As janelas da quarentena

O fotógrafo Marcelo Naddeo reúne relatos visuais de pessoas pelo mundo no projeto Minha Casa Minha Vista

por Fernanda Nascimento em

"As janelas são um respiro para o mundo, um respiro verdadeiro para não ficarmos só olhando para as telas", diz Marcelo Naddeo. No começo da quarentena, o fotógrafo resolveu lançar um desafio no Instagram e convidou as pessoas a mandarem fotos da vista das janelas de suas casas. "Dei sorte porque foi numa semana em que rolou um fim de tarde mágico em São Paulo e muita gente se animou", conta. "E as pessoas começaram a entrar na brincadeira e compartilhar fotos de todos os lugares, do Brasil e de outros países. É uma coisa muito espontânea, uma necessidade. Acaba sendo uma janela pra todo mundo, pra mostrar como as pessoas estão vivendo a quarentena e o que elas estão passando também".

Em São Paulo, bonecas enfileiradas por uma criança com autismo observam a vista da cidade

As fotos se transformaram no projeto visual colaborativo Minha Casa Minha Vista, que reúne numa página no Instagram as descobertas e sensações de dezenas de pessoas pelo mundo através da vista de suas janelas e balcões. Do mar de João Pessoa aos prédios espelhados de Nova York, do céu de Fortaleza aos monumentos de Barcelona, da visita inusitada de papagaios a um apartamento em São Paulo às bonecas enfileiradas por uma criança para observar a vista lá fora. "Minha filha, a Chloe, tem doze anos e tem autismo. Ela não fala quase nada e está trancada comigo já tem um mês. Entrei no quarto dela e ela tinha colocado as bonecas assim, na janela", relatou sua mãe.

"Algumas pessoas só mandam a foto, outras falam um pouco sobre o que estão passando. Achei muito bonito a visão de uma criança autista de estar no mundo dela e querer olhar pra fora", diz Naddeo. O projeto não é uma competição, tampouco um chamado para mandar o registro mais bonito de seu pet ou de seu drink. São fotos que contam histórias. E as imagens vêm de todos os continentes e registram um pouco dos cotidianos da quarentena.

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No Japão, um brasileiro mostrou o que enxerga da pequena janela de sua cozinha, onde passa os dias cortando repolho e marinando frango do missô. De Helsinque, na Finlândia, vieram as imagens da neve que chegou atrasada este ano e coloriu o chão de branco já na primavera. "Dependendo do olhar, qualquer janela pode ser bonita porque representa de alguma maneira nosso respiro", diz Marcelo Naddeo. "É difícil pensar nas pessoas que não têm uma janela. Hoje, quem tem uma janela já é um privilegiado".

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Esse olhar para o lado de fora não é novidade para o fotógrafo. O apartamento onde vive, em São Paulo, foi escolhido justamente por causa da luz que entra pelas janelas. "Sou muito observador e já estava acostumado a ficar muito tempo em casa", diz. "Acho que o projeto acaba sendo um convite para outras pessoas praticarem esse olhar". Impedido de viajar para fotografar ou tocar seu projeto, o estúdio de autorretratos instantâneos para eventos Deixe seu Retrato, Marcelo Naddeo tem buscado maneiras de manter a mente ocupada e procurar saídas para sua vida profissional durante o isolamento. "É importante continuar abrindo essas janelas. Quem sabe disso não venha a solução", diz. 

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