Theo, Arthur e Serguei

por Arthur Veríssimo
Trip #180

Convidamos Theo Becker para meditar com nosso repórter excepcional e o pansexual Serguei

No dia 25 de março de 1925 o Jardim Botânico do Rio de Janeiro recebia a visita do maior gênio da ciência de todos os tempos. Albert Einstein caminhava feliz por aleias e caramanchões em meio a mais de 7 mil espécies da flora. Amante da natureza, encantou-se com a formosura de um jequitibá-rosa, árvore nativa do Brasil. Ouviu atentamente as propriedades da árvore que o então diretor do parque Antonio Pacheco Leão explicava didaticamente. Ao final, emocionado, abraçou o gigante vegetal e beijou suas raízes. No livro de visitas de 1925 Einstein relatou que: “A visita ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro, na agradável e amável companhia do professor Pacheco Leão, foi um dos maiores acontecimentos de minha vida”. Estava aberto o neopanvegetalismo brasileiro. Desde sempre homens e mulheres se conectam com a natureza abraçando árvores. E muitos paisagistas, botânicos, pintores, cientistas, naturalistas e crianças continuam a se esbaldar com a fartura desse paraíso criado em 1808 por Dom João 6o. Lugar perfeito para marcar um encontro com duas figuras únicas da cultura pop brasileira. Primeiro, Serguei. Seria o reencontro deste escriba com o rock star pansexual. (Em 2002 fiz para a Trip uma reportagem no reduto de Serguei em Saquarema na qual, além de abrir seu sarcófago, o roqueiro declarou sua paixão pelas árvores e um carinho especial por um velho jatobá.) Convoquei Serguei para me ajudar em uma terapia de meditação e abraços arbóreos com o ator Theo Becker, ex-participante do reality show A fazenda – para quem não sabe, Becker foi eliminado em junho depois de muita confusão com seus colegas e declarações de amor à ex-namorada Andressa, o que rendeu belos índices no Ibope.

No estacionamento do parque, reencontro Serguei todo pimpão fazendo o make up. Como um polvo, o mestre da longevidade aplicou-me um fortíssimo abraço. Com 75 anos de idade, Serguei é um Peter Pan. Admiro sua energia. Usa um modelito de lã fina, com faixas coloridas. Pergunto qual a poção mágica que bebericara. “Não envelheci e jamais envelhecerei, estou sempre consertando esta máquina quente que é o meu corpo.” Busco seus olhos por detrás da juba leonina. Seu olhar tem o brilho da retina de Albus Dumbledore, o diretor da escola dos bruxos de Harry Potter. O druida de Saquarema afirma viver neste mundo da carne, da matéria, mas cultiva seu espírito. Para ele a morte é o final de uma etapa, e a sequência é uma esfera fora daqui.

Certíssimo, Albus, ou melhor, Serguei.Suas respostas são objetivas como o erotismo que borbulha por sua epiderme. Explico que nossa tarefa é fazer Theo Becker relaxar e meditar no ambiente de paz e tranquilidade do Jardim Botânico. Uma mistura de perfumes exalava daquele éden, enquanto eu flanava com Serguei pelo arboredo. Esse verdadeiro elfo galopante abraçava palmeiras imperiais, jatobás, jacarandás, ipês-amarelos, perobas, sumaúmas e outras. O ato telúrico de abraçar as árvores, para Serguei, é como enlaçar o José, a Ana, o Antônio, o Elohim, o Lino, a Carla ou a Renata e entrar em contato mediúnico com a natureza.

Homem-cobra da Record

Tudo muito bonito, contudo o tempo se escoa e nada de Theo Becker aparecer. Ligo para o ex-homem-cobra da novela Os mutantes da Record, que avisa já estar pelo parque. Sua voz é tensa. Tento apressar Serguei, que em êxtase beijava um ipê-roxo. Marco na escultura da mulher com a cornucópia. Meu olhar rastreia as cercanias quando, como uma fênix, vejo saindo de um caramanchão a figura solar de Theo Becker. Imediatamente convoco Serguei, que, como uma sílfide, hipnotiza Becker instantaneamente.

 

Uma sintonia finíssima permeia o ambiente. Antes da meditação, decidimos que, para despertar os chakras, o melhor seria abraçar um abricó-de-macaco o quanto antes. Conexão com a natureza feita, partimos para a terapia grupal. Theo em altíssimo astral abre seu coração. Diz que a eliminação no reality show foi uma grande aprendizagem e segue ejaculando palavras como um centauro alado. “Minha saída estava determinada pelo destino. Deus escreve certo por linhas tortas. Consegui meu objetivo, de ser lembrado pelas pessoas. Quanto mais demorarem para aceitar que fui um personagem, melhor para mim. No A fazenda criei bordões, como ‘Esse aqui é irmão desse aqui’, ‘Cazuza, tamo junto’ e ‘Andressa, te amo’”, explica o rapaz. E continua: “Sabia que o meu tava na reta, então pensei: ‘Vou marcar por protagonizar histórias intensas’. Ninguém quer ver gente boazinha. Os telespectadores querem a confusão, como acontecia no Coliseu de Roma. Simplesmente segui a linha do bom e velho rock”.

 

Becker lida bem com as palavras, e à medida que conta suas histórias o elfo das árvores Serguei enlouquece. “Arthur, este menino é muito bonito e sexy, que doçura”, derrete-se. “Não divido o palco com ninguém, mas quero ver ele cantar, vou convidá-lo para tocar comigo.”

Volto a Theo, pergunto se ele não encana de sumir quando a poeira baixar. “Se acontecer é porque o meu personagem não deu certo. Tenho certeza de que foi um sucesso a minha participação, como serão também minha banda de rock e as próximas novelas que farei.” De repente para e manda, emocionado: “Poxa, estou me sentindo muito bem com vocês. O Serguei é demais, e você passa essa energia incrível. Sou fã do Serguei desde moleque, ele parece uma mistura de Ney Matogrosso da época dos Secos e Molhados com a melhor fase do Mick Jagger”.

Compreendi minha ignorância

Theo, você já abraçou árvores antes? “Cara, abraçar árvores é uma atitude totalmente rock’n’roll. Percebi imediatamente que faço parte deste ambiente.” Clamo para darmos um tempo na conversa e fazermos alguns exercícios de ioga e meditação. Encontramos um bom local e, no exato momento em que eu praticava um shirsasana (pouso sobre a cabeça), Serguei incorporava um pavão e Becker fazia mudras (gestos simbólicos do ioga).

Ao final, com o sol já se pondo, Becker, relaxado, solta esta: “Agradeço profundamente por este encontro. Cheguei à compreensão da minha ignorância. Andressa foi importantíssima na minha vida, mas consegui perdê-la. O que tenho a dizer é para que cada homem cuide da melhor forma possível da sua mulher e que não se deixe cair em tentação. Não sei o que aconteceu, mas este nosso encontro aqui no Jardim Botânico está sendo um divisor de águas em minha vida”, diz, sério. “Percebi que a Andressa não vai voltar para mim.”

Agradecimento: Jardim Botânico do Rio de Janeiro

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