembro
Cidade: Rio de Janeiro
Local: Circo Voador - Rua dos Arcos, s/n- Lapa
Preço: de R$30 a R$40
Programação:
22h – Abertura da casa
22:30 - Lacerated and Carbonized
23:20 – Confronto
00:10 – Gangrena Gasosa
01:10 – Matanza

Data: 15 de Dezembro
Cidade: São Paulo
Local: A Seringueira - Francisco Matarazzo, 694 – Água Branca
Preço: de R$20 a R$70
Programação:
20h – Abertura das portas
21h – Nervochaos
21:50 – Trampa
22:40 – Ação Direta
23:30 – Claustrofobia
00:20 – Baranga
01:30 – Matanza

Data: 19 de Janeiro
Cidade: Recife
Local: Catamaran - Cais das Cinco Pontas – Bairro do Recife
Preço: R$30 a R$50
Programação:
21:00 – Abertura das portas
22:20 – Cruor
23:10 – Vocifera
00:00 – Fourpigs
01:00 – Matanza

Vai lá: www.matanza.com.br

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