Home office pelo fim do coronavírus

A prática do trabalho remoto para conter a epidemia desafia empresas e profissionais a criarem uma nova cultura

por Natalia Guaratto em

Ainda que não seja privilégio de todos, o home office não só é a coisa certa a se fazer em tempos de coronavírus como também uma tendência ventilada por especialistas em transformação digital há mais de uma década. O trabalho remoto aparece em 10 de 10 listas de boas práticas corporativas a serem adotadas, mas ainda encontra muita resistência. A necessidade de isolar a população para frear o contágio do coronavírus fez com que empresas dos mais variados setores colocassem seus funcionários para cumprirem jornadas remotas pela primeira vez. Mas verdade é que nem todos estavam preparados.

Estreante no home office, a advogada Larissa Barone, de 29 anos, estava acostumada com a vida no escritório em São Paulo quando foi mandada para casa por causa da epidemia. “Estamos todos enlouquecendo e pegando no tranco. Essa é a primeira vez que estamos trabalhando nesse regime”, conta. “Vim para casa só com meu notebook e meu mouse. Quando comecei a trabalhar, vi que precisava de outra tela e meu teclado também está fazendo falta”.

Larissa Barone, de 29 anos, atua em um escritório de advocacia de médio porte, em São Paulo - Crédito: Arquivo pessoal

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Apesar do início conturbado, ela enxerga a mudança como positiva, principalmente na área em que trabalha. “O direito ainda é uma classe associada à burocracia e a gente precisa evoluir. Claro que é horrível que isso tenha acontecido por causa de uma pandemia, mas estamos aprendendo a lidar da melhor forma”, afirma Larissa, que está equilibrando os compromissos profissionais com os cuidados com o filho de dois anos enquanto as escolas permanecem fechadas.

Do lado de quem emprega, também houve esforços para garantir o acesso remoto dos colaboradores, equilibrando a preocupação em mantê-los saudáveis com a necessidade de cumprir prazos. “Fizemos uma operação de guerra”, conta Gustavo Mello, um dos sócios da Boutique Filmes. A produtora, que tem no currículo séries como 3% e Onisciente, da Netflix, decidiu cancelar gravações externas, afastar funcionários que haviam feito viagens recentes para o exterior e montar estruturas na casa dos colaboradores que não possuíam máquinas, além de fornecer cópias criptografadas do material a ser editado. “Nessa hora a gente junta as duas coisas: o nosso compromisso contratual com os clientes e a nossa compreensão social com a saúde pública. Tivemos que pensar em uma solução que não colocasse as pessoas em risco, ao mesmo tempo que agimos para não disseminar o vírus. Assegurar o trabalho remoto era o que tinha que ser feito”, diz Gustavo.

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Home office: privilégio ou necessidade?

Culturalmente, o home office sempre foi uma modalidade difícil de ser colocada em prática no Brasil. "Muitos gestores têm medo de perder o controle e ainda acham que ver as pessoas fisicamente é necessário para saber que as coisas estão acontecendo”, explica Mariana Achutti, fundadora da escola de educação corporativa Sputinik.

Mariana Achutti, fundadora da escola de educação corporativa Sputinik - Crédito: Arquivo pessoal

Essa dificuldade, em parte, pode ser explicada pelos parâmetros de trabalhos em que as empresas brasileiras se baseiam, que vêm dos tempos da revolução industrial. “Todo o sistema que a gente trabalha é baseado na indústria: cumprir horário, bater cartão, estar em um lugar para realizar algo, como se fosse uma fábrica. Essa é a parte que está mudando, que está sendo questionada”, explica a pesquisadora de tendências Iza Dezon, sócia-fundadora da Dezon e representante oficial da PeclerParis no Brasil.

Para a pesquisadora, é um equívoco tratar o home office como privilégio, já que essa modalidade de trabalho nasceu de uma necessidade. “A gente começa a discutir o conceito de home office a partir da crise econômica de 2008. Muita gente perdeu o emprego e foi para a rua. As pessoas tiveram que reinventar suas carreiras inteiras, e o home office veio como um imperativo disso. Se não tem emprego, eu vou virar um 'slasher', que é o termo que a gente usava na época para falar da nossa capacidade de aderir a vários empregos ao mesmo tempo e utilizar todos os nossos talentos”, explica.

A pesquisadora de tendências Iza Dezon, da Peclers Paris - Crédito: Arquivo pessoal

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Adepta do home office desde 2015, a jornalista Marcia Breda é uma 'slasher', produzindo conteúdo para uma agência e sócia em outra. Ela também administra o site Adoro Home Office – e viu os acessos do portal dobrarem desde a última semana por conta da pandemia do coronavírus. “Apareceu muita gente nova, além de mais seguidores no Instagram”, relata Marcia.

Segundo ela, a principal dúvida é sempre a mesma: como se manter produtivo trabalhando em casa? Para responder essa e outras questões, ela criou o Guia Definitivo do Home Office, um e-book que pode ser baixado gratuitamente. Marcia acredita que essa experiência coletiva de home office vai mudar o conceito de produtividade. “Acho que muita gente vai se surpreender. Gestores vão descobrir que há diversas formas de medir as entregas dos seus colaboradores e que várias delas não têm a ver com estar presente no escritório", aposta.

A jornalista Marcia Breda, adepta do home office desde 2015, administra o site Adoro Home Office - Crédito: Arquivo pessoal

Trabalhar de casa, claro, não é para todo mundo. E tudo bem. O mais importante neste momento, além de controlar a pandemia, é exercitar a empatia. "As minhas principais dicas para este momento são: sejam flexíveis e estejam online", diz Mariana Achutti, da Sputinik. "Para os gestores, além de lidar com a demanda diária, vale trazer inteligência emocional. É hora de mostrar que não precisamos perder nossa comunicação só porque estamos trabalhando à distância".

Como manter a produtividade no home office?
Gerenciar o tempo sem a supervisão direta de um chefe vai estar entre as habilidades mais requisitadas em um futuro não muito distante. Marcia Breda, do Adoro Home Office, compartilha as práticas que podem ajudar nesta empreitada.

1. Defina e cumpra um horário
Tanto faz se você quer trabalhar oito horas direto ou se separa seu expediente em períodos menores, o fundamental é garantir que vá cumprir suas tarefas.

2. Teste diferentes métodos
Você pode dividir o seu dia em diferentes blocos, com pequenas pausas. Ou ir trocando de estação de trabalho várias vezes por dia para se concentrar toda vez que parar ou ainda fazer uma jornada intensiva para ficar com o resto do dia livre para outras atividades.

3. Faça uma coisa por vez
Focar em apenas uma coisa de cada vez e deixar sua mente livre vai fazer você ser mais concentrado e produtivo. Mas para chegar nesse ponto, é preciso de conhecer. Faça uma lista de tudo o que você consegue realizar de manhã, de tarde e de noite.

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